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Um dos fatos mais tristes e revoltantes na história do Pará aconteceu no dia 6 de dezembro de 1988. Naquela
tarde, o deputado estadual constituinte João Carlos Batista foi à tribuna da Alepa
e, num aparte, pela enésima vez
denunciou que sua vida estava em perigo e que precisava de proteção.
Sua morte era anunciada. Advogado de
posseiros e defensor da luta pela reforma agrária, ele já tinha escapado de
três tentativas de homicídio e era constantemente ameaçado. Três horas depois
de deixar o prédio do Palácio Cabanagem, às sete da noite, ao entrar na garagem
de seu prédio na Av. Gentil Bittencourt, em Belém, João Batista, 36 anos, foi assassinado
por um pistoleiro com um tiro à queima roupa na cabeça, na frente da esposa e
de três dos seus cinco filhos.
Para Sandra Batista, viúva de João
Batista aos 28 anos e com três filhos pequenos para criar, hoje ex-deputada e
vereadora eleita de Belém, as feridas daquela noite continuam expostas em sua
memória.
O processo se arrastou durante anos e
foi arquivado sem que os verdadeiros responsáveis fossem presos ou oficialmente
identificados.
Um dos pistoleiros
acusados de matar Batista, Roberto Cirino, o “Robertinho”, foi degolado no
presídio de Americano antes de ir a julgamento em 89. Péricles Moreira, que
seria um segundo pistoleiro, chegou a cumprir pena, mas foi solto em liberdade
condicional, mesmo respondendo a várias acusações por homicídio. No final de 2010,
“Pelha”, como era conhecido, também foi executado. Péricles relatou o nome dos
acusados à Polícia, à Justiça e à CPI da Violência do Campo, realizada pela
Alepa. Os mandantes seriam fazendeiros, cujos nomes teriam sido confirmados por
Robertinho, que nunca foram julgados sob alegação de falta de provas. 
Conheci João Batista de perto, como
parlamentar e como pessoa. Tão ativo, era capaz de obstruir sozinho as sessões da
Assembleia Legislativa durante dias. Inscrevia-se para apresentar requerimento,
projeto de lei, usar o horário de liderança, discutir todas as matérias em
pauta, arguir questão de ordem, encaminhar votação, justificar voto, e até dar
explicações pessoais, o que naquela época existia no Regimento Interno. Pedia
apartes a todos os oradores e acabava falando mais do que eles. E, quando não
havia mais qualquer expediente regimental a lançar mão, tumultuava a sessão, que
era o jeito ser encerrada.
Desajeitado, largava uma gravata, um
blazer, sapatos e meias no seu gabinete, porque chegava invariavelmente em
mangas de camisa, calças jeans e sandálias e aí sua assessoria fazia o possível
para que ficasse apresentável e mais ou
menos
de acordo com as normas regimentais para as sessões. Era doce, embora
polêmico, um ser profundamente solidário, e seu projeto coletivo era de fato
maior do que o pessoal, tanto que nunca hesitou em persistir no que acreditava,
mesmo sabendo que as suas chances de sobreviver ao crime organizado que
manejava a pistolagem de aluguel eram praticamente nulas, diante da inércia de
ações preventivas e da impunidade reinante.
A trágica história do deputado João Batista,
cuja brutal execução manchou de sangue a Constituinte estadual e a própria
história do Pará, é emblemática. Jamais pode ser esquecida e muito menos
repetida.
Leiam o seu último discurso
naquela tarde, em que faz referências aos deputados Edmilson Rodrigues,
Raimundo Santos e Wandenkolk Gonçalves.
Franssinete Florenzano
Jornalista e advogada, membro da Academia Paraense de Jornalismo, da Academia Paraense de Letras, do Instituto Histórico e Geográfico do Pará, da Associação Brasileira de Jornalistas de Turismo e do Instituto Histórico e Geográfico do Tapajós, editora geral do portal Uruá-Tapera e consultora da Alepa. Filiada ao Sinjor Pará, à Fenaj e à Fij.

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