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Hoje, dia do Círio de Nossa Senhora do Ó, em Mosqueiro, nada mais oportuno do que lembrar a necessidade de revitalizar a ilha, que poderia ser um dos maiores atrativos turísticos de Belém do Pará, com suas praias de rio e chalés do tempo áureo do ciclo da borracha, e que na alta temporada chega a ser visitada por 400 mil pessoas

Inconformados com o declínio e cansados de esperar, empresários, trabalhadores, moradores e visitantes criaram a Associação Pró-Turismo de Mosqueiro e formularam várias propostas de desenvolvimento sustentável, uma delas a criação do Centro Cultural – Casa da Memória, que vem ao encontro da política de proteção do patrimônio arquitetônico da orla de Mosqueiro. Trata-se da transformação de um dos casarões existentes na orla em espaço de divulgação cultural, pesquisa e visitação turística. Nele seriam instalados a Casa de Época, onde os visitantes teriam oportunidade de ver reconstituídos os elementos existentes nas casas de veraneio do início do século XX; Sala com Exposição Permanente, onde estaria descrita a história de Mosqueiro através de elementos verticais, horizontais e cenográficos; Sala para Exposições Temporárias, disponível para que artistas da região possam divulgar e comercializar seus trabalhos segundo agendamento prévio; Salas para Oficinas de artes plásticas, teatro, dança, música e artesanato; Biblioteca, reunindo acervo especializado na Amazônia, Pará, Belém e Mosqueiro, disponível para estudantes, professores e pesquisadores; e Feira de Artesanato e Comidas Típicas, onde os visitantes poderiam apreciar a culinária da região e os artesãos locais poderiam expor e vender seus produtos. 

O Centro Cultural – Casa da Memória resgataria as relações sociais que decorreram no passado e construíram o presente; difundiria a história do Mosqueiro, elucidando situações vividas atualmente; divulgaria a produção artística e reuniria em um único local acervo bibliográfico da região, facilitando trabalhos de pesquisa. Contribuiria, assim, com a qualidade da informação turística, oferecendo condições para a melhoria da produção cultural e geraria, de quebra, emprego e renda. 

Reconhecendo a importância simbólica dos casarões de Mosqueiro, a Prefeitura Municipal de Belém construiu, na estrada de acesso à ilha, um pórtico que reproduz vários elementos tradicionais destas construções. Malgrado todo o fascínio que provoca nas pessoas, esse patrimônio vem sofrendo diversas perdas, por múltiplas razões. Por isso, a transformação de um deles em centro de visitação, além de agregar grande valor aos roteiros turísticos de Mosqueiro, ao mesmo tempo irá valorizar os demais exemplares, contribuindo de forma indireta com a preservação das edificações históricas, que representam 10% dos imóveis localizados na orla praiana. 

É imperiosa a preservação e recuperação dos chalés de Mosqueiro, considerando o estado precário de muitos e a demolição sistemática de vários ao longo das últimas décadas, perda inestimável. Também é preciso uma campanha educativa apontando o valor desse conjunto de imóveis, estudo e orientação para novos usos, incentivo fiscal para os proprietários comprometidos com a preservação e o tombamento pelo Patrimônio Histórico, Artístico e Cultural dos exemplares mais representativos ou do conjunto existente na orla.  

Os construtores dos famosos chalés do Mosqueiro, ícones da ilha, associaram estilos arquitetônicos de influência europeia às condições climáticas da região, por isso são considerados únicos. Há porões, protegendo da umidade; e varandas, evitando a insolação direta em seus cômodos. Os quintais e jardins eram sempre ricos em espécies frutíferas e ornamentais. Na Era da Borracha amazônica, a elite local tinha uma segunda residência destinada a momentos de lazer e contato maior com a natureza para as suas famílias. 

No século XVIII e início do século XIX havia rocinhas, sítios, chácaras, dentre outros, que ofereciam aos seus ocupantes conforto e adequação ao clima. Na cidade, só permaneciam os negociantes, funcionários públicos e o clero, além dos boticários, artífices e os menos favorecidos, claro. Com a Cabanagem, muitas dessas famílias foram atacadas e obrigadas a mudar para o centro urbano em busca de maior segurança.

A partir daí, o fluxo se inverteu e essas famílias passaram a frequentar as propriedades rurais em momentos de descanso e lazer, daí que o turismo de segunda residência inicia, no Pará, na primeira metade do século XIX.
No Mosqueiro, conforme registrou o marechal Manuel Jorge Rodrigues ao se refugiar na ilha de Tatuoca após a tomada do poder pelo líder cabano Eduardo Angelim: “… meia légua apenas decorre desta ilha a do Mosqueiro, onde se distingue a povoação deste mesmo nome com seus sítios e casas de campo, à beira-mar ou nas ribanceiras da costa, por entre palmares e arvoredos…”. O professor La Rocque Soares, ao tratar das propriedades rurais do Pará, no século XIX, faz referência a dois sítios que foram construídos, em Mosqueiro, na região da baía do Sol, por herdeiros do Padre Antônio Nunes da Silva que havia recebido vasta área de terra através de uma Carta de Data e Sesmarias. 

Todas estas questões foram originalmente tratadas no blog Mosqueiro Sustentável, espaço criado por Eduardo Brandão, professor da UFPA e morador da ilha de Mosqueiro, e também no blog Casarão de Memórias da Amazônia, da Associação dos Agentes de Patrimônio da Amazônia – ASAPAM.
Franssinete Florenzano
Jornalista e advogada, presidente da Academia Paraense de Jornalismo, membro da Academia Paraense de Letras, do Instituto Histórico e Geográfico do Pará, da Associação Brasileira de Jornalistas de Turismo e do Instituto Histórico e Geográfico do Tapajós, editora geral do portal Uruá-Tapera e consultora da Alepa. Filiada ao Sinjor Pará, à Fenaj e à Fij.

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