Foto: AAPBel
A presidente da Associação dos Amigos do Patrimônio de Belém, Nádia Cortez Brasil, assistiu, embasbacada, em plena manhã do domingo, dia 19 de abril, na travessa 9 de Janeiro, em um dos quadriláteros do Museu Paraense Emílio Goeldi, à derrubada de uma mangueira centenária, arrancada da calçada provavelmente para não atrapalhar a visualização e a garagem do prédio que está para ser inaugurado no local. A AAPBEL protocolará amanhã mesmo denúncia junto à Secretaria Municipal de Meio Ambiente e à Delegacia de Meio Ambiente, para saber se foi autorizada a retirada do vegetal, o que a motivou, se existe laudo técnico que recomende sua supressão e, em caso positivo, se será feito o plantio de outra árvore no mesmo local. E exigirá dos órgãos responsáveis todas as medidas cabíveis no sentido de punir, em caso de crime ambiental, bem como de reparo ao dano coletivo.
Manaus e Belém, apesar de encravadas no coração da Amazônia, são as cidades com o menor percentual de arborização urbana entre 15 cidades brasileiras com mais de um milhão de habitantes, segundo dados do Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE). Belém registrou o menor percentual entre esses 15 municípios, com 22,4% do entorno dos domicílios com alguma árvore ao redor, em área pública.
Prestes a comemorar(?) seus 400 anos, Belém tem seu patrimônio cultural desrespeitado sistematicamente, com ação ou omissão da Prefeitura, que permite a destruição do legado dos antepassados, do qual deveria ser guardiã para as futuras gerações. Além de não ampliar a arborização da cidade, não cuida do que recebeu e os munícipes assistem, perplexos, às históricas mangueiras, além de mal cuidadas, serem cimentadas criminosamente, envenenadas pouco a pouco ou mesmo serem arrancadas à luz do dia. Quando realizam serviços de manutenção da rede elétrica, telefônica e de água e esgoto, a medida invariável é cortar árvores. A culpa, naturalmente, é de quem escolheu as mangueiras para arborizar a cidade, visto que não são adequadas para isso, atrapalham o emaranhado de fios da Celpa, os bueiros da Cosanpa e do Saaeb, os dutos da telefonia. Um estupor!
A necessidade de arborizar cidades é notória, principalmente em cidades da zona equatorial, onde a incidência de radiação solar é elevada. Mas os bairros do Jurunas, Condor, Cremação, Comércio, Reduto, Val-de-Cans e Canudos, em Belém, são devastados, áridos, neles a cobertura vegetal não ultrapassa 5%. E são justamente os que concentram a maior população, cerca de 34,5% dos habitantes da capital. Marco e Souza seguem no mesmo ritmo. Nazaré e São Braz são os mais verdes da cidade, ainda assim as árvores cobrem menos da metade do bairro. Aberrações típicas de uma economia que privilegia a especulação imobiliária e onde o poder público permanece mudo e quedo.
Foi em meados do século XIX que iniciou o plantio de mangueiras em Belém, introduzido em 1780 pelo arquiteto e naturalista Antônio Landi, que primeiro cultivou a nova planta em casa, segundo informa Meira Filho no livro “Evolução Histórica de Belém do Grão Pará” ( 1976). As mangueiras aqui chegaram, por volta de 1700, via Nordeste, trazidas pelos portugueses, depois de descobertas as rotas marítimas entre a Europa e a Ásia. Fotos de postais da fase áurea da borracha mostram como eram os principais corredores da cidade, com os seus “túneis de mangueiras”. O costume dos moradores de Belém, que se tornou traço cultural, de correr ao vê-las cair e juntar as mangas na rua, depois da chuva ou de uma ventania qualquer, hoje quase não existe mais. Assim como não mais se justifica a alcunha “Cidade das Mangueiras”. E ninguém vai fazer algo?!
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