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Aplicações Jurídicas na Política de Resíduos Sólidos para a COP-30 em Belém-PA

Resumo Este artigo investiga o papel da Inteligência Artificial (IA) na gestão pública ambiental, com foco na gestão de resíduos sólidos urbanos no contexto da COP-30, a ser realizada em Belém (PA). Parte-se de uma abordagem qualitativa, documental e normativa, visando compreender como ferramentas de IA podem otimizar o planejamento, o monitoramento e a eficiência das políticas públicas climáticas. Também se analisa a viabilidade jurídica da contratação dessas soluções à luz da Lei 14.133/2021, com ênfase nos dispositivos que tratam de inovação tecnológica e sustentabilidade. O estudo toma como base experiências internacionais, o Plano Estadual de Resíduos do Pará e a legislação ambiental e tributária vigente.

Palavras-chave: Inteligência Artificial. Gestão Ambiental. Resíduos Sólidos. COP-30. Contratações Públicas.

Abstract This paper investigates the role of Artificial Intelligence (AI) in environmental public management, focusing on the management of urban solid waste in the context of COP-30 in Belém (PA). It adopts a qualitative, documentary, and normative approach to understand how AI tools can optimize planning, monitoring, and the efficiency of climate public policies. It also analyzes the legal feasibility of contracting such solutions under Law 14.133/2021, highlighting provisions on technological innovation and sustainability. The study draws on international experiences, the State Waste Plan of Pará, and current environmental and tax legislation.

Keywords: Artificial Intelligence. Environmental Management. Solid Waste. COP-30. Public Procurement.

Sumário: 1. Introdução; 2. Análise jurídica da contratação de IA pela administração pública; 3. Proposta de implementação da IA na gestão de resíduos sólidos da COP-30 em Belém (PA); 4. Desafios e estratégias de governança para a aplicação da IA na COP-30; 5. Conclusão; 6. Referências.

1. Introdução

A crise climática contemporânea impõe desafios cada vez mais complexos à gestão pública ambiental, exigindo respostas institucionais pautadas na inovação tecnológica, na eficiência administrativa e na sustentabilidade. Nesse cenário, a realização da 30ª Conferência das Partes da Convenção-Quadro das Nações Unidas sobre Mudança do Clima (COP-30), prevista para ocorrer em Belém do Pará, em novembro de 2025, representa não apenas um evento diplomático de grande escala, mas também uma oportunidade singular para o fortalecimento das capacidades públicas locais. Entre os inúmeros desafios logísticos, sociais e ambientais que envolvem a preparação para um evento dessa magnitude, destaca-se a necessidade de uma gestão eficiente dos resíduos sólidos urbanos.

A gestão de resíduos sólidos em centros urbanos é, por si só, um tema sensível, especialmente quando se considera a infraestrutura pública em diversas cidades da Amazônia. Quando aliada à pressão por resultados imediatos, decorrente da visibilidade internacional da COP-30, essa problemática adquire contornos ainda mais complexos. Nesse contexto, o uso de ferramentas de Inteligência Artificial (IA) surge como uma alternativa tecnológica promissora para otimizar os processos de coleta, tratamento e disposição final de resíduos sólidos, bem como para promover maior previsibilidade e transparência na execução das políticas públicas ambientais.

A aplicação da IA na gestão pública ambiental ainda é incipiente no Brasil, sobretudo em municípios da Amazônia Legal. Todavia, experiências internacionais – como as iniciativas implementadas nas cidades de Estocolmo e Tóquio, durante eventos globais – evidenciam que tecnologias baseadas em georreferenciamento e aprendizado de máquina podem transformar profundamente a dinâmica de planejamento urbano e ambiental.

Diante dessa realidade, o presente artigo busca investigar como ferramentas de IA podem ser utilizadas ou implementadas na formulação, monitoramento e avaliação de políticas públicas climáticas, com especial atenção à gestão de resíduos sólidos urbanos no contexto da COP-30. A proposta parte de uma abordagem qualitativa, com base em pesquisa documental e normativa, visando compreender as potencialidades e limitações jurídicas da adoção dessas tecnologias no âmbito da administração pública brasileira.

