Publicado em: 23 de setembro de 2025
A Universidade Federal do Oeste do Pará (Ufopa) levou ao Festival do Sairé, em Alter do Chão, em Santarém, experiências que uniram ciência, saberes tradicionais e inovação. Instalado na Casa Santarém, o estande da instituição se transformou em espaço de troca entre pesquisadores, estudantes, turistas e moradores, com atividades que iam da degustação de alimentos tradicionais à apresentação de soluções tecnológicas para a região.
No estande, estudantes de Biotecnologia mostraram como a pesquisa acadêmica pode se traduzir em benefícios práticos para a sociedade. Eloane Almeida, do 6º semestre, destacou o trabalho desenvolvido no Laboratório de Micologia e Bioensaios. “Queremos mostrar que os fungos não são apenas os bolores dos pães, só coisa ruim. O fungo pode ser um cogumelo comestível, tóxico, ou pode se tornar um biorremediador para matar pragas agrícolas e domésticas, entre outras coisas”, explicou. Para atrair o público mais jovem, a equipe utilizou jogos educativos como ferramenta de interação.
Um dos grandes destaques foi a apresentação da farofa de saúva, produzida com a formiga Atta laevigata. Pode parecer bem esquisito para pessoas de outras regiões do Pará e, com certeza, de outros estados brasileiros e outros países, mas quem vem de famílias indígenas e caboclas santarenas (como eu) sabe que esta iguaria é um clássico. A iniciativa integra o projeto “Formigas Amazônicas como Recurso Alimentar Sustentável”, coordenado pela professora Iracenir Santos. A estudante indígena Glena Batista, da etnia Tupinambá e do 8º semestre de Biotecnologia, compartilhou a importância cultural do prato. “Lá a gente come num momento de partilha, de união, de confraternização. E ela não é só um alimento. Segundo a minha avó, também serve para a circulação sanguínea, é depurativa do sangue. Então, se a avó falou, deve ser verdade”, afirmou.
Pesquisas mostram que o consumo da saúva combina alto valor nutricional, relevância cultural e sustentabilidade ambiental. A FAO estima que dois bilhões de pessoas no mundo incluem insetos na alimentação.
Já estudante Sâmia Lirne Carvalho, do 9º semestre, apresentou um projeto que desperta a curiosidade dos amantes de uma das bebidas mais universais: o vinho. No caso da pesquisa da Sâmia, o vinho é de açaí tinto seco. “É um vinho porque as características científicas dele se comparam muito ao vinho tinto de mesa, mas tem apenas 12% de teor alcoólico. Ele possui potenciais antioxidantes, vitaminas K e C, e minerais como cálcio e ferro”, disse. Ela acrescentou que a pesquisa busca aproveitar integralmente o fruto. “Utilizamos 100% da polpa e 20% do caroço na fermentação, para aproveitar o potencial total que o açaí tem”. O projeto é resultado de parceria com a In Tap e a Embrapii.
A extensão universitária também foi evidenciada por meio da parceria com a Associação dos Produtores de Óleo de Andiroba Quatro Irmãos (ASPRODAPI), da comunidade de São Domingos, na Floresta Nacional do Tapajós. A agricultora Marcilene da Silva Costa relatou como a cooperação com a Ufopa mudou a realidade local. Antes, o grupo apenas comercializava o óleo bruto; hoje, com apoio técnico, desenvolve sabonetes, incensos e aprimorou o processo de beneficiamento. “A universidade, com certeza, fez a diferença na minha vida. Estou muito feliz de estar aqui”, comemorou.

O ambiente do Sairé também abriu espaço para a startup Mahá, criada a partir de projetos acadêmicos da Ufopa. A empresa transforma óleos e manteigas nativos em biocosméticos capilares. Para Melissa Monteiro, uma das fundadoras, a experiência foi valiosa: “A participação foi uma oportunidade de fortalecer a ideia da Amazônia como território de conhecimento e inovação, mostrando o caminho desde a pesquisa universitária até produtos sustentáveis que carregam a identidade local”.
A receptividade do público foi elogiada por pesquisadores. A engenheira florestal Ana Paula da Silva, do Programa de Pesquisa Ecológica de Longa Duração do Oeste do Pará, destacou o interesse despertado pela herpetologia. “Foi muito boa, principalmente com a herpetologia – cobras, sapos etc. As pessoas têm curiosidade de tocar, saber os hábitos, tirar dúvidas se o animal é venenoso. Para mim, foi bem interessante”.
Visitantes também aprovaram a iniciativa. A turista Thais Helena Iva de Sousa, de Minas Gerais, elogiou: considerou “maravilhoso” o esforço da universidade em expor seus trabalhos no festival, ainda que tenha brincado sobre a falta de lembranças para levar para casa.
A pesquisa científica também esteve presente com o diagnóstico socioambiental do Lago Verde, conduzido pelo Grupo de Estudos Avançados em Gestão Ambiental na Amazônia (GEAGAA). A estudante Sâmela Nascimento, de Engenharia Sanitária e Ambiental, explicou: “Buscamos fazer uma avaliação do contexto ambiental, identificar as pressões humanas, a questão do uso e ocupação do solo e a qualidade da água. Essa análise integrada é crucial para identificarmos a origem dos impactos que já observamos”.
Jefferson Dantas, diretor de Cultura da Ufopa, ressaltou a relevância da presença institucional no Sairé. “Estar presente em um evento dessa magnitude demonstra como a universidade pode e deve se integrar aos festivais culturais da região. O estande, na Casa Santarém, em Alter do Chão foi mais do que um espaço de exposição: foi um espaço de diálogo, de troca e de encontro. Isso fortalece a relação entre a universidade e a comunidade, aproximando a produção acadêmica da vida cultural do território”, afirmou.

A participação da Ufopa ocorreu no âmbito do projeto “Ufopa, saberes que nascem com o povo: Cultura, Ciência e Comunidade em Festa”, coordenado pela Pró-Reitoria da Cultura, Comunidade e Extensão (Procce).
Com informações e fotos de Lenne Santos/Ascom Ufopa
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