O governo de Portugal sofreu uma queda histórica na última terça-feira, 11 de março, após a rejeição de uma moção de confiança no Parlamento. O resultado já era esperado, já que toda a oposição, com exceção do partido Iniciativa Liberal, votou contra o governo do primeiro-ministro Luís Montenegro. A crise política foi desencadeada por disputas em torno de uma comissão parlamentar de inquérito relacionada a uma empresa familiar ligada ao chefe de governo.
Essa é a segunda vez na história democrática de Portugal que a rejeição de uma moção de confiança leva à queda de um governo. A primeira foi em 1977, quando o executivo liderado por Mário Soares teve o mesmo destino. A gestão de Montenegro, que havia sido eleita em 10 de março de 2024, completou exatamente um ano antes de ser dissolvida.
A crise política teve origem na pressão exercida pela oposição para que uma comissão parlamentar de inquérito investigasse possíveis irregularidades envolvendo a empresa familiar de Luís Montenegro. Durante um longo debate no Parlamento, o primeiro-ministro tentou negociar diretamente com o Partido Socialista (PS), principal legenda da oposição, propondo definir prazos mais curtos para a investigação. O PS recusou qualquer acordo, insistindo que a comissão deveria seguir seu curso sem interferências do governo.
O PS argumentou que o governo estava tentando condicionar os trabalhos da comissão de inquérito ao propor um prazo curto para a investigação. Já o governo de Montenegro acusou a oposição de criar instabilidade política ao rejeitar qualquer tipo de diálogo.
O ponto de ruptura ocorreu quando o governo propôs que a comissão de inquérito apresentasse suas conclusões até o final de maio, o que foi imediatamente recusada pelo PS. Ficou claro, então, que a moção de confiança seria derrubada e que o governo não conseguiria evitar sua própria dissolução.
Montenegro chegou a interromper a sessão do Parlamento para permitir que o PS apresentasse formalmente suas demandas, mas não houve avanço nas negociações. Com a resistência da oposição em recuar, a moção de confiança foi levada a votação e rejeitada, selando o fim do governo.
Agora, o próximo passo será definido pelo presidente de Portugal. Marcelo Rebelo de Sousa convocou uma reunião com os partidos e o Conselho de Estado para os dias 13 e 14 de março, quando decidirá se dissolverá o Parlamento e convocará eleições antecipadas.
A expectativa é que novas eleições sejam realizadas no dia 11 ou 18 de maio. Até que um novo governo seja eleito e empossado, a gestão de Montenegro continuará no cargo de forma interina, apenas para garantir o funcionamento da administração pública.
A queda de Montenegro foi motivada por um escândalo envolvendo a empresa de consultoria Spinumviva, fundada por ele e atualmente administrada por seus filhos. A oposição acusou o premiê de favorecer a empresa, que teria recebido pagamentos mensais de 4.500 euros de uma operadora de cassinos.
A derrota de Montenegro contou com a convergência improvável e histórica do Partido Socialista, de centro-esquerda, e do Chega, de extrema-direita. Como o governo do PSD não tinha maioria absoluta, sua governabilidade sempre dependeu de alianças, que se mostraram insustentáveis.
Esta é a terceira vez, desde, 2022, que os portugueses podem ter que voltar às urnas. O país reelegeu António Costa em janeiro de 2022, que estava no cargo desde 2015 e que renunciou ao cargo em novembro de 2023, após ser alvo de uma investigação policial. Nas eleições subsequentes, em março de 2024, Montenegro venceu por uma margem extremamente apertada de apenas 1.500 votos sobre o Partido Socialista.
Com a possibilidade de novas eleições, a crise tende a se prolongar, pois não há um partido com clara vantagem nas pesquisas e uma nova votação dificilmente resultará em um governo estável. Tanto o PSD quanto o PS estão praticamente empatados em intenção de votos, num cenário de fragmentação partidária e polarização política. Portugal pode entrar em um ciclo de governos instáveis, o que consequentemente aumenta a desconfiança da população e dos mercados internacionais.
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