Na maioria das vezes, quando se ouve a palavra “cultura”, estão se referindo a artes, música, teatro, cinema etc. Assim é na maioria das vezes que dizem “evento cultural”, “política cultural” etc. Mas é muito importante o seu significado original.
Segundo o historiador Alfredo Bosi, a palavra cultura vem do latim Colo, “eu moro, eu cultivo”. Articulando o lugar que se vive ao trabalho para viver, ambiente e ofício como cotidiano, hábitos e tradições do povo do lugar. O que, para Milton Santos, significa, não só as expressões da autenticidade, as artes, mas a integridade e a liberdade de um povo. “Manifestação coletiva das heranças do passado, modos de ser do presente e aspirações para o futuro desejado”.
Sintetizo dizendo que cultura é o que cultuamos e o que cultivamos. Cultuamos a partir dos nossos valores, crenças e conhecimentos. Cultivamos com nosso trabalho, reproduzindo na materialidade das coisas a abstração que cultuamos no cotidiano. Aquilo que no dia-a-dia se converteu em rotina, por hábito, tradição, e fazemos sem pensar, sem refletir. E assim, muitas vezes, não percebemos os hábitos, costumes, que repetimos e podem até nos fazer mal. Quem tenta emagrecer sem remédio, entende o que quero dizer…
O poder do hábito, que já virou livro de auto-ajuda, de fato é o que faz o mundo ser como é. Nada se constitui, estabelece ou se constrói, da noite para o dia. O hábito, que se estabelece como cultura, é o que constrói as instituições, rotinas e até “verdades”, que fazem o mundo funcionar desse jeito. Como é uma ação sem pensar, aos pouquinhos, todos os dias, não percebemos nossa própria participação e achamos que não temos parte naquilo que se formou como grande e importante na vida.
Assim, é muito importante percebermos que, por exemplo, o que determina a política, são os eleitores, e não os eleitos. Da mesma forma, a economia é feita pelos consumidores e não pelos produtores.
A própria palavra “mercado” se origina de mercari que em latim significa comprar. Portanto, já era reconhecido, desde a antiguidade que, em uma relação comercial, o único que pode fechar negócio é quem compra.
Este fato coloca a responsabilidade do que é forte economicamente, e daí também politicamente, sobre quem compra, o consumidor. Portanto, terá sucesso a economia que atender a percepção do consumidor. Se esta percepção for superficial, e o consumidor escolher apenas pela aparência do produto, um tipo de economia e política se estabelecerá como hegemônica, na Sociedade e seu ambiente. Caso a percepção seja construída para além da aparência, mas também do processo produtivo, considerando que impacto tem sobre o ambiente e sobre a Sociedade, aí teríamos outro tipo de Sociedade.
A consciência do consumidor sobre o que está financiando, quando compra com seu próprio trabalho transformado em dinheiro, pode ser o motor da transformação desta em uma Sociedade Sustentável.
Esta conclusão vem bem a calhar quando tomamos como referência os surpreendentes dados obtidos pelo cientista internacional, cuja obra está sendo publicada por Oxford somente em inglês, Francisco Costa, o Chiquito, aqui do NAEA(Núcleo de Altos Estudos da Amazônia/UFPA). De 30 produtos da biodiversidade do Pará, apenas 3% do valor vem do mercado externo. Aproximadamente 47% vem de outras regiões do Brasil e 50% vem da própria região amazônica, majoritariamente do Pará. O que significa que a sustentabilidade do desenvolvimento da Amazônia, depende sobretudo do consumo local, grande oportunidade.
Ora, se 80% dos amazônidas estão nas cidades, exatamente os maiores mercados consumidores da biodiversidade regional, uma das principais tarefas dos que defendem a floresta em pé e o fortalecimento econômico das comunidades tradicionais, é trabalhar para que o padrão de consumo nas cidades amazônicas seja o principal financiamento da nova economia amazônida.
Este trabalho, mais que necessário, incide na formação de uma nova cultura de consumo, a partir das cidades amazônidas para o mundo. É de dentro para fora que poderemos ter uma mudança econômica estrutural, sem permanecer na dependência que nos prende desde a colonização. Só mudando de dentro, seremos protagonistas de um novo modelo de desenvolvimento, o Desenvolvimento Amazônida.
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