O estudo adota como hipótese central a possibilidade de que a IA contribua significativamente para o aperfeiçoamento da gestão ambiental urbana, sobretudo quando empregada em eventos de grande escala. Para tanto, parte-se da premissa de que a Lei nº 14.133/2021, conhecida como Lei de Licitações e Contratos Administrativos, oferece arcabouço normativo compatível com a contratação de soluções tecnológicas inovadoras, desde que observados os princípios constitucionais da legalidade, eficiência, economicidade, sustentabilidade e inovação.

Destacam-se, nesse sentido, dispositivos legais como os artigos 6º, 11, 32 e 144 a 150 da mencionada lei, que tratam, respectivamente, da conceituação de inovação, dos objetivos das contratações públicas, da modalidade do diálogo competitivo e das contratações integradas – todos relevantes para o desenvolvimento de soluções de IA voltadas à gestão ambiental em contextos complexos. A análise desses dispositivos será feita de forma articulada com os marcos legais da Política Nacional de Resíduos Sólidos (Lei nº 12.305/2010) e da Política Nacional sobre Mudança do Clima (Lei nº 12.187/2009).

Além da perspectiva jurídica, este artigo examina a viabilidade técnica e institucional de implementação da IA na gestão de resíduos sólidos em Belém, tomando como referência o Plano Estadual de Resíduos Sólidos do Pará e outras experiências nacionais e internacionais em eventos sustentáveis. Trata-se de um estudo que busca integrar teoria e prática, legislação e planejamento, inovação tecnológica e responsabilidade fiscal, com vistas a propor breves diretrizes jurídicas e administrativas compatíveis com o cenário da COP-30.

O debate sobre IA na gestão pública ambiental insere-se, ainda, em uma agenda mais ampla de reestruturação do sistema fiscal brasileiro, conforme prevê a Emenda Constitucional nº 132/2023, que trata da reforma tributária com enfoque na sustentabilidade fiscal e na tributação ecológica. Nesse cenário, é imperativo articular o uso de tecnologias emergentes com mecanismos de financiamento ambiental, incentivos fiscais condicionados a metas climáticas e práticas de justiça intergeracional.

Assim, a presente pesquisa pretende oferecer uma análise crítica e propositiva sobre os caminhos jurídicos, institucionais e tecnológicos que podem viabilizar a atuação inteligente e sustentável do Estado brasileiro na COP-30. Ao fazê-lo, reafirma-se a centralidade da inovação como vetor de transformação da administração pública, especialmente na Amazônia urbana, onde os desafios do presente demandam soluções que integrem responsabilidade ambiental, eficiência administrativa e justiça social.

2. Análise Jurídica da Contratação de IA pela Administração Pública

A incorporação da Inteligência Artificial (IA) no âmbito da gestão pública ambiental exige análise jurídica minuciosa, especialmente no que se refere à contratação de soluções tecnológicas pela administração pública. Nesse sentido, a Lei nº 14.133/2021, Lei de Licitações e Contratos Administrativos, emerge como referência normativa indispensável.

O artigo 6º, inciso L, da referida lei define “inovação” como a implementação de soluções que configurem novidade ou aperfeiçoamento nos processos, produtos ou serviços, com vistas a gerar ganho de eficiência, efetividade, segurança ou economicidade na contratação pública. Essa previsão normativa legitima a adoção de tecnologias baseadas em IA para o enfrentamento de problemas estruturais, como é o caso da gestão de resíduos sólidos em centros urbanos.

Alinhado ao princípio da eficiência (art. 37, caput, da CF/88), o art. 11 da Lei 14.133/2021 reforça que a contratação pública deve buscar resultados efetivos para a sociedade, observando os objetivos de sustentabilidade econômica, ambiental e social. Esse dispositivo fundamenta a admissibilidade de contratações que envolvam plataformas inteligentes para o monitoramento, planejamento e avaliação da política pública de limpeza urbana durante a COP-30.

