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As duas mudas de Samaumeira (Ceiba pentandra) plantadas, há um ano, pelo presidente da República e sua esposa, nos jardins do Palácio da Alvorada, carregam uma trajetória que atravessa gerações e guarda uma forte simbologia.

A Linha Ancestral

Essas árvores têm uma origem que remonta a uma Samaumeira que existiu por séculos no Largo de Nazaré, em Belém, Pará, próximo à Basílica de Nossa Senhora de Nazaré — um dos locais mais simbólicos para os paraenses, por ser o coração do Círio de Nazaré. Essa árvore, considerada uma guardiã da memória urbana, resistiu por muito tempo até cair no final de 2024, enfraquecida pela ação do tempo, cupins e chuvas, e possivelmente falta de cuidado.

Essa Samaumeira-mãe gerou sementes que deram origem a outra árvore na praça de Benfica, na vila do mesmo nome, no município de Benevides, às margens do rio Benfica, antiga aldeia indígena Sapararé. Essa samaumeira, plantada no início dos anos 1980, passou a liberar suas painas sobre o sítio de um casal de canoístas, inspirando-os a criar o Viveiro Sapararé.

Batizado em homenagem à etnia Sapararé, antigos guardiões da floresta que habitaram a margem direita do rio Benfica, o viveiro se dedica a produzir mudas e sementes de espécies nativas para distribuição gratuita, incentivando as pessoas a plantarem árvores mais com as mãos do que com palavras.

Em outubro de 2023, pesquisadores da Embrapa de Brasília procuraram o viveiro em busca de uma muda de samaumeira, mas foram convencidos pelo casal a levarem pelo menos duas. Essas mudas seguiram para a capital federal e, meses depois, foram escolhidas para serem plantadas nos jardins projetados por Burle Marx, às margens do lago Paranoá.

Um Legado Vivo

As mudas que hoje crescem no jardins do Palácio da Alvorada são, portanto, netas da samaumeira do Largo de Nazaré e filhas da samaumeira de Benfica. Além de representarem a biodiversidade amazônica, carregam consigo histórias de resistência, preservação e afeto popular — desde a memória dos povos indígenas até as mãos que hoje cultivam a regeneração da natureza.

Enquanto pedaços da samaumeira caída de Nazaré eram disputados e até comercializados como relíquias, o Viveiro Sapararé intensificou a doação de mudas e sementes pelas redes sociais, mostrando que o verdadeiro valor dessa árvore está na continuidade da vida e na preservação da floresta.

Assim, o plantio dessas duas mudas no coração do poder brasileiro simboliza a união entre a memória, a biodiversidade e a esperança, conectando a Amazônia ao Planalto Central por meio das mãos de quem cuida da terra.

E para aqueles que desejam fazer parte dessa história de preservação e renovação, o Viveiro Sapararé ainda tem mudas e sementes de Samaumeira disponíveis para doação. Uma oportunidade para todos semearam suas próprias raízes na memória e na esperança da floresta.

Pedro Paulo Sousa
Pedro Paulo Sousa é paraense de Santarém, bacharel em Direito e docente do Ensino Superior, atualmente canoísta e jardineiro.

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