Publicado em: 19 de dezembro de 2025
A juíza federal Hind Ghassan Kayath, titular da 2ª Vara Federal do Pará, concedeu liminar determinando que o município de Belém se abstenha de fechar, encerrar ou suspender o funcionamento do Pronto-Socorro Municipal Mário Pinotti, devendo mantê-lo com atendimento de portas abertas à população, e suspenda os editais de chamamento público nº 02 e 03/2025– SESMA/PMB/PA. Também mandou que o Ministério da Saúde e a Secretaria de Saúde de Belém elaborem Plano de Recuperação, em 30 dias, e sua revisão a cada 6 meses, para aplicação imediata, emergencial e direta no PSM da 14 de Março (e não em favor de ente privado) de recursos públicos federais na regularização de insumos, medicamentos, valorização dos profissionais de saúde, leitos e internação, higiene e salubridade do ambiente hospitalar, procedimentos cirúrgicos e diagnósticos, aparelhos, equipamentos e modernização tecnológica, entre outros, tendo como parâmetro mínimo o saneamento das desconformidades constatadas nos Relatórios de Fiscalização dos Conselhos Regionais.
O município, o prefeito, o secretário municipal de Saúde e o diretor geral do HSPM, além da União, já foram intimados pelo Plantão a fim de que cumpram a decisão imediatamente. O Ministério Público Federal é o autor da Ação Civil Pública, ao lado dos Conselhos Regionais de Medicina, de Odontologia e do Psicologia e Defensoria Pública da União.
O Pronto-Socorro Mário Pinotti, maior unidade de Urgência e Emergência da Amazônia, é hospital municipal gerido com recursos públicos federais, notadamente Teto da Média e Alta Complexidade, do Fundo Nacional de Saúde, e atende Ortopedia e Traumatologia, Neurologia, Nefrologia, Pediatria, Oftalmologia, Otorrinolaringologia, inclusive cirurgias. Mas sofre com precarização deliberada e proposital, afirma o MPF, alegando que os recursos públicos federais não são aplicados integralmente no hospital público, e sim maiormente na iniciativa privada, para a qual sempre há disponibilidade. Aponta omissão do Ministério da Saúde e da Sesma em não tomar providências e buscar soluções efetivas e diretas em favor do PSM da 14, quer por iniciativa própria, quer cobrada pelo MPF, DPU, CRM.
O hospital passa por forte processo de privatização, mediante abuso do direito de privatizar, com aplicação milionária e majoritária de dinheiro público federal na iniciativa privada, em detrimento da destinação direta a órgão público (onde falta insumos e medicamentos básicos, como luvas, gazes, analgésicos e antibióticos), e direcionamento que beneficia desproporcionalmente um único ente particular, Hospital Beneficente Portuguesa. Alega, ainda, a ACP, que essa privatização contraria a Constituição da República de 1988 (art. 199, §1º), que determina que o serviço público de saúde deve ser prestado preponderante e diretamente por ente público, cabendo ao particular apenas atuação complementar no SUS, e que as referidas Chamadas Públicas preveem “paralisação integral das atividades” e “interdição do prédio” do PSM e a necessidade de reforma é motivo inexistente, inadequado, falso e insubsistente dos atos administrativos.
A magistrada realizou inspeção judicial hoje (19), com acompanhamento técnico, e não constatou risco estrutural iminente no imóvel capaz de justificar a imediata interdição da unidade, com o que concluiu inexistir elemento técnico que imponha o fechamento por razões de segurança predial e nem por risco de desabamento, não havendo necessidade de desocupação por motivo estrutural, bem como foi observada a possibilidade de coexistência da obra com a assistência hospitalar. De acordo com as impressões diretas e relatos colhidos durante a inspeção judicial, a prestação deficiente dos serviços à população, tais como falta de insumos, medicamentos, manutenção de aparelhos ou aquisição de novos equipamentos, estariam mais relacionados à gestão deficiente dos recursos públicos do que a necessidade de “obras” de reparos.
A juíza verificou que há problemas no sistema de regulação de leitos, impedindo ou retardando a transferência dos pacientes para outros hospitais. O HPSM sempre funcionou através do sistema de portas abertas, é referência para o atendimento de urgência e emergência da população local, e também acolhe a demanda do interior carente de assistência médica/hospitalar em seu local de origem. As dificuldades enfrentadas — como falta de leitos, escassez de insumos, medicamentos e utensílios, bem como problemas recorrentes de gestão —, embora graves e merecedoras de correção administrativa imediata, não podem ser imputadas aos usuários do SUS, tampouco servir de fundamento para o encerramento abrupto de serviço essencial, salientou a magistrada.
A Sesma publicou os editais de chamada pública 02/2025 e 03/2025 para credenciamento de interessados na prestação de serviços complementares de saúde, com a possibilidade de contratação. O edital 02/2025 tem valor anual de R$111.025.849,00. Acontece que a previsão de gastos com apenas uma dessas chamadas, transferindo recursos para a iniciativa privada, importa no montante anual de R$ 111.025.849,20, enquanto que o custo da construção de um novo hospital, segundo informado durante a inspeção judicial, seria de R$ 190 milhões, frisou a juíza Hind Ghassan Kayath. “Portanto, em apenas um ano de contrato, o Poder Público iria repassar à iniciativa privada o equivalente a aproximadamente 60% (sessenta por cento) do custo da aquisição do novo hospital. Um verdadeiro contrassenso e ato antieconômico contrariando o princípio da boa gestão, eficiência e do interesse público. Fato é que bem ou mal o Pronto-Socorro, com seu valoroso corpo de servidores e médicos, continua prestando serviço de atendimento à população, muito embora haja escassez de medicamentos, insumos e equipamentos por falta ou má administração dos recursos públicos, principalmente diante da informação de que a última reforma estrutural aconteceu há quase dez anos. Nesse ponto, a Lei nº 8.080/90, que organiza o SUS, dispõe expressamente que a iniciativa privada poderá participar do SUS em caráter complementar (art. 4º, § 2º, e art. 24), hipótese admitida quando as disponibilidades da rede pública forem insuficientes para garantir a integralidade da assistência, não se confundindo tal complementariedade com a descontinuidade ou supressão de serviços essenciais já existentes”, enfatizou na decisão.
Leiam a liminar na íntegra aqui no Portal Uruá-Tapera.









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