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Um diagnóstico amplo sobre a saúde emocional de adolescentes no Pará trouxe à superfície dados que acendem alerta em escolas, famílias e órgãos públicos. A Avaliação do Futuro, estudo conduzido pelo Instituto Ayrton Senna analisou 6.205 estudantes da 2ª série do Ensino Médio da rede pública e concluiu que a instabilidade emocional é hoje um dos maiores desafios enfrentados pela juventude. Os resultados mostram que 8 em cada 10 estudantes parauaras relataram ao menos um sintoma de ansiedade ou depressão, e que o desempenho escolar está diretamente ligado ao desenvolvimento de competências socioemocionais, como autogestão, resiliência e capacidade de lidar com frustrações.

O levantamento integra uma pesquisa nacional envolvendo cinco estados e indica que os alunos com maior habilidade de planejar, manter o foco, regular emoções e persistir diante de dificuldades apresentaram melhor desempenho em Língua Portuguesa e Matemática. O estudo também revelou fatores de fragilidade emocional: 32% disseram sentir-se esgotados e sob pressão, 31% afirmaram perder o sono por preocupações e 19% relataram depressão ou tristeza profunda, enquanto 20% declararam perda significativa de autoconfiança. Além disso, 22% enfrentam dificuldades persistentes de concentração, uma evidência de que o sofrimento psíquico está atravessando diretamente a aprendizagem.

A pesquisa identificou um recorte relevante: meninas apresentam índices ainda mais altos de insegurança emocional. A proporção de jovens que afirmaram ter perdido confiança em si aumentou para 22% entre alunas, contra 17% entre estudantes do sexo masculino. Segundo a psicóloga e pesquisadora Ana Crispim, gerente de pesquisa no eduLab21, esse resultado acompanha tendências nacionais e internacionais. Ela observa que as emoções, durante a adolescência, tornam-se complexas e difíceis de gerir, o que se intensifica entre meninas diante de fatores como padrões de beleza, pressão social e comparações constantes. Em sua avaliação, “sentimentos como tristeza, raiva e ansiedade tendem a ser mais complexos e difíceis para que o adolescente os administre, algo que parece ser ainda mais acentuado entre meninas”.

Crispim afirma que a intervenção escolar precisa ir além do diagnóstico. Para ela, espaços acolhedores, vínculos fortes com educadores e programas estruturados de desenvolvimento socioemocional contribuem para reduzir danos e fortalecer autoestima. “Além de identificar fatores de risco associados à prejuízos na saúde mental, as escolas precisam mirar em fatores protetivos como fortalecer espaços seguros, onde vínculos sólidos entre alunos e educadores favorecem a escuta, o acolhimento e o encaminhamento adequado”, defende. A pesquisadora reitera que estimular autoconfiança e habilidades de regulação emocional pode ajudar adolescentes a lidar com pressões internas e externas, especialmente em fases de transição acadêmica e social.

Outro ponto sensível mapeado pelo estudo é a violência simbólica dentro das escolas. 24% dos estudantes relataram ter sofrido bullying, principalmente por motivos relacionados à aparência física e raça/cor. O Instituto Ayrton Senna alerta que práticas de assédio e humilhação não só agravam quadros de ansiedade e depressão, mas também impactam rendimento acadêmico e capacidade de convivência. Esses efeitos, segundo o relatório, não desaparecem com o tempo e podem gerar cicatrizes emocionais de curto, médio e longo prazo.

Para a gerente executiva do eduLab21, Gisele Alves, enfrentar o problema exige ação articulada. Ela afirma que não existe solução única e que o combate à crise de saúde mental juvenil depende de estratégias complementares. “Não há bala de prata. É preciso adotar múltiplas estratégias — pedagógicas, psicológicas e sociais — para construir respostas efetivas à crise de saúde mental entre os jovens”, diz. Alves ressalta que políticas intersetoriais devem conectar educação, saúde e assistência social para que o cuidado seja contínuo e estruturado.

Além dos estudantes, o estudo chama atenção para o bem-estar de professores, que também enfrentam desgaste emocional e precisam de suporte institucional. “Promover saúde mental na escola significa criar um ambiente onde aprender e se sentir bem caminham juntos”, afirma Alves, lembrando que o bem-estar docente influencia diretamente a qualidade do vínculo com os alunos.

A Avaliação do Futuro, desenvolvida em parceria com o CAEd e a Secretaria de Educação do Estado, se soma a mais de uma década de pesquisas do eduLab21 e sublinha a urgência de integrar competências socioemocionais ao currículo e à gestão educacional. Os números indicam um cenário preocupante, mas também apontam caminhos. Investir em saúde mental escolar é investir no futuro de uma geração e, segundo o estudo, ignorar o sofrimento emocional pode custar caro para o desempenho acadêmico e para a vida adulta desses jovens.

Gabriella Florenzano
Cantora, cineasta, comunicóloga, doutoranda em ciência e tecnologia das artes, professora, atleta amadora – não necessariamente nesta mesma ordem. Viaja pelo mundo e na maionese.

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