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“O
Ministério Público no Marajó
É
com grande tristeza e pesar que a Prelazia do Marajó, através de seu Bispo, D.
José Luiz Azcona, vem denunciar a grave e precária situação desta
importantíssima instituição, no que diz respeito à sua presença física no arquipélago
do Marajó, no Pará, e clamar por mudanças efetivas e práticas, que possam
operacionalizar sua função constitucional de fiscalizador da Lei.
Durante
as viagens que fazemos em todo o arquipélago, foi constatado in loco que quase a totalidade dos Municípios
daquele arquipélago padece quanto à falta de Promotores de Justiça nas Comarcas
e/ou Termos Judiciários onde estes deveriam se fazer presentes. A situação é de
uma nefasta realidade, posto que a população pobre e desassistida se vê
renegada ao abandono, o que só prejudica esta grande instituição, posto ser ainda
possuidora de crédito em relação aos jurisdicionados.
Os
prejuízos materiais e, sobremaneira, os traumas pessoais aos quais é submetida
a população, em decorrência da ausência do Órgão Ministerial, são de um alcance
quase que inatingível. Nossas crianças continuam a ser estupradas,
prostituídas, traficadas, recrutadas ao mundo do crime e das drogas. Mulheres
continuam a ser agredidas. Gestores municipais continuam a cometer atos de improbidade
administrativa. Enfim, toda sorte de mazela social se alastra em decorrência da
ausência de Promotores de Justiça no arquipélago do Marajó, o que faz com que
seu papel constitucional de fiscal da Lei seja vilipendiado, por ele próprio.
Dificilmente
uma Comarca e/ou Termo Judiciário conta com um Promotor titular que resida naquela.
Os Promotores substitutos que apenas respondem pelas Comarcas designadas também
raramente dão assistência institucional àqueles que precisam. Portanto,
simplesmente, e por este fato gravíssimo, a Lei é quase sempre desrespeitada,
em escalas inaceitáveis.
Em
recente conversa com o Procurador Geral de Justiça do Estado do Pará, Marcos
Antônio Ferreira das Neves, juntamente com a Comissão Justiça e Paz da CNBB Norte
2-Pará e Amapá, foi-lhe relatado, pessoalmente, o caos que a ausência desta instituição
instala junto à população. Este, compadecendo-se da situação, nos deu como
única e acalentadora notícia a sua proposição de que em breve o Ministério
Público do Pará iria promover concurso público para o ingresso de novos
Promotores de Justiça para preenchimento do quadro deficitário.
Infelizmente
esta esperança não se concretizou. Conforme amplamente divulgado pela mídia,
simplesmente o Conselho Nacional do Ministério Público resolveu suspender o
certame público por supostas irregularidades quanto à contratação da empresa
que iria realizá-lo. Com isso, vimos mais uma vez nossa esperança ser
diminuída.
Segundo
o próprio Procurador Geral de Justiça, este encontrava problemas também no que
diz respeito à disponibilidade orçamentária, que lhe oportunizasse investir
ainda mais no quadro de pessoal do Órgão. Sabemos que o orçamento destinado ao
Ministério Público segue preceito legal e tem percentual fixo, determinados
pela Constituição, mas isso em nada impede que, com esforço, possa-se conseguir
uma melhor eficiência em sua atuação, seja diminuindo o número de servidores
contratados, se houver, seja extinguindo-se cargos de provimento em comissão,
que são de livre nomeação e exoneração, que não sejam de utilidade fim para o
órgão, seja enviando projeto de Lei à Assembleia Legislativa para que ocorra
uma verdadeira reforma no organograma do Órgão, a fim de que este possa
investir ainda mais no aumento e ingresso de Promotores de Justiça .
Portanto,
alternativas existem para que este Órgão Ministerial venha a tornar sua atuação
mas efetiva junto aos tutelados.
