Um artigo publicado nesta quarta-feira, 5 de março, na revista Nature, mostra que pesquisas recentes lançaram luz sobre um possível fator que contribui para a longevidade e resiliência cognitiva das mulheres em comparação aos homens: a atividade do segundo cromossomo X.
Um estudo publicado na revista Science Advances sugere que, com o envelhecimento, genes previamente considerados inativos neste cromossomo são ativados em regiões do cérebro cruciais para a memória e aprendizagem, podendo oferecer proteção contra o declínio cognitivo.
Vale lembrar que os termos “mulheres” e “feminino”, neste caso, são usados para se referir a pessoas com dois cromossomos X e sem o cromossomo Y, conforme a terminologia empregada no estudo. Assim como a Nature, o Uruá-Tapera também reconhece que nem todas as pessoas que se identificam como mulheres possuem essa composição cromossômica.
Voltando ao estudo: desde a formação embrionária, as células femininas inativam um dos dois cromossomos X para manter um equilíbrio gênico com os homens, que possuem apenas um X. No entanto, pesquisadores liderados pela neurologista Dena Dubal, da Universidade da Califórnia em San Francisco, descobriram que este cromossomo inativo se torna parcialmente ativo no hipocampo de camundongos fêmeas idosos.
A equipe rastreou a atividade de genes em nove tipos de células cerebrais de camundongos jovens e velhos e constatou que aproximadamente 100 genes do cromossomo X inativo apresentavam maior atividade em células de camundongos mais velhos. Um gene em particular, o Plp1, mostrou uma expressão mais elevada em diversos tipos celulares. Este gene é responsável pela produção de um componente essencial da mielina, a bainha protetora dos neurônios, e seu papel pode ser fundamental na diferença de resiliência cognitiva entre os sexos.
Para confirmar a relevância desta descoberta para os seres humanos, os cientistas analisaram cérebros de cadáveres femininos e masculinos. Eles encontraram que o equivalente humano do gene Plp1 apresentava uma expressão significativamente mais alta no parahipocampo de mulheres, sugerindo um mecanismo semelhante ao observado nos camundongos.
Ao testar a influência deste gene na cognição, os pesquisadores aplicaram terapia gênica para aumentar a expressão de Plp1 no hipocampo de camundongos de ambos os sexos. Como resultado, os animais idosos apresentaram um melhor desempenho em testes de navegação em labirintos, indicando que essa abordagem pode ter potencial para tratamentos futuros visando a prevenção do declínio cognitivo em humanos.
As implicações da descoberta vão além do envelhecimento cognitivo normal. Como aponta a neurocientista Lisa Mosconi, da Weill Cornell Medicine, as mulheres tendem a apresentar um envelhecimento cerebral mais lento e superam os homens em testes cognitivos mesmo após o diagnóstico de Alzheimer. No entanto, paradoxalmente, duas em cada três pessoas com Alzheimer são mulheres, e elas passam mais anos de suas vidas em condições de saúde precária.
Rachel Buckley, neurologista do Massachusetts General Hospital, ressalta que a compreensão deste mecanismo genético pode ajudar a desvendar a relação entre a resiliência cognitiva e a vulnerabilidade à demência em mulheres. “Estamos apenas no começo desta jornada. O cromossomo X é uma fronteira incrível para a pesquisa da neurociência”, afirma.
Os achados do estudo abrem caminho para novas abordagens terapêuticas. Se a expressão de genes como o Plp1 puder ser manipulada com segurança, futuras terapias gênicas poderiam ajudar a proteger tanto mulheres quanto homens do declínio cognitivo associado ao envelhecimento. A equipe de Dubal agora investiga como esse mecanismo pode ser ativado artificialmente e se outras regiões cerebrais também apresentam esse fenômeno.
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