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Uma campanha afetiva pelo fortalecimento da Fundação Paraense de Radiodifusão está no ar. Começou com um vídeo estrelado pelos jornalistas Edgar Augusto Proença e Lourdinha Bezerra, ícones da Rádio Cultura, e ganhou a imediata adesão de artistas, fazedores de cultura, jornalistas, radialistas, professores, sindicalistas, do povo do Pará e da Amazônia, alarmados com a situação: 59,1% do pessoal da Rádio, TV e Portal Cultura do Pará tem salário-base menor do que um salário mínimo. A reivindicação é justa, correta, merecida, legítima e necessária: o governador Helder Barbalho precisa encaminhar o projeto de Plano de Cargos, Carreira e Remuneração da Funtelpa para votação na Alepa, em regime de urgência. O projeto de lei do PCCR – que demorou cinco anos para ser gestado – pode corrigir essa iniquidade que constrange a sociedade paraense e põe em risco a própria existência da Rede Cultura de Comunicação Pública.

No ano passado, a ampla mobilização popular impediu a extinção da Funtelpa através do PL 701/2024. Em vídeo que postou em suas redes sociais, no dia 27 de dezembro, o governador Helder Barbalho garantiu que queria a Funtelpa forte. Mas a instituição está à beira da morte por inanição e os profissionais em condições indignas e vergonhosas. O corte de R$ 13 milhões no orçamento de 2025 deixou a Fundação na mais completa penúria. Mesmo o presidente Miro Sanova tendo conseguido R$ 7 milhões com o governo federal para digitalizar 22 municípios este ano, ainda precisa de pelo menos R$ 10,4 milhões para fazer o mesmo em outras 35 cidades e comprar um novo transmissor para Belém.

A TV Cultura do Pará corre risco concreto de sair do ar na capital e em 35 municípios paraenses já no mês que vem. A portaria 11.476/2023 estabeleceu junho deste ano como o prazo limite para digitalização das emissoras de TV no país. Para essa atualização tecnológica, a Funtelpa precisa de dinheiro. Porém, além de não receber injeção de recursos, ainda sofreu o corte de R$ 13 milhões. Além disso, o espectro analógico, antes usado pelas emissoras de TV, agora pertence às operadoras de celular. E 73 dos 75 municípios cobertos pela TV Cultura do Pará ainda recebem o sinal através dessa frequência. Se essas empresas de telefonia móvel requisitarem acesso, a emissora terá que sair do ar em Salinópolis e mais 34 cidades, por exemplo.

O presidente da Funtelpa, Miro Sanova, através do edital do Programa Brasil Digital, habilitou a TV Cultura para a instalação de infraestrutura básica e fornecimento de equipamentos necessários para o serviço de televisão digital. Mas a emissora só foi contemplada com a digitalização em 22 municípios. Desse total, a Funtelpa já tinha a outorga em 17 retransmissoras, porém sem recursos para digitalizá-las (Acará, Alenquer, Altamira, Bragança, Breves, Cametá, Capanema, Capitão Poço, Castanhal, Igarapé-Miri, Itaituba, Medicilândia, Oriximiná, Portel, Rondon do Pará, São Félix do Xingu e Tomé- Açu). No edital a EBC ainda ofereceu mais cinco cidades para a Funtelpa, já com outorga, que passarão a receber o sinal da TV Cultura do Pará em qualidade digital (Barcarena, Canaã dos Carajás, Dom Eliseu, Marabá e Moju).

Acontece que o Ministério das Comunicações só fará a doação e instalação dos equipamentos se a Funtelpa assumir a contrapartida de entregar antes a infraestrutura civil, lógica e elétrica, como a reforma dos prédios (edículas), e manutenção nas torres da emissora para receber os aparelhos, que são caros.

Míseros 0,06%. Esta é a fatia que a Funtelpa tem no orçamento do governo do Pará em 2025 para manter o Portal, a Rádio e a TV Cultura do Pará.

E ainda precisa digitalizar o sinal em Afuá, Anajás, Aveiro, Bagre, Baião, Cachoeira do Arari, Chaves, Conceição do Araguaia, Curuçá, Faro, Garrafão do Norte, Gurupá, Igarapé-Açu, Irituia, Limoeiro do Ajuru, Mocajuba, Monte Alegre, Muaná, Óbidos, Oeiras do Pará, Ourém, Ourilândia do Norte, Porto de Moz, Primavera, Rurópolis, Salinópolis, Santa Cruz do Arari, Santa Maria do Pará, São Domingos do Capim, São Miguel do Guamá, São Sebastião  da Boa Vista, Senador José Porfírio, Soure, Uruará e Vigia.