O
Procurador Geral de Justiça também tentou, sem muito sucesso, tranquilizar esta
Prelazia ao afirmar que todas as Comarcas do interior dispõem de Promotores que
estão designados para responder por elas. Estar designado para responder por
uma Comarca é uma situação. Efetivamente responder, trabalhar e defender a
dignidade das pessoas é algo totalmente diferente. E infelizmente é apenas esta
segunda situação que é percebida naquele arquipélago. Há Comarcas em que
Promotores designados para responder simplesmente nunca se fizeram presente
para efetivamente oferecer a prestação Ministerial.
Lembramos,
ainda, que os problemas estendem-se às mais diversas vertentes, posto que a
falta de Promotores de Justiça acarreta também ilegalidades quanto à aplicação
correta dos recursos públicos, inadequação de vias eleitas para compra e
distribuição da merenda escolar, além de não podermos esquecer também que
existem litígios eleitorais ainda pendentes de julgamento devido à inércia do
Ministério Público, fazendo com que caia em descrédito a efetiva prestação
jurisdicional de distribuição da justiça.
Enfim,
toda sorte de crimes, desvios, improbidades, contravenções penais e ilícitos
eleitorais alastram-se naquele pobre, indefeso e sofredor arquipélago. É uma
situação insustentável, inaceitável, que joga o conceito de ser humano a um
patamar tão baixo que beira o inominável.
É
bem verdade sim que as mazelas não se alastram pela única e exclusiva ausência
do Ministério Público naquela região. Há também ausência de juízes, posto que Comarcas
não têm juízes titulares e os que por lá respondem também não são vistos jamais
na cidade. Há também ausência da Defensoria Pública do Estado, que possui um
quadro reduzidíssimo, fazendo-se com que a própria Justiça não ocorra, posto
que, segundo nossa Constituição Federal, esta só existe com a presença
inarredável daquele operador do Direito. Existe também a falta de Delegados nas
comarcas do interior, fazendo-se assim com que o crime se multiplique entre os
mais pobres, notadamente crianças e mulheres.
Mas
se existem todas essas falhas apontadas pelo próprio Procurador Geral de
Justiça, que este conclame todos os responsáveis, e que cobre, exija, suplique,
seja ao Governador do Estado, seja à Presidência do Tribunal de Justiça do
Estado do Pará, seja a quem de direito, que todos assumam suas
responsabilidades, sob pena de serem coautores das ilegalidades.
O
tempo não urge, ele já urgiu. Há salas do Ministério Público do Pará, no
Marajó, fechadas. Há Comarcas sem Promotores titulares presentes. Há Comarcas
sem promotores substitutos presentes fisicamente. Há com isso a não aplicação
da Lei, atividade mister deste Órgão. Almas ainda são destruídas, roubadas,
estupradas, obrigadas a se prostituir, traficadas, e até mortas, pela completa
ausência dos poderes constituídos.

Portanto,
vem esta Prelazia, como último recurso que pode utilizar, antes de valer-se de
outros que tenham maior repercussão nacional e internacional,  clamar ao Procurador Geral de Justiça, Sr.
Procurador Marcos Antônio Ferreira das Neves, que possa disponibilizar medidas
práticas e efetivas no intuito de 
sanarem-se as graves violações que o povo marajoara vêm sofrendo , posto
que o que se verifica é a verdadeira violação da
DECLARAÇÃO UNIVERSAL DOS DIREITOS HUMANOS, adotada e proclamada pela Resolução 217 A (III) da Assembleia
Geral das Nações Unidas em 10 de dezembro de 1948
, questão que foge à seara administrativa
desta Unidade da Federação, forçando-se a reconhecer que o Brasil, como Estado
signatário daquela, viola seus preceitos e está sujeito às suas sanções.”
Franssinete Florenzano
Jornalista e advogada, membro da Academia Paraense de Jornalismo, da Academia Paraense de Letras, do Instituto Histórico e Geográfico do Pará, da Associação Brasileira de Jornalistas de Turismo e do Instituto Histórico e Geográfico do Tapajós, editora geral do portal Uruá-Tapera e consultora da Alepa. Filiada ao Sinjor Pará, à Fenaj e à Fij.

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