Um dos instrumentos mais inovadores da nova lei é o diálogo competitivo, previsto no art. 32. Essa modalidade licitatória permite que o Poder Público interaja com empresas ou instituições especializadas para a definição da solução mais adequada antes da apresentação das propostas. Trata-se de mecanismo essencial para contratações que envolvam elevado grau de complexidade técnica e necessidade de inovação, como no caso da IA aplicada à logística urbana.

No que diz respeito à estruturação contratual, os artigos 144 a 150 da mesma lei disciplinam as chamadas contratações integradas e semi-integradas, ideais para soluções tecnológicas desenvolvidas por múltiplos atores e com ciclo de vida complexo. Esse modelo é coerente com o caráter transversal da IA, que exige articulação entre engenharia de dados, gestão urbana, serviços ambientais e regulação jurídica.

A jurisprudência do Tribunal de Contas da União (TCU) também tem reconhecido a necessidade de adequação da estrutura administrativa às inovações tecnológicas, apontando que a contratação de soluções inovadoras deve estar fundamentada em planejamento técnico robusto e análise de riscos. O Acórdão TCU 1.214/2020 é emblemático ao reafirmar que “a contratação pública deve ser precedida de estudos preliminares consistentes, sobretudo quando envolver tecnologias emergentes”.

No âmbito doutrinário, Misabel Derzi defende que o princípio da legalidade, quando harmonizado com os princípios da eficiência e da responsividade administrativa, permite a adoção de soluções tecnológicas inovadoras pela Administração, desde que observados os limites normativos (DERZI, 2018, p. 99). Complementa-se com a leitura de Paulo de Barros Carvalho, para quem o sistema jurídico deve ser interpretado de modo a promover a “consonância sistemática entre normas constitucionais e infraconstitucionais” (CARVALHO, 2020, p. 64), o que inclui os dispositivos da Lei 14.133/2021.

Antônio Roque Carrazza enfatiza, ao tratar da função fiscal do Estado, que os mecanismos de contratação pública não devem ser vistos apenas como instrumentos de compra, mas também como expressão da política pública e da concretização de direitos fundamentais (CARRAZZA, 2022, p. 148). Assim, a aquisição de ferramentas baseadas em IA para a COP-30 se justifica não apenas pela conveniência técnica, mas como meio de efetivação dos princípios da proteção ambiental e da sustentabilidade[1].

Ademais, constata-se que a governança de dados é fator crítico para a viabilidade da IA no setor público. O uso eficiente da IA na gestão de resíduos sólidos requer integração entre bases de dados territoriais, indicadores ambientais e informações fiscais, o que demanda infraestrutura digital e pessoal qualificado. A Lei n. 12.305/2010 (Política Nacional de Resíduos Sólidos) e a Lei n. 12.187/2009 (Política Nacional sobre Mudança do Clima) reforçam a obrigatoriedade de planejamento integrado e transparência nos sistemas de informação ambiental.

Logo, a aplicação da IA pela Administração Pública, especialmente no contexto da COP-30 em Belém, encontra respaldo jurídico, doutrinário e jurisprudencial, desde que observados os requisitos legais de planejamento, sustentabilidade e responsabilidade fiscal. A utilização das ferramentas previstas na Lei 14.133/2021 não só é viável, como também desejável diante dos desafios da governança climática urbana[2].

3. Proposta de Implementação da IA na Gestão de Resíduos Sólidos da COP-30 em Belém (PA)

A Conferência das Partes da Convenção-Quadro das Nações Unidas sobre Mudança do Clima (COP-30), representa um marco estratégico para a promoção de inovação climática no contexto da gestão urbana amazônica. Dentre os diversos desafios, destaca-se a gestão de resíduos sólidos urbanos, um problema histórico e estrutural na capital paraense, agravado pela pressão do evento internacional. Neste capítulo, propõe-se um modelo de implementação da Inteligência Artificial (IA) para a otimização da política pública de limpeza urbana durante a COP-30, considerando os marcos legais vigentes, os recursos tecnológicos existentes e a infraestrutura institucional local.

