Publicado em: 21 de novembro de 2025
Vimos nos últimos dias a exacerbação da comparação entre Belém e Berlim desde a fala infeliz do chanceler alemão por políticos sudestinos, meios de comunicação e até entre nós. Para invalidar a escolha de Belém, recorrem-se a indicadores como saneamento, IDH, PIB e educação, nos quais historicamente estamos em desvantagem.
Desde os anos 1960, a combinação entre urbanização acelerada e ausência de um projeto nacional para a Amazónia resultou em estagnação económica, vulnerabilidades sociais e degradação ambiental. Portanto, é lógico que estejamos atrás.
Como comparar então as duas cidades?
A resposta é simples: não devemos. Ainda assim, pode-se recorrer a indicadores subjetivos que ajudam a entender por que essa comparação é incabível.
Importada da psicologia, a Pirâmide de Maslow explica como percebemos a qualidade de vida. Organizada em seis níveis, vai das necessidades fisiológicas às de autorrealização, que no urbano correspondem, pela ordem, a habitação digna, saneamento, segurança, vida comunitária, identidade, cultura e participação pública.
Nas cidades menos prósperas, as prioridades recaem sobre infraestrutura e segurança; nas mais desenvolvidas, cultura, áreas verdes e sustentabilidade ganham relevância. Contudo, essa hierarquia nem sempre é linear. Há lugares onde faltam saneamento e coleta de resíduos, mas onde coexistem investimentos ligados ao topo da pirâmide, como a cultura e a participação popular, elementos que estão causando encantamento com Belém – e inveja também, infelizmente.
Isso revela que sociedades submetidas a privações prolongadas tendem a valorizar elementos simbólicos, culturais e identitários mesmo sem terem satisfeitas as necessidades básicas. Nesse contexto, pode-se citar também o Rio de Janeiro ou Joanesburgo, que, apesar de receberem megaeventos com promessas de legado, continuam enfrentando violência, desigualdade e infraestrutura precária.
A pirâmide é útil para compreender o bem-estar urbano, pois integra dimensões materiais e imateriais. Porém, a ideia de que cada nível só se alcança após o anterior não se confirma na prática. Cidades — como indivíduos — raramente satisfazem suas necessidades de forma ordenada; adaptam-se, ressignificam carências e constroem pertencimento mesmo em contextos adversos.
Por isso considero essa comparação, no mínimo, irracional.






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