Sou uma pessoa da cidade. Urbana, muito urbana. Mas tenho um encanto pelo Marajó. Minha mãe é de Muaná e minha avó paterna era de Soure. Já estive lá em pesquisas para um livro. Li e ouvi tudo o que podia. Do paraíso e do inferno. Mas continua o encantamento. Ernesto Boulhosa, meu amigo, escreve bastante sobre seu lugar. O tamanho de sua paixão é o mesmo que o faz escrever para contar. “Jagarajó” é seu novo trabalho. Não sei onde vende. Não o encontro nas livrarias que frequento. Devia encontrar. É literatura de primeira. Há um feitiço no que ele escreve. Neste livro, retorna à sua terra para rever tudo o que deixou. As pessoas, os animais, a natureza, água, campos, bichos, estórias e mais água. Conta com detalhes a característica deste ou daquele pássaro. Encontra velhos amigos e fica ouvindo-os desfilar suas estórias fantásticas, das lendas. E cada um que nomina, traça o perfil para que entendamos o homem marajoara. Descreve com poesia a caboca em seus cabelos, o corpo esguio e a alegria com que trabalha na cozinha, na agricultura, deixando para os homens os búfalos, bois e cavalos. De vez em quando entra na mata fechada, identificando cada árvore, cada canto de passarinho, a fauna e as técnicas de pescar. A hora de ir para a baía, enfrentar as ondas grandes. E na volta parar em um bar, se estirar, acender um porronca e ouvir o que têm para contar. Às vezes é uma avó esculhambando com o neto que foi estudar em Belém e agora aparece todo pávulo, merecendo uns beliscões. O garoto que passou a vida lá para dentro, em uma fazenda. O pai o levou na garupa até o bispo que estava por lá e foi batizado. Um mundo novo, mas dentro do mundo Marajó. Os cabocos jovens, rijos, que fazem a peconha, tiram o açaí e depois debulham para paneiros que virão para Belém. Luiz Braga tem portraits maravilhosos em que digo que, mais do que nós, são as imagens que parecem olhar-nos com curiosidade. “O que foi?”. Ernesto traduz o melhor Marajó de maneira hábil, amorosa, apaixonada. Lá no final ele volta a Belém, com as memórias renovadas, principalmente a paixão. É leitura leve, gostosa e com muitas curiosidades. Que bom aprender algo tão bacana sobre esse Marajó misterioso e gigante!
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