A proposta parte da problematização central deste trabalho: como a IA pode ser empregada de forma jurídica e eficiente pela Administração Pública na formulação e implementação de políticas climáticas, especialmente na gestão de resíduos sólidos urbanos, no contexto da COP-30 em Belém? As hipóteses orientadoras indicam que a IA pode contribuir para o planejamento ambiental; que há respaldo jurídico na Lei 14.133/2021; e que a ausência de infraestrutura de dados representa um entrave relevante, sobretudo nos municípios da Amazônia.

A experiência internacional demonstra que a IA pode revolucionar a gestão de resíduos ao permitir o mapeamento dinâmico de fluxos de lixo, a previsão de volumes por zonas urbanas, a otimização das rotas de coleta e o redirecionamento automatizado de demandas em tempo real. Em Tóquio, por ocasião dos Jogos Olímpicos de 2020, foram utilizados sistemas inteligentes para gerir a coleta seletiva em eventos com grande aglomeração. Estocolmo também apresenta modelo semelhante, com sensores e IA integrados em contêineres subterrâneos.

No caso brasileiro, ainda que haja limitações estruturais, o município de São Paulo desenvolve iniciativas que incluem aplicações de IA para identificar áreas com alta incidência de descarte irregular e mapear territórios prioritários para a atuação da zeladoria urbana (SILVA, 2024, p. 11).

A partir dessas experiências, propõe-se que a Prefeitura de Belém, em parceria com o Governo do Estado, institua um Centro de Inteligência Climática e Urbana (CICU) voltado para a COP-30. Este centro seria responsável pela articulação interinstitucional de órgãos municipais como a SEMMA, SEMOB, SEMAD, SEMINFRA, SEMEC com órgãos estaduais como a SEMAS e o Ideflor-Bio. A gestão de resíduos sólidos seria uma das frentes prioritárias do CICU.

A implementação da IA no CICU se daria em três etapas: (1) levantamento de dados primários (rotas de coleta, tipos de resíduos, densidade populacional, pontos críticos de acúmulo), (2) integração com dados geoespaciais e sensores inteligentes em contêineres (IoT), e (3) desenvolvimento de um algoritmo de machine learning com função preditiva sobre geração de lixo e necessidade de deslocamento de equipes.

A contratação dessa solução tecnológica pode ser legitimamente estruturada via diálogo competitivo, nos termos do art. 32 da Lei 14.133/2021. Essa modalidade permite que o Poder Público ouça empresas e entidades tecnológicas antes da apresentação das propostas. Segundo Misabel Derzi, “a inovação no setor público deve ser regida não apenas pela legalidade estrita, mas pela racionalidade responsiva e pela finalidade pública ambiental” (DERZI, 2018, p. 99).

O art. 11 da Lei de Licitações, por sua vez, determina que o objeto da contratação deve estar alinhado à sustentabilidade ambiental, à transparência e à inovação, o que abrange projetos voltados ao meio ambiente urbano e à proteção da coletividade. Como destaca Paulo de Barros Carvalho, o “sistema jurídico deve realizar interpretação integradora das normas administrativas e ambientais” (CARVALHO, 2020, p. 64).

Outro ponto relevante é o financiamento. A proposta pode ser inserida no escopo dos recursos oriundos do Fundo Nacional de Meio Ambiente, do Fundo Amazônia ou de convênios internacionais para eventos sustentáveis. Também é viável condicionar parte das renúncias fiscais estaduais a metas climáticas objetivas, como defende Roque Carrazza: “a concessão de benefícios tributários deve sempre atender ao princípio da seletividade e da justiça fiscal” (CARRAZZA, 2022, p. 151).