Ademais, é imprescindível um novo transmissor para a capital. O atual tem a potência de 10k, mas está tão velho e desgastado que opera apenas com 2k. Se sofrer qualquer dano, a TV sairá do ar deixando Belém, Ananindeua, Marituba, Benevides, Santa Izabel do Pará, Santa Bárbara, Santo Antônio do Tauá, Bujaru, Barcarena e cidades marajoaras como Cachoeira do Arari e Ponta de Pedras sem a programação. Urge a compra de equipamento novo, cujo valor está sendo negociado junto à Seplad. Se o repasse for autorizado rapidamente, poderá entrar em funcionamento a tempo da COP30.

Não custa lembrar que a TV Cultura transmite o Parazão, o carnaval de Belém e do interior, a Trasladação e o Círio, o Sairé de Alter do Chão, o festival das tribos de Juruti, shows e festivais com artistas locais na capital e no interior; inúmeros programas jornalísticos, educativos e de entretenimento de alta qualidade, exibe filmes e documentários de diretores locais, serviços públicos prestados pelo governo do estado, deverá fazer a cobertura da COP30 e os olhos do mundo estão voltados para Belém. Os produtos são muitos e exigem profissionais qualificados, obrigatoriamente com remuneração digna e compatível com a alta produtividade.

A aprovação do PCCR dos trabalhadores da fundação, cuja média salarial é mais baixa de toda a administração pública do Pará, terá impacto insignificante na folha do funcionalismo. Somente 158 empregados e servidores públicos serão contemplados, o que remete a outra pauta histórica: o concurso público. O último foi em 2010. Com as aposentadorias, falecimentos e abandonos de vagas de concursados, as emissoras Cultura têm perdido profissionais qualificados. A Lei 7.215/2008 prevê um Quadro de Empregos Permanentes da Funtelpa. Mas das 393 vagas previstas, só 158 estão ocupadas. Ou seja: há 300 vagas abertas! Das 46 funções, 41 estão com menos profissionais do que estipula a lei. O caso dos jornalistas é outra aberração: deveriam ser 85, mas são 25. No que tange aos repórteres cinematográficos, há 23 vagas, mas só 8 ocupadas.

O governador deve refletir quanto ao papel central das emissoras Cultura na valorização da cultura paraense. Fundadas na valorização de bens de natureza imaterial, como previsto pela Unesco, dão visibilidade a saberes, ofícios, modos de fazer, celebrações, formas de expressão cênicas, plásticas, musicais e lúdicas; fomentam e valorizam o conjunto de práticas, conhecimentos, expressões, representações e técnicas integrantes do patrimônio cultural do povo parauara; permitem a manutenção da memória na medida em que promovem registro e, portanto, a conservação da tradição oral, transmitida através de gerações. Este é o caso de emissoras internacionalmente prestigiadas, como a BBC, do Reino Unido; a Deutsche Welle, da Alemanha; a France Télévisions, da França; a NHK, do Japão; bem como a TV Brasil.

O jornalista, radialista, professor e escritor Edgar Augusto Proença, com 47 anos de serviço, apresentador do programa mais longevo da Rádio Cultura, foi diretor dela no governo de Jader Barbalho. Na época, havia diariamente o “Bom dia, governador!”, em que o pai de Helder conversava com a população, com alta audiência. Uma vez por mês Jader almoçava com Edgar Augusto e Mauro Bonna (então presidente da Funtelpa), tal era o prestígio e atenção que conferia à Fundação.

Helder Barbalho certamente não deseja passar à história como o coveiro da Funtelpa e o único governador a recusar negociar com os trabalhadores da Rede Cultura. A hora de corrigir essa distorção é agora.

Franssinete Florenzano
Jornalista e advogada, membro da Academia Paraense de Jornalismo, da Academia Paraense de Letras, do Instituto Histórico e Geográfico do Pará, da Associação Brasileira de Jornalistas de Turismo e do Instituto Histórico e Geográfico do Tapajós, editora geral do portal Uruá-Tapera e consultora da Alepa. Filiada ao Sinjor Pará, à Fenaj e à Fij.

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