A Faculdade de Direito da Universidade Nova de Lisboa retirou o anúncio de uma pós-graduação intitulada “Pós-graduação em Racismo e Xenofobia”, promovida pelo Observatório do Racismo e Xenofobia da instituição e ministrada exclusivamente por professores brancos, após ser alvo de intensas críticas. A ausência de pessoas racializadas no corpo docente de um curso voltado para o estudo de temas sensíveis como o racismo e a xenofobia foi considerada completamente inadequada e vários protestos tomaram as redes sociais portuguesas, sendo considerada uma falha grave na estrutura do curso. E, para acrescentar na situação já tensa, segundo informações do Público, um dos módulos divulgados era intitulado “O racismo existe mesmo?”. Rapidamente, mensagens de indignação foram publicadas por várias pessoas e entidades e a disciplina foi apontada como, além de insensível e ofensiva, uma abordagem equivocada, como se fosse uma instrução sobre como perpetuar o racismo e a xenofobia em vez de combatê-los.
Paula Cardoso, jornalista e fundadora da rede Afrolink, foi uma das primeiras a denunciar o que descreveu como “chocante” e “insultuoso”. Em entrevista à Agência Lusa, Cardoso destacou que a composição do curso era um reflexo do racismo estrutural presente em muitas instituições. “É como uma organização de combate à discriminação contra as mulheres ser composta apenas por homens”, criticou. Segundo ela, a criação de um curso sobre racismo sem a participação de pessoas racializadas demonstra uma visão limitada e distanciada do tema.
O módulo que questiona a existência do racismo foi visto como especialmente problemático. Críticos afirmaram que a inclusão dessa pergunta em um curso acadêmico reflete a falta de entendimento sobre a realidade do racismo, especialmente em um país como Portugal, onde o debate sobre racismo estrutural ainda encontra resistências. “É uma questão inqualificável que só poderia ter sido criada por alguém que não entende o que está em jogo”, afirmou Cardoso.
Paula Cardoso também destacou que o Observatório do Racismo e Xenofobia, como outras instituições, frequentemente inclui contribuições de pessoas negras sem oferecer contrapartidas financeiras adequadas – ou quaisquer. “Quando chega o momento de reconhecer a especialização e pagar pelo trabalho, as pessoas negras não são remuneradas”, criticou. “Isso é Portugal, isso é o racismo estrutural em Portugal”. O Observatório do Racismo e Xenofobia, que foi criado com o objetivo de monitorar e combater práticas racistas e xenófobas no país, está sob maior escrutínio público após esse episódio, já que specialistas e ativistas reiteram consistentemente a importância de que discussões sobre racismo, xenofobia e discriminação sejam lideradas e informadas por aqueles que vivenciam esses problemas diretamente. Em todo o mundo, estudos e iniciativas de combate ao racismo apontam que a inclusão de vozes negras e racializadas é uma questão de representatividade que garante que as abordagens sejam fundamentadas na experiência real dessas populações e nas necessidades das comunidades marginalizadas.
Imagem: Afrolink / Instagram / Reprodução
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