O acórdão TCU n. 1.214/2020 reforça que qualquer contratação inovadora deve ser precedida de “planejamento, avaliação de riscos e análise de viabilidade técnica”. A aplicação da IA na COP-30, portanto, deve estar alinhada ao planejamento municipal e estadual de resíduos (PNRS e PERS/PA), com previsão orçamentária específica.

A proposta aqui apresentada responde ao problema de pesquisa e confirma as hipóteses: é possível aplicar IA de modo eficiente e jurídico na gestão climática urbana, especialmente no contexto da COP-30. Para isso, há base normativa adequada (Lei 14.133/2021), respaldo doutrinário e alinhamento com instrumentos de planejamento ambiental e fiscal[3].

4. Desafios e Estratégias de Governança para a Aplicação da IA na COP-30

A proposta de criação do Centro de Inteligência Climática e Urbana (CICU), apresentada no capítulo anterior, deve ser pensada dentro de uma lógica de consórcio interinstitucional[4]. A COP-30 envolve competências municipais, estaduais e federais, exigindo coordenação entre Ministério do Meio Ambiente, Governo do Estado do Pará, Prefeitura de Belém e entidades como SEMAS, SEMMA e SEMAD. Essa interação é essencial para o compartilhamento de bases de dados, padronização de sistemas e integração de plataformas de IA com as estruturas de planejamento urbano e ambiental.

Um dos principais entraves apontados na literatura e nos relatórios oficiais é a ausência de uma infraestrutura digital integrada nas cidades amazônicas (GOBETTI; ORAIR, 2023, p. 28). A aplicação de IA na gestão de resíduos exige sensores, redes de comunicação de dados, servidores seguros e protocolos de interoperabilidade. Trata-se de uma agenda de modernização institucional que transcende a aquisição de tecnologia, exigindo investimento público, regulação técnica e cooperação internacional.

Nesse sentido, a Emenda Constitucional nº 132/2023, ao introduzir a sustentabilidade fiscal como elemento estruturante do sistema tributário, permite a vinculação de incentivos fiscais às metas climáticas. Isso viabiliza, por exemplo, a criação de um fundo estadual de modernização ambiental financiado por renúncias fiscais condicionadas ao uso de tecnologias limpas (APPY, 2023, p. 7). Como observa Carrazza, “a tributação não pode ser cega aos fins sociais e ambientais do Estado moderno” (CARRAZZA, 2022, p. 153).

Outro desafio fundamental é a qualificação de recursos humanos. A Lei n. 14.133/2021 enfatiza a necessidade de equipes técnicas capacitadas para a condução dos processos licitatórios inovadores (arts. 7º e 18). A adoção de IA exige perfis profissionais especializados, como cientistas de dados, engenheiros de software, analistas de políticas públicas e gestores ambientais. Cabe à administração pública promover programas de formação e capacitação continuada, em parceria com instituições de ensino superior e centros de pesquisa.

Do ponto de vista regulatório, é necessário estabelecer normas claras sobre uso e proteção de dados ambientais, com fundamento na Lei Geral de Proteção de Dados Pessoais (LGPD) e nas diretrizes da Lei 12.305/2010. Conforme adverte Silva (2024, p. 17), “a governança climática depende da inteligência institucional, mas também da segurança jurídica no trato com informações sensíveis”.

O estudo de caso da COP-30 também demanda avaliação contínua e accountability. O art. 11 da Lei 14.133/2021 reforça que a contratação pública deve garantir resultados mensuráveis, com indicadores de desempenho. Assim, propõe-se que os contratos de soluções em IA prevejam mecanismos de revisão, metas de sustentabilidade e relatórios públicos de execução, como forma de dar transparência à sociedade civil e aos órgãos de controle.

