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Posso dizer que conheço bem o Hospital Porto Dias. Durante aproximadamente dois anos, fiz-lhe inúmeras visitas, acompanhando meu irmão, que sofria com problemas diversos relacionados à obesidade. Em março de 2006, foi submetido, naquele estabelecimento, a uma cirurgia bariátrica e passou os cinco dias seguintes na UTI (deveria ser um só), um período bem difícil para nossa família. No mesmo ano, ele sofreu uma segunda cirurgia, motivada por pedras na vesícula. Depois disso, houve uma série de consultas e exames, até porque ele nunca ficou 100% bem após o delicado procedimento de redução do estômago.

Também estive naquele hospital para consultas na emergência e exames, sendo eu mesmo o paciente ou acompanhando minha mãe, minha esposa, uma tia e uma prima (esta também fez uma pequena cirurgia particular, pela qual me cobraram um dia e meio de internação, mas liberaram a paciente meia hora após o término do procedimento). De tanto passear pelas dependências do hospital, tornei-me íntimo dele e passei a chamá-lo de “SUS de granito no piso”, ou seja, apesar da aparência algo sofisticada, o atendimento decepcionava, sendo frequentemente sofrível – o que senti na pele, ou mais exatamente no estômago, durante uma crise de gastrite. Vá lá na recepção, entupida de gente, para começar a entender.

Ontem, tivemos mais uma demonstração da falta de compromisso do Porto Dias com o público.

Meu irmão, sempre ele, está fazendo uma nova bateria de exames. Para ontem estavam agendadas uma endoscopia e uma colonoscopia. Exames invasivos e desagradáveis, são também sacrificantes. Ele passou a véspera com recomendação de comer umas bolachinhas salgadas escrotas e tomar água. À noite, ingeriu um coquetel de medicamentos que provocou náuseas. Além disso, laxantes.

Deixei-o no hospital, junto com nossa mãe, antes das 8 da manhã, apesar de os exames estarem agendados para as 9h30. “Agendado”, para quem não sabe, é um termo técnico da Medicina, que significamarquei uma hora mas você será atendido por ordem de chegada, seu otário. Se quiser. Se não quiser, vá à merda que eu não tô nem aí.

Falei com meu irmão às 12h20 e adivinhe? Ele ainda não fora atendido! Àquela altura, já protestara com todas as pessoas possíveis. Inclusive já formalizara uma reclamação perante a ouvidoria do hospital que, claro, não dará em nada. Um outro senhor também estava indignado. Uma senhora, diabética, sem se alimentar há várias horas, sentia a fraqueza tomando conta.

O motivo da revolta foi que pessoas chegadas mais tarde entravam para fazer o exame antes. Segundo os funcionários do hospital, eram pacientes agendados que haviam chegado atrasados. O engraçado é que em todo canto quem perde a hora, perde a hora. Não no Porto Dias, pelo visto. Sinceramente, só encontro uma explicação para o fato: os supostos atrasados são amigos de alguém e foram instruídos a chegar quando lhes conviesse, que mesmo assim seriam atendidos prontamente. Quanto à fila de espera, dane-se.

Antes das 14 horas, minha mãe – cansada e faminta – telefonou dizendo que meu irmão fora liberado. Ou seja, os procedimentos em si não demoravam tanto. Era realmente preciso maltratar um ser humano por horas?

Como sempre digo, antigamente as pessoas precisavam contratar
planos de saúde, pois quem dependia do SUS estava lascado. Hoje, lascado está quem tem plano de saúde. Dignidade, só para pacientes particulares. E quem depende do SUS, morre.

Se quiser conferir, tente marcar uma consulta. Diga que seu plano é qualquer um desses famosos e supostamente excelentes. O tempo de espera pode surpreender. Desligue o telefone e faça imediatamente uma segunda chamada, pedindo uma consulta particular. Surpreenda-se de novo. Mas com a desfaçatez.

(Yúdice Andrade, em seu blog Arbítrio do Yúdice, denunciando, com justa indignação, o tratamento desumano imposto pelos planos de saúde).

Franssinete Florenzano
Jornalista e advogada, membro da Academia Paraense de Jornalismo, da Academia Paraense de Letras, do Instituto Histórico e Geográfico do Pará, da Associação Brasileira de Jornalistas de Turismo e do Instituto Histórico e Geográfico do Tapajós, editora geral do portal Uruá-Tapera e consultora da Alepa. Filiada ao Sinjor Pará, à Fenaj e à Fij.

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