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Nos trinta últimos anos do século passado, Belém ainda não era tão grande quanto hoje, invadindo municípios vizinhos sem pedir licença. Em termos de comunicações, há tínhamos televisão, rádio e jornal bem consumidos. Junto com Janjo Proença e Luiz Braga, após lançarmos um jornal tabloide independente, com tiragem de mil exemplares, em uma semana, ao passarmos a sair encartados em O Liberal, chegamos a oitenta mil e alguma coisa exemplares, para terem idéia. Adiante volto ao Zeppelin, mas por agora, quero lembrar dos Solteirões de Julho. A princípio, tudo a ver com o verão de julho em Mosqueiro, passando depois a Salinópolis. Final de junho e todos se preparavam para as praias. Donos de casas iam fazer faxina e deixar tudo pronto, prefeitura fazia remendos, adolescentes sonhavam e crianças viajavam com maletinhas contendo remédios para excesso de sol, enjôo e etc. Mas, e os Solteirões de Julho? Uma invenção dos colunistas sociais, na época muito lidos pela classe média, e os mais ricos. Nas férias de julho, todos no mesmo time. As famílias viajavam e os pais ficavam para trabalhar. Iam apenas aos finais de semana. E o que faziam, livres, leves e soltos na noite belemense dos dias de semana essas feras? Isaac Soares, Vera Castro, Edwaldo Martins e outros que agora não lembro, salpicavam em suas colunas pequenos gatilhos, frases, ironias, provocações a respeito daqueles respeitáveis pais de família, agora livres dos grilhões, ao menos até o final de semana. Comentavam que os convites para um tal “Baile da Cueca” estavam sendo disputados a tapa. Atrações femininas seriam trazidas do Rio de Janeiro para abrilhantar o acontecimento. Haveria escolha da Miss Verão e também do Casal mais fogoso, enfim. Havia quem pegava corda e havia quem também caía na esbornia, claro. Final dos anos 70 e tínhamos o Zeppelin, na época, com muita leitura e lá, uma pessoa muitíssimo bem informada, cabeleireiro famoso e internacional, daria uma entrevista contando tudo o que todas gostariam de saber, inclusive, umas das outras, ou pior, necessariamente umas das outras. Foi crescendo uma onda de tal envergadura que fomos chamados ao jornal, onde Seu Rômulo nos pediu para cortar a tal entrevista, pois estava sendo alvo de telefonemas até ameaçadores. Atendemos a reivindicação, até porque era mais fofoca que outra coisa. Se Romulo leu a entrevista? Isso somente com ele… Os Solteirões de Julho continuaram chegando de carro ou de navio de avião, enfim, nos finais das tardes de sexta feira, recebidos com uma certa desconfiança das madames. Em resposta, todos faziam “a egípcia”, deixando-as ainda mais loucas, a propósito da possibilidade. E também perguntavam umas às outras se algum tinha dito alguma coisa. Nada. Era um segredo essencial. Uma omertá. Enfim, os Solteirões de Julho foram se aposentando, a cidade cresceu e foi engolindo personagens e retratos de uma Belém menor, provinciana, que talvez fosse mais agradável de viver.

Edyr Augusto Proença
Paraense, escritor, começou a escrever aos 16 anos. Escreveu livros de poesia, teatro, crônicas, contos e romances, estes últimos, lançados nacionalmente pela Editora Boitempo e na França, pela Editions Asphalte. Foto: Ronaldo Rosa

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