Por fim, destaca-se a importância de construir marcos institucionais permanentes a partir da experiência da COP-30. A criação de uma instância técnica pós-evento, como um Laboratório Permanente de Inovação Climática na Amazônia Urbana, vinculado ao Governo do Estado ou a uma universidade pública ou privada, garantiria a continuidade das políticas implementadas e a transferência de conhecimento para outros municípios[5].

Com base nas hipóteses orientadoras delineadas, a adoção da IA é viável juridicamente e desejável administrativamente. Entretanto, a sua eficácia depende de uma governança pública articulada, de uma infraestrutura digital robusta e de uma cultura institucional orientada à inovação. O desafio da COP-30, portanto, vai além da gestão de resíduos: trata-se de consolidar uma agenda de sustentabilidade tecnológica na Amazônia urbana.

5. Conclusão

A realização da 30ª Conferência das Partes (COP-30) em Belém do Pará, representa um marco geopolítico, institucional e simbólico para a Amazônia urbana e para o Brasil. Trata-se de uma oportunidade histórica não apenas de afirmação do protagonismo climático da região, mas também de experimentação de novos arranjos tecnológicos e jurídicos para a governança ambiental, em especial no campo da gestão de resíduos sólidos urbanos. Em vista disso, a proposta de utilização de ferramentas baseadas em Inteligência Artificial (IA) revela-se como alternativa inovadora e tecnicamente promissora para o aperfeiçoamento das políticas públicas ambientais em grandes eventos.

O presente estudo partiu de uma pergunta central: como a IA pode ser empregada de forma jurídica e eficiente pela Administração Pública na formulação e implementação de políticas climáticas, especialmente na gestão de resíduos sólidos urbanos no contexto da COP-30 em Belém? A hipótese orientadora sustentou que, desde que amparada por fundamentos normativos adequados e por estruturas de governança apropriadas, a adoção da IA pode se converter em ferramenta estratégica de planejamento urbano e sustentabilidade ambiental.

O desenvolvimento da pesquisa permitiu confirmar a plausibilidade dessa hipótese. A análise da Lei nº 14.133/2021 demonstrou que o ordenamento jurídico brasileiro contempla, de maneira explícita, a possibilidade de contratação de soluções inovadoras, mediante mecanismos como o diálogo competitivo, as contratações integradas e a exigência de critérios de sustentabilidade nos processos licitatórios. Tais dispositivos fornecem o respaldo necessário para que a Administração Pública possa atuar de forma proativa e inovadora diante de desafios complexos como os que envolvem a preparação e execução da COP-30.

Com base nos parâmetros normativos investigados, foi possível construir uma proposta prática de implementação da IA no setor de limpeza urbana, articulada a partir da criação de um Centro de Inteligência Climática e Urbana (CICU). Esta proposta contempla etapas sequenciais de coleta e integração de dados, aplicação de sensores inteligentes e acompanhamento em tempo real das demandas por serviços de coleta e destinação de resíduos sólidos. O modelo sugerido baseia-se em experiências exitosas internacionais, adaptadas à realidade institucional e tecnológica do município de Belém.

Entretanto, a aplicação de IA na gestão pública ambiental não se restringe a aspectos técnicos ou operacionais. Ao contrário, a efetividade da política pública está diretamente condicionada à existência de uma infraestrutura institucional capaz de garantir governança de dados, segurança da informação, capacitação de servidores e integração intersetorial. Além disso, o financiamento das soluções tecnológicas deve estar alinhado a instrumentos jurídicos de estímulo à sustentabilidade, como os fundos climáticos, os convênios internacionais e as cláusulas de condicionamento ambiental nas renúncias fiscais, previstas na Emenda Constitucional nº 132/2023.

A ausência de infraestrutura tecnológica em grande parte dos municípios da Amazônia urbana, constitui, ainda hoje, uma das maiores barreiras à inovação no setor público. Essa limitação não deve, contudo, ser argumento para a inércia, mas sim um fator mobilizador de planejamento antecipado, investimento em formação profissional e modernização institucional. A COP-30 oferece, nesse sentido, uma janela de oportunidade para o fortalecimento da capacidade estatal local, mediante parcerias estratégicas, uso eficiente de recursos públicos e incorporação de boas práticas de gestão climática e urbana.

