A aprovação do Projeto de Lei nº 729/2024, que dispõe sobre o Estatuto do Magistério Público do Estado do Pará, enviado pelo governador Helder Barbalho anteontem (16) à Assembleia Legislativa, ensejou cerco ao Palácio Cabanagem e cenas tristes de enfrentamento envolvendo os professores e a tropa de choque da Polícia Militar, com direito a bombas de gás lacrimogêneo, balas de borracha e spray de pimenta, cadeiras voando e empurrões na rua. Os professores fizeram um cordão humano para impedir o acesso de deputados, a fim de que não pudessem votar, e a PMPA fez um bloqueio armado. Em plenário, um feito inédito: os partidos de esquerda e de direita se juntaram na oposição. Resultado: dos 41 deputados, dez foram votos contrários, das bancadas do PT (Carlos Bordalo, Maria do Carmo Martins Lima, Dirceu Ten Caten e Elias Santiago), PSol (Lívia Duarte), PL (Rogério Barra, Toni Cunha e Coronel Neil), PRD (Bob Fllay ) e Avante (Wescley Tomaz).
Onipresente na defesa do governador em todas as sessões plenárias, a vice-líder do Governo, deputada Maria do Carmo Martins Lima, fez um corajoso pronunciamento na tribuna, apontando as distorções do projeto, a começar pela tramitação em regime de urgência, que não permitiu uma análise acurada dos dispositivos, considerando o seu enorme impacto. Ela evidenciou que as mudanças causarão uma série de perdas para os profissionais do magistério, extremamente prejudiciais ao já combalido quadro da educação pública no Estado do Pará. Maria frisou a perda de direitos já garantidos: o Estatuto do Magistério (Lei nº 5.351/1986) e o Plano de Cargos, Carreiras e Remuneração dos profissionais da educação (Lei nº 7.442/2010) asseguram benefícios importantes como progressões automáticas, gratificações específicas e regras claras sobre a carga horária dos docentes. A revogação do PCCR, por exemplo, cria incertezas sobre as futuras progressões dos servidores do magistério. A progressão horizontal por tempo de serviço, substituída por avaliação de desempenho conduzida pelo próprio titular da Seduc, levanta preocupações sobre a transparência e a imparcialidade desses processos.
“O governo do estado manda para esta Casa um projeto dessa magnitude, uma canetada que afeta 25 mil trabalhadores, em dois dias (de tramitação) para ser votada na última sessão (do ano). Não esperem de mim que recrimine o movimento porque o governo radicaliza quando envia para cá, sem nenhuma discussão, a alteração de cinco leis estaduais. Não há como falar em um estado se preparando para a COP 30 cortando os direitos dos trabalhadores da educação”, criticou a deputada Lívia Duarte, na tribuna.
O líder do PT, Carlos Bordalo, enfatizou que a exclusão de mais de cinco mil professores da classe especial, que agora serão transferidos para o quadro suplementar, representa desvalorização da carreira e ameaça à estabilidade deles. A perda de benefícios como a Gratificação de Nível Superior agrava ainda mais a situação, prejudicando a qualidade de vida dos docentes. A avaliação de desempenho deve ser rigorosa, mas também precisa ser clara, justa e com critérios objetivos, o que não é o caso do projeto, entendeu a bancada do PT. A revogação de leis como a do Some (Lei nº 7.806/2014) e a que trata das gratificações de educação especial (Lei nº 5.810/1994) impacta diretamente a remuneração dos professores, especialmente daqueles que atuam em áreas de maior complexidade, como a educação especial.
Já a mudança da “hora aula” de 45 minutos para uma “hora relógio” de 60 minutos parece aumento da carga horária sem a devida compensação, pontua Elias Santiago. Além disso, o fim da jornada de 150 horas mensais para docentes, substituída por jornadas de 100 ou 200 horas, atinge a qualidade do trabalho dos profissionais, forçados a aumentar sua carga em condições extremamente desgastantes. Para a bancada do PT, a restrição dos direitos ao pagamento de aulas suplementares e a exclusão de servidores readaptados, cedidos ou afastados de receber essas aulas tem caráter punitivo, especialmente considerando que esses profissionais, em muitos casos, enfrentam desafios significativos. A política de licença para aprimoramento profissional também não considera adequadamente as necessidades e a realidade dos professores, afirmam os petistas.
A criação de gratificações específicas (CEMEP, PEI, Educação Especial, e outras) que não integram a base de cálculo da contribuição previdenciária e não se incorporam à aposentadoria representa uma forma de precarização dos benefícios dos docentes, observou Dirceu Ten Caten. Além disso, a alteração do pagamento das gratificações de atividades como o Some, que não será mais garantido durante as férias ou licenças superiores a 30 dias, desvaloriza ainda mais esses profissionais.
O Sintepp está alarmado com a omissão de qualquer referência ao piso salarial do magistério, previsto na Lei Federal nº 11.738/2008. Para os professores, a ausência de garantias sobre o piso salarial é uma violação direta dos direitos dos profissionais da educação e uma desvalorização do trabalho docente. O não cumprimento do piso pode resultar em estagnação salarial, agravando a já precária situação dos docentes no Estado. A revogação de leis relacionadas à jornada de trabalho, como a Lei da Jornada (Lei nº 8.030/2014), resulta em jornadas mais longas e com maior flexibilidade sem a devida compensação. Funções específicas, como as de docentes em unidades administrativas ou em atividades técnico-pedagógicas, serão prejudicadas pela alteração das regras de pagamento de aulas suplementares e outras gratificações.
Por sua vez, o secretário de Estado de Educação, Rossieli Soares, que concebeu o projeto, afirma que haverá ganhos na titulação. Especialização passa de 1,5% para 6%, Mestrado de 3% para 12%, e Doutorado de 4,5% para 18%, sempre em relação ao valor-base. Também garante que haverá aumento do número de níveis para progressão de 12 para 15, com redução dos intervalos de 3 para 2 anos, todos vinculados ao desempenho educacional.
Agora, o Projeto de Lei será encaminhado para sanção do governador Helder Barbalho, após o que entrará em vigor em 90 dias.
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