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Achei sensacional este texto do publicitário parauara Glauco Alexander Lima, que está radicado em São Paulo mas não perde suas raízes e é super antenado com o futebol.
Reproduzo para que vocês se deliciem.

Sobre ser paraense e Paysandu 

Ser paraense é historicamente perder. Torcer pelo Pará, por Belém do Pará, quase sempre é perder. Principalmente quando se é paraense dos segmentos mais pobres da população, que no Pará é a grande maioria do povo e o nível de pobreza ainda é muito profundo. 

Ser paraense é perder o ferro, o níquel, a bauxita, a madeira de lei, a floresta para o gado, perder importância econômica, política e social. 

Ser paraense é fazer a Cabanagem e perder para a impiedosa força lusitana. 

Ser paraense é perder o porto para o Maranhão, a siderúrgica para o Ceará, a energia hidroelétrica para o Brasil todo. 

Ser paraense é perder o açaí, o cupuaçu, grandes investimentos nacionais e internacionais, é perder porque tudo sai e pouco se reverte em desenvolvimento humano e em redução das brutais diferenças sociais no estado. 

Ser paraense é perder relevância. É ser quase sempre preterido. E muitas vezes nem lembrado. 

Ser paraense é perder grande parte de seu território para uma divisão que, embora ainda não formalizada, já existe na vida real. Um estado que ainda não foi divido, mas já está separado, um Pará desintegrado, que vê cada vez mais longe a possibilidade de um elo que o faça um só. 

Ser paraense é perder o conceito de Amazônia para Manaus e perder grandes eventos e negócios como o Mundial de Futebol realizado no Brasil. 

Ser paraense é perder o trem da história. 

Ser paraense é ver a capital do estado, grande aglomerado urbano, parada no começo do século 20, cada vez mais carente de atualização na mobilidade humana, na preservação do patrimônio histórico, no surgimento de novas e visionárias lideranças empresariais. 

Tudo isso talvez explique um pouco essa loucura pelo Paysandu. Alguém já disse que o futebol é a mais importante das coisas sem importância e o Paysandu com suas proezas e, mesmo nas suas tragédias, acaba sendo uma pequena janela para o orgulho e a expressão de um paraense constantemente derrotado em outros campos. 

O que explica essa legião de loucos seguindo o time pelo Brasil e até por outros países da América do Sul, um clube de futebol de possibilidades financeiras limitas. Gente que vai de madrugada receber o time que volta de uma viagem, gente que forma uma massa de mais de trinta mil pessoas no aeroporto quando o clube sai da terceira divisão do campeonato nacional. 

O mais interessante é que junto com a bandeira do Paysandu tem sempre uma bandeira do Pará. E os torcedores se dedicam a explicar de onde é aquela bandeira vermelha, branca e azul. Misturam futebol com tacacá, campeonatos com pirarucu, Círio de Nazaré, Carimbó, tamuatá, Alter do Chão, exaltam a terra natal como quem fala de alguém que foi condenado injustamente e que precisa de uma defesa justa. 

O Paysandu é o embaixador informal do povo do Pará, é um sentimento de dignidade que renasce quando o juiz apita o início da partida. É uma festa popular, um carnaval permanente, uma nacionalidade, uma religião profana, um meio de comunicação de uma terra com o mundo. O Paysandu é a alegria do Pará e uma pequena esperança de que o povo paraense pode se organizar, se levantar, misturar o local com o universal e virar o jogo em favor de um futuro mais bonito. Bonito como uma vitória do Paysandu numa manhã ensolarada no Rio de Janeiro.
Franssinete Florenzano
Jornalista e advogada, membro da Academia Paraense de Jornalismo, da Academia Paraense de Letras, do Instituto Histórico e Geográfico do Pará, da Associação Brasileira de Jornalistas de Turismo e do Instituto Histórico e Geográfico do Tapajós, editora geral do portal Uruá-Tapera e consultora da Alepa. Filiada ao Sinjor Pará, à Fenaj e à Fij.

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