Um aspecto adicional de relevância na análise refere-se à responsabilidade jurídica do Estado na incorporação de soluções tecnológicas alinhadas aos princípios da legalidade, da eficiência e da sustentabilidade. A adoção da Inteligência Artificial pela Administração Pública não pode ser guiada por modismos ou por um discurso de inovação desvinculado de conteúdo técnico e institucional. Trata-se de garantir que o uso da IA ocorra com base em critérios de racionalidade administrativa, transparência nos processos decisórios e respeito aos limites da responsabilidade fiscal. Nesse contexto, a IA deve ser compreendida como uma ferramenta de suporte e qualificação das políticas públicas, jamais como substituta da ação governamental ou como finalidade autônoma da atuação estatal.

Outrossim, a realização da COP-30 em Belém representa uma oportunidade singular para afirmar a Inteligência Artificial como instrumento estratégico da administração pública ambiental. Fundamentada em dados, evidências e indicadores de desempenho, a IA possibilita maior previsibilidade, otimização de recursos e capacidade de resposta imediata, características essenciais para a gestão eficiente de grandes eventos. Por conseguinte, a conferência pode funcionar como um espaço privilegiado de experimentação institucional, capaz de desencadear transformações estruturais na governança urbana e ambiental da Amazônia, com efeitos duradouros na formulação e na execução de políticas públicas sustentáveis.

Em suma, o uso da IA não se limita ao contexto da COP-30: trata-se de uma agenda permanente que exige modernização institucional, qualificação técnica, integração de políticas setoriais e compromisso social. A Lei 14.133/2021 fornece o respaldo jurídico necessário à contratação de soluções inovadoras, que devem estar alinhadas à governança de dados, à tributação ecológica e à justiça intergeracional. A adoção dessas tecnologias não substitui o papel do gestor público, mas potencializa sua capacidade de decisão e compromisso com uma gestão climática, inclusiva e orientada por resultados.

6. Referências

ACSELRAD, Henri. Os direitos ambientais no Brasil. Rio de Janeiro: Relume Dumará, 2004. p. 73.

APPY, Bernard. Reforma tributária e eficiência econômica. Brasília: IPEA, 2023. p. 7.

BRASIL. Lei n.º 12.187, de 29 de dezembro de 2009. Institui a Política Nacional sobre Mudança do Clima – PNMC. Diário Oficial da União: seção 1, Brasília, DF, 30 dez. 2009.

BRASIL. Lei n.º 12.305, de 2 de agosto de 2010. Institui a Política Nacional de Resíduos Sólidos – PNRS. Diário Oficial da União: seção 1, Brasília, DF, 3 ago. 2010.

BRASIL. Lei n.º 14.133, de 1º de abril de 2021. Lei de Licitações e Contratos Administrativos. Diário Oficial da União: seção 1, Brasília, DF, 1º abr. 2021.

CARRAZZA, Roque Antônio. Curso de direito constitucional tributário. 32. ed. São Paulo: Malheiros, 2022. p. 148, 151, 153.

CARVALHO, Paulo de Barros. Curso de direito tributário. 31. ed. São Paulo: Saraiva Educação, 2020. p. 64.

DERZI, Misabel Abreu Machado. Direito tributário ambiental. 3. ed. São Paulo: Noeses, 2018. p. 99, 102.

GOBETTI, Bruno; ORAIR, Rodrigo. Federalismo e redistribuição na Reforma Tributária. Brasília: IPEA, 2023. p. 28.

LEROY, Jean-Pierre. Governança ambiental urbana: novos paradigmas para a política pública. In: ACSELRAD, Henri (org.). Meio ambiente e democracia: práticas participativas nas políticas públicas. Rio de Janeiro: Fundação Heinrich Böll, 2004. p. 85.

