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Escrevo ainda sob o impacto de assistir Salustiano Vilhena em cena, no espetáculo “Picadeiro – Solo onde plantei minhas lágrimas”, com a Má Companhia de Teatro, de Icoaraci, na programação da Bienal de Artes, realizada pela Prefeitura Municipal de Belém.

Salú, como o chamam carinhosamente, é nome sagrado das Artes Cênicas no Pará, integrante de uma geração que inclui Cleodom Gondim, Claudio Barradas, Geraldo Sales e os que me lembro agora, que já partiram, Nilza Maria e Mendara Mariani. Já estava por lá nos anos 60 e além de brilhar em cena, foi fundador, por exemplo, do Grupo Gruta, dirigido por muitos anos pelo grande Henrique da Paz. Tive a honra de tê-lo dizendo texto de minha autoria, “Angelim, o outro lado da Cabanagem”. Presença cênica, domínio do personagem, corpo presente, postura, voz e gestual. Quando surgia, abria-se um clarão no palco. Professor, aposentou-se e passou algum tempo morando em Icoaraci, até encontrar a Má Companhia e com ela voltar aos palcos.

Pouca gente estava na plateia para assistir a este recital de Salú no último domingo, no Teatro Waldemar Henrique. Alguns desencontros de produção talvez tenham colaborado para a desinformação. As arquibancadas do Círio também “escondem” o Teatro, com sua frente quase às escuras, a entrada sendo por uma estreita porta lateral e além disso, outra atração, no anfiteatro da Praça da República, com som muito alto, tirava a concentração do público. Não tirou o brilho do espetáculo. Trata-se de uma colagem de textos de variadas autorias a falar do ofício do ator e a passagem do tempo, que chega para todos nós. Belo cenário, iluminação e Salustiano Vilhena à vontade, pleno, na figura de um palhaço cansado da lida. Como é lindo assistir a um ator inteligente, no domínio de tudo, que captura o público ao primeiro olhar, que dança, suave, dosando o ritmo e ouve músicas inesquecíveis. Voz firme, melodia exata, um verdadeiro show de interpretação.

E onde estava o público? Onde estavam os fazedores de Teatro desta cidade? Para eles, garanto, não havia melhor programa para uma noite de domingo. A sessão iniciando às 19.30, dando tempo de sobra para voltar para casa e preparar-se para a semana. Onde estavam diretores, atores, técnicos? Se não comparecemos nem para assistir essa grande figura, muito menos os outros espetáculos, não podemos reclamar do público ausente. Passamos por uma longa noite na Cultura local. Estamos voltando a respirar. Nosso Teatro é de alto nível, mas ainda não conseguimos mover, sequer aqueles que antigamente, frequentavam as peças locais, muito menos os jovens. Precisamos louvar nossos artistas. Nossos grandes artistas. Salustiano merecia estar fazendo seu solo no Teatro da Paz, com grande mídia. Chega de fazer gol contra. A AGTB, Associação de Grupos de Teatro de Belém está a pronta a oferecer suas idéias e planos às autoridades culturais, de maneira a retomar tudo o que foi retirado e uma das funções é trazer o público de volta ao teatro.

Quando terminou, perdi a timidez e agradeci a ele. O que tinha assistido foi absolutamente comovente, mágico, importante. Ganhei meu domingo e quero ver Salu em cena muito mais vezes. Obrigado, Mestre.

Edyr Augusto Proença
Paraense, escritor, começou a escrever aos 16 anos. Escreveu livros de poesia, teatro, crônicas, contos e romances, estes últimos, lançados nacionalmente pela Editora Boitempo e na França, pela Editions Asphalte. Foto: Ronaldo Rosa

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