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Muitos já devem ter assistido à série que está fazendo sucesso na Netflix e já rendeu inúmeros comentários, intitulada Adolescência. Claro que também fui conferir. Porém, o que mais me capturou não foi a estrutura psíquica do personagem principal, Jaime, e sim o bullying e toda a problemática que acarreta, não especificamente para aquele adolescente, mas para crianças e adolescentes de modo geral.

A palavra bullying se origina de bully, que significa valentão. São agressões físicas, verbais ou psicológicas – em geral as três ocorrem de  formas simultânea – com o objetivo de intimidar e humilhar a vítima, utilizando um discurso que ridiculariza o outro em seu aspecto físico, intelectual, econômico e sexual ou por diferenças comportamentais em razão da cultura ou de algum transtorno mental.

É uma prática covarde porque o agressor age com o apoio de um grupo que, mesmo atuando apenas como espectador, incentiva a violência, e tem como alvos preferidos pessoas físicas ou psiquicamente fragilizadas, que não se enquadram no discurso social da atualidade por serem muito magras ou por excesso de peso; por dificuldade de aprendizado ou por excesso de inteligência (pasmem!); ou por baixo poder aquisitivo.

O mais preocupante é saber que justamente a escola, onde nossos filhos passam uma boa parte do dia, é o palco principal desse tipo de violência. Ela funciona como um microorganismo social, um laboratório do qual podemos extrair uma amostra considerável do comportamento social  que traz demonstração cada vez maior de adoecimento.

A escola é o espelho dessa sociedade hipócrita que prega o discurso do politicamente correto e do respeito ao outro, desde que esse outro faça parte do grupo dominante que dita as regras e que estabelece o que é a normalidade.  É o maior indicador de que sempre a sociedade será reflexo de quem está no poder e que justiça e verdade são cada dia mais relativizadas.

Os algozes, que promovem a covardia e que se dizem “normais”, também precisam de um olhar sensível, pois, não raro, são frutos de um ambiente familiar hostil, onde experimentam
abusos físicos e psíquicos e acabam, por um processo de identificação com o agressor, repetindo o comportamento violento, até mesmo como forma de maquiar sua própria dor.

Os familiares devem ficar atentos ao comportamento de seus filhos. O primeiro “sintoma” é o isolamento social. A criança ou adolescente fica cada vez mais no quarto e começa a se relacionar somente no virtual porque é mais “seguro”, visto que por trás da telinha ele pode ser o que quiser e o outro não terá acesso às suas fragilidades. Outros indicadores são a queda do rendimento escolar, a baixa autoestima, depressão, síndrome do pânico e ansiedade.
O bullying também pode culminar em suicídio ou comprometer, de forma devastadora, as relações sociais no decorrer de toda a existência do sujeito.

Optar por mudar o filho da escola apenas cria a ilusão de solucionar o problema. É verdade que, dependendo da atitude dos dirigentes, retirá-los desse ambiente pode ajudar.  Contudo, o mais indicado é o acolhimento e o fortalecimento psíquico da vítima para que ela possa, de forma pacífica (não passiva) e inteligente, lidar com seu agressor.

Precisamos pensar, com urgência, na criação de mecanismos nas escolas que favoreçam o diálogo, a conscientização e que obriguem os agressores e o grupo apoiador da violência a tratamento psíquico, como forma de extinguir essa prática perversa que vem, a cada dia, ganhando novos contornos e refinamento.

France Florenzano
France Florenzano é psicanalista, pós-graduada em Suicidologia pela Universidade de São Caetano do Sul. Whatsapp: (091)99111-5350 Instagram: psifranceflorenzano

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