LEITE, José Rubens Morato. Direito ambiental: a gestão ecológica e os novos instrumentos jurídicos. 17. ed. São Paulo: Saraiva Educação, 2020. p. 223.

MILARÉ, Édis. Direito do ambiente: a gestão ambiental em foco. 13. ed. São Paulo: Revista dos Tribunais, 2021. p. 1045.

SILVA, André Luiz Amaral da. Governança climática na Amazônia urbana: COP-30 e administração pública. Belém: s.n., 2024. p. 11, 17.

TRIBUNAL DE CONTAS DA UNIÃO. Acórdão n.º 1214/2020 – Plenário. Rel. Min. Augusto Nardes. Brasília, DF, 2020. Disponível em: https://pesquisa.apps.tcu.gov.br. Acesso em: 12 maio 2025. VIOLA, Eduardo; FRANCHINI, Matías. Política climática global e brasileira: um paradigma em transição. São Paulo: Annablume, 2013. p. 219.


[1] Para Édis Milaré (2021), a sustentabilidade é hoje um vetor que deve permear toda a atuação do poder público, especialmente na formulação de políticas públicas ambientais. Segundo o autor, “o Estado moderno precisa integrar os avanços tecnológicos e científicos à sua atuação normativa e executiva, sob pena de tornar-se ineficaz diante da complexidade dos problemas ecológicos”². O uso da IA, nesse sentido, representa uma evolução necessária do aparato estatal para lidar com as exigências climáticas e urbanas de forma estratégica e transparente.

[2] A governança ambiental contemporânea exige não apenas normas jurídicas consistentes, mas também estruturas institucionais capazes de absorver inovação tecnológica. Para José Rubens Morato Leite (2020), “a proteção ambiental no século XXI deve incorporar métodos preditivos, tecnologias limpas e gestão baseada em riscos, pois o desafio não é apenas jurídico, mas organizacional e sistêmico”¹. A aplicação da inteligência artificial nos serviços públicos urbanos, especialmente na área de resíduos sólidos, está alinhada a esse novo paradigma, permitindo à Administração atuar de forma preventiva, eficiente e orientada por dados.

[3] Para ACSELRAD, Henri (2004, p. 73): “A crise ecológica nas cidades da Amazônia não pode ser enfrentada apenas com medidas pontuais. É necessário um novo paradigma de governança ambiental urbana, pautado na ciência de dados, participação cidadã e racionalidade técnica, especialmente diante de eventos globais que tensionam as capacidades locais”.

[4] A construção de políticas públicas ambientais eficazes demanda, necessariamente, um modelo de governança multinível, conforme LEROY, Jean-Pierre (2004), que articule diferentes esferas federativas, envolva múltiplos stakeholders e seja orientado por instrumentos de planejamento baseados em dados confiáveis e transparentes. Esse modelo, mais do que uma escolha, é uma exigência diante da complexidade dos problemas socioambientais urbanos contemporâneos.

[5] VIOLA, Eduardo; FRANCHINI, Matías (2013), são taxativos ao afirmarem que “A incorporação de tecnologias sustentáveis na gestão urbana só será efetiva se acompanhada de processos contínuos de qualificação técnica, modernização da máquina pública e fortalecimento das capacidades locais. Cidades amazônicas, em especial, precisam combinar inovação tecnológica com justiça ambiental, sob pena de aprofundar desigualdades socioambientais já historicamente consolidadas”.

André Luiz Amaral da Silva
André Luiz Amaral é doutorando em Administração Pública, doutor em Ciências Jurídicas, mestre em Desenvolvimento e Meio Ambiente Urbano e especialista em Direito Público. É assessor jurídico na Alepa, professor em cursos de Graduação e Pós-Graduação em Direito e Gestão Pública, presidente da Comissão de Assuntos com o Poder Legislativo da OAB/PA e advogado no escritório André Luiz Amaral – Advogados Associados.

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