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A Petrobras obteve do Ibama Licença de Operação para perfurar o poço Morpho, no bloco FZA-M-59, em águas profundas do Amapá, a 500 Km da foz do rio Amazonas e a 175 Km da costa, na margem equatorial brasileira. Acontece que parecer da equipe técnica do próprio Ibama, emitido no final de agosto deste ano, apontou que a estatal descumpriu diversos itens do Plano de Proteção e Atendimento à Fauna Oleada durante a simulação, como a realização de operações noturnas e o uso de embarcações não previstas no PPAF.

Porém, mesmo com os pontos levantados no parecer técnico, foi concedida a LO e a condicionante de uma nova simulação, já durante a fase de perfuração de poços exploratórios, trará imensos riscos socioambientais.  

Há poucos dias, em novo parecer, que analisou a última documentação apresentada pela empresa, os técnicos do Ibama declararam que os planos permanecem ineficazes e com a logística insuficiente. Na avaliação técnica feita em outubro, o corpo técnico da autarquia concluiu que “ainda há pendências relativas ao Plano de Emergência Individual  e ao PPAF para a atividade de perfuração marítima no Bloco M-FZA-59, Bacia da Foz do Amazonas. E para a continuidade do processo de licenciamento, são necessários esclarecimentos”.

Com óbvia razão, o Ministério Público Federal questiona perante a Justiça Federal que, se o teste de efetividade falhou, o plano de emergência não pode ser considerado apto. E realizar a simulação após a licença ou aceitar meros esclarecimentos documentais viola as normas de licenciamento.

O MPF sustenta que, para evitar vazamento de óleo e garantir a preservação ambiental e da biodiversidade, ainda é preciso corrigir falhas no chamado PEI – o que só seria possível com um novo exercício simulado na região. Antes, é claro, de perfurar.

A recomendação chegou a ser feita ao Ibama, que não acatou as orientações. A Procuradoria da República, então, protocolou uma ação civil pública, mas o Judiciário ainda não decidiu.

A área de exploração abrange a região de transição entre o norte e nordeste do país, passando pelos estados do Pará, Maranhão, Piauí e Ceará, além do Amapá. A denominação “margem equatorial” diz respeito à proximidade com a linha do Equador.

O Brasil está apostando em combustíveis fósseis na iminência de receber representantes do mundo todo para a COP30 em Belém. Trata-se do famoso descompasso entre intenção e gesto, entre discurso e ato.

A sonda já se encontra na locação do poço e a perfuração está prevista para iniciar imediatamente, com a duração estimada de cinco meses. A pressa, ninguém ignora, é inimiga da perfeição. É evidente o perigo a que toda a população será submetida, vez que ainda falta a construção e operacionalização de mais um Centro de Reabilitação e Despetrolização de grande porte no município de Oiapoque (AP), que se somaria ao já existente em Belém (PA); inclusão de três embarcações offshore (para alto mar) dedicadas ao atendimento de fauna oleada, quatro embarcações de atendimento nearshore (que operam em águas relativamente próximas à costa), entre outros recursos.

Ademais, a maior faixa contínua de manguezal do planeta está justamente nessa região costeira que se estende do Amapá até o Rio Grande do Norte. Este ecossistema é vital por ser um berçário para a vida marinha, armazenar grandes quantidades de carbono, estimadas em 1,5 bilhão de toneladas, ajudando a regular o clima global e atuando como escudo natural contra erosão, tempestades e o aumento do nível do mar. Se houver derramamento de petróleo será uma tragédia de proporções gigantescas.

Não custa lembrar que há dez anos o navio Haidar naufragou no porto de Vila do Conde, em Barcarena, matando cinco mil bois e derramando setecentas toneladas de óleo, num dos piores desastres ambientais da história do Pará. Até hoje a população sofre as consequências e o navio continua lá, apesar dos bilhões gastos, com prejuízos enormes ao setor produtivo.

Os defensores da exploração de petróleo na foz do rio Amazonas argumentam ser uma oportunidade única de melhorar a qualidade de vida da população dos estados envolvidos. Os mais afoitos chegam a comparar com Dubai. Mas a história ensina que os mesmos argumentos foram e são usados quanto aos royalties da mineração. E o que aconteceu com os municípios mineradores do Pará, por exemplo? Em Parauapebas, que durante muitos anos foi a capital do minério e a cidade mais rica do país, a população até hoje sofre a poluição do ar e da água, assoreamento de rios e remoção da vegetação. Nem de longe oferece o que deveria em termos de qualidade de serviços públicos, apesar dos bilhões anuais que ninguém sabe, ninguém viu para onde foram. E assim la nave va…

A cantilena é velha conhecida. Durante a instalação de grandes projetos, as promessas são muitas e as projeções enchem os olhos. Mas nunca sobra para o bem-estar daqueles que vivem no lugar.

Franssinete Florenzano
Jornalista e advogada, membro da Academia Paraense de Jornalismo, da Academia Paraense de Letras, do Instituto Histórico e Geográfico do Pará, da Associação Brasileira de Jornalistas de Turismo e do Instituto Histórico e Geográfico do Tapajós, editora geral do portal Uruá-Tapera e consultora da Alepa. Filiada ao Sinjor Pará, à Fenaj e à Fij.

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