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O cinema de Sophia Coppola é marcado é marcado pela autoralidade que explora o universo feminino de forma intimista (na pulsão de personagens jovens e suas descobertas) e atemporal (pode ser narrado em tempos e lugares distintos).

Em “Priscilla”, o domínio narrativo que explora a adaptação literária para o cinema a partir do livro “Elvis e Eu”, de Priscilla Presley, pode ser acompanhado em 3 atos:  o encantamento, a coisificação do papel feminino e a situação que exige alteridade, tomada de decisão.

Com Cailee Spaeny como protagonista e Jacob Elordi como Elvis Presley, o filme remonta o processo de sedução romantizada a partir da determinação de um astro do rock sobre os sonhos e fantasias adolescentes de fácil condução, com todas as possibilidades reais de protagonizar o mundo mágico de poder, riqueza e sucesso.

Tudo parecia uma lindeza sem fim, como uma espécie de conto de fadas no auge da indústria cultural que eleva a música pop e seus ídolos a uma condição intocável, manipulada pela coreografia de shows, entrevistas e viagens de longa duração para realização de filmes, turnês e gravações de discos.

Priscilla

Sophia Coppola conduz o manuseio de câmeras, cenários e direção de atores para retratar, em diversos detalhes visuais, a sensação de coisificação e angústia que se instala com a tomada de consciência da esposa-troféu em ser mais um objeto decorativo na mansão de vários aposentos, de se confundir como mais um integrante dos grupos que acompanham e bajulam as idas e vindas de um popstar.

Todos esses sinais poderiam ser conformizados, a depender do temperamento e personalidade da personagem, para assim proporcionar a contemplação de luxo e outras vantagens de permanecer com o estado das coisas que se apresentava nos chamados “anos dourados” nas décadas de 1950 e 1960 no Ocidente. Por outro lado, era lá, nos Estados Unidos da América que se proliferou o movimento beatnik, a contracultura, a ascensão de ídolos como James Dean, Marylin Monroe e Marlon Brando e a espinha dorsal para o que depois se chamou de Nova Hollywood.

A sensação de não estar em lugar algum, mesmo com condições financeiras favoráveis (assim como a suposta hierarquia de poder sobre outras pessoas), é tema recorrente na obra da realizadora, a exemplo de “Maria Antonieta” (2006), o belo filme estrelado por Kirsten Dunst, e no remake de “O Estranho que Amamos” (2017). O tema de jovens sem poder de decisão sobre suas vidas e desfecho trágico pode ser visto em “As Virgens Suicidas” (1999), também estrelado por Kirsten Dunst.

Maria Antonieta

Do mesmo modo, observamos a sensação de desorientação e tédio nos filmes “Encontros e Desencontros” (2003) e “Um Lugar Qualquer” (2010); temas elaborados na tarefa habilidosa quando o assunto é cinema, ou seja, contar histórias em imagens em movimento.

Sim, já podemos falar em cinema autoral de Sophia Coppola, com traços estilísticos e temáticos que convergem para uma carreira cinematográfica própria, com um diferencial que a destaca no Cinema Americano Contemporâneo: a inequívoca e certeira escolha da trilha sonora para seus filmes, o que inclui o duo francês Air, The Cure, Jesus & Mary Chain, Ramones, entre outros.

Encontros e Desencontros
José Augusto Pachêco
José Augusto Pachêco é jornalista, crítico de cinema com especialização em Imagem & Sociedade – Estudos sobre Cinema e mestre em Estudos Literários – Cinema e Literatura. Júri do Toró - 1º Festival Audiovisual Universitário de Belém, curadoria do Amazônia Doc e ministrante de palestras e cursos no Sesc Boulevard e Casa das Artes.

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