Dizem que os apelidos, sobretudo os caseiros, são os que melhor definem as pessoas. Meus amigos mais antigos me chamam, naturalmente, de “Kuí”, apelido de casa. Minha mãe dizia que era uma mistura que meu irmão mais velho tentava dizer, “Don Kuby”, com o nosso “cuí de farinha”, porque eu era muito magrinho e pequeno. Para ficar mais interessante, escreveu “Kuí”. João Augusto é o Janjo, um apelido que ganhou mundo. João é nosso avô materno, a quem não conhecemos. Tem o presidente Lula que, como político, colocou no nome verdadeiro. Lembro agora de Bituca, pelo qual atende o gênio Milton Nascimento, ou “Jiló”, como chamam, penso, os mais chegados, Gilberto Gil. “Lua” é Luiz Gonzaga. E Gal Costa, que na verdade é Maria da Graça? Tenho muitos amigos feitos no tempo de colégio. Hoje são profissionais consagrados, respeitados pela comunidade. Mas quando nos reunimos para, por exemplo, jogar futebol, viramos novamente meninos e nos tratamos como tal, parece que voltamos no tempo. Há alguns apelidos que foram colocados e não expressam o que as pessoas são. Houve o desejo de diminuí-las, por quaisquer motivos. As crianças são cruéis, todos sabemos. Homem feito, optei por não os chamar pelos apelidos, digamos, infames, por ética e respeito. Mas às vezes, no futebol, naquele turbilhão de emoções, saem esses apelidos. Antigamente, no futebol profissional, as escalações eram até engraçadas com tantos jogadores atendendo por apelidos curiosos como Fio, que jogou no Flamengo, Pelé, Zico, que é Arthur, Garrincha, que era Manoel. Um dos primeiros a ser chamado por nome composto foi Nilton Santos. Impunha respeito. Hoje quase todos os atletas usam nomes compostos na escalação. Acho que é melhor. Um dos meus grandes amigos, ser humano do maior quilate, profissional aclamado, um irmão que a vida me deu, tem um apelido caseiro até hoje usado de maneira inocente, dado ao respeito que ele merece. Ele me chama de Kuí, mas eu o trato pelo nome. O apelido, doce, infantil, hoje, me parece insuficiente para seu tamanho como ser humano. Escrevo e penso que não vou dizê-lo, mesmo que às vezes, nas mídias sociais ou em encontros comuns, os outros amigos o chamem desse jeito. Eu não consigo. Adotei isso para muitos outros, quando percebo que o apelido não faz jus e de alguma maneira, o diminuiria. Alberto Silva, grande ator, meu amigo, em seu mais recente espetáculo conta que seu apelido, não importam seus mais de cinquenta anos, é “Albertinho”. E seus parentes mais antigos assim o chamam. E o que traduzem esses apelidos caseiros? Imagino que, colocados em crianças, que são as mais puras, com personalidades ainda não expostas ao mundo dos adultos, definam muito sua essência. Sei que há muitos Gibas, Zés, Rais, Tatás, Tucas, mas os apelidos mais interessantes são aqueles dados na intimidade dos lares, às vezes a partir dos irmãos, bem novinhos, que inventam palavras que nem existem, mas, no entanto, definem. Imagino que os que precisam de um reconhecimento pessoal, pelos motivos que tiverem, gostem de ter o nome completo escrito em cartões de apresentação em letras folheadas a ouro, além dos cargos e títulos que têm. São as pessoas, deixemo-las viver como queiram. Vocês têm apelidos? Gostam de ser chamados assim ou preferem seus nomes completos, em tom respeitoso? Assistindo uma peça sobre Antonin Artaud, o grande Rubens Correa disse que o dramaturgo declarou: não importa a fama, os títulos, comendas, vitórias e triunfos que eu tenha. Eu nunca vou passar de ser o Nanaqui, apelido que minha mãe me deu. Pois eu afirmo o mesmo. Nunca deixarei de ser o Kuí, de minha mãe Celeste. Ela sabia das coisas.
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