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Mercedário, Porto Futuro II (Galpões das Docas), Parque Linear da Doca — foram algumas das inaugurações que marcaram a maratona de fim de semana do presidente pela cidade das mangueiras. Essas entregas somam-se ao Parque da Cidade e ao Mercado de São Brás nos preparativos para receber a Conferência do Clima.

Até aqui, tudo certo. Mas não é exatamente sobre isso que quero falar. Quem acompanha este editorial de cidades sabe que uma preocupação recorrente tem sido o pós-COP — o destino dessas obras após o evento. A própria fala do governador — espero que ele esteja lendo esses ensaios — tocou nesse ponto. E é por isso que chama atenção o fato de, com exceção do Parque da Cidade e da Estação de Tratamento de Esgoto (finalmente inaugurada!), estarmos sempre reinaugurando o que já existia.

Quem tem menos de 20 anos talvez tenha visto agora a primeira reinauguração do Mercado de São Brás. Mas quem está entre os 40 e 50 deve lembrar de pelo menos duas anteriores, nos anos 1980 e 2000. O mesmo acontece com a Praça Batista Campos, reinaugurada no ano passado pelo prefeito anterior — já com vários sinais de depredação — e que também foi reformada em outras gestões, quase sempre às vésperas de eleições.

Diante disso, duas perguntas se impõem: por que precisamos reinaugurar constantemente os mesmos espaços públicos? E quais alternativas existem para que isso não se repita?

A primeira resposta é simples: o município não tem recursos suficientes para manutenção imediata — apesar de termos uma Secretaria de Zeladoria Urbana. Sem entrar em tecnicismos, o orçamento destinado à manutenção é irrisório, e a burocracia torna impossível qualquer ação ágil. Quando o problema se agrava, o espaço se degrada até o ponto em que uma reforma total — e nova inauguração — parece a única saída.

Mas há caminhos alternativos, e eles não são novidade. Basta olhar para experiências bem-sucedidas no próprio Pará, como a cessão de espaços públicos para Organizações Sociais (OSs) — caso do Hangar e da Estação das Docas —, ou ainda para modelos de gestão privada de espaços públicos, prática adotada em São Paulo desde os anos 1980.

As Organizações Sociais surgiram na reforma administrativa dos anos 1990, justamente para contornar a rigidez burocrática. São entidades públicas não estatais, capazes de captar tanto recursos públicos quanto privados, garantindo manutenção constante e programação ativa — como se vê no Mangal das Garças e na Estação das Docas.

Já a gestão privada de espaços públicos permite que empresas adotem praças, parques ou canteiros em troca de publicidade. A empresa se responsabiliza pela manutenção, revitalização e ativação desses espaços, tornando-os atrativos para investimentos, empreendedores e para o convívio das pessoas – vale lembrar, não se trata de uma privatização, pois o espaço continua público.

Por fim, há o terceiro caminho — o que infelizmente seguimos: manter tudo como está. Nesse modelo, esperamos a degradação até que se justifique um novo empréstimo e uma nova reforma, inaugurando de novo o que já foi inaugurado. Assim, Belém segue se tornando, a cada gestão, um verdadeiro Museu de Grandes Novidades — onde o dinheiro que poderia financiar creches, postos de saúde e uma mobilidade urbana mais sustentável se perde na repetição de promessas reformadas.

Acilon Cavalcante
Arquiteto e urbanista apaixonado por cidades, histórias e pessoas. Tem mestrado em Artes, mestrado em Arquitetura e é doutorando em Mídias Digitais pela Universidade do Porto. Premiado em projetos de planejamento urbano, já atuou com governos e ONGs no Brasil, Canadá e Portugal, sempre conectando urbanismo, design participativo e sustentabilidade. Gosta de transformar dados em ideias e ideias em cidades mais humanas.

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