0

Destinatários,   

 Eu, humano do século XXI, quero deixar algumas linhas para o futuro. Uma espécie de mensagem em uma garrafa. Se alguém encontrar, saberá quem somos aqui na terra, neste século.

Eu tenho na bagagem a experiência acumulada de meus semelhantes, nesta Odisseia intensa e feliz pelo planeta terra.

Sou um indivíduo deste século. Tenho aprendido algumas coisas, desde que surgimos nas savanas da África e nos tornamos a espécie que mudou o mundo. Aprendi três lições importantes, capazes de manter a salvo a vida por aqui.

Três lições do século XXI

I- Cuidar do meio ambiente

Um indivíduo do século XXI é ambientalmente consciente. Já aprendi que meu pequeno planeta, o pálido ponto azul, de Carl Sagan, não é uma fonte inesgotável de vida e de recursos.

Meu pequeno e belo planeta é um dos corpos celestes que giram em torno do sol, uma das estrelas da minha galáxia: a Via-Láctea. Minha galáxia é apenas uma, entre mais de um trilhão de galáxias do universo.  Tenho consciência de que meu pequeno planeta vivo é finito, pequeno e frágil, diante da imensidão do cosmos.

Em 1972, ainda no século XX, após uma reunião ocorrida na Suécia, nós, os habitantes do planeta terra, redigimos a Declaração sobre o ambiente humano de Estocolmo. Ela é toda muito importante, mas devemos atenção especial ao Tópico 6 da Declaração.

Os estudiosos do mundo inteiro anunciaram algo muito triste nessa reunião: a Terra, após sofrer brutais ataques da humanidade, tremeu, moveu correntes de ar em redemoinhos gigantes, chorou rios de chuva, levantou trombas e paredes de água, sentiu febre… A terra está doente! Desde então, temos nos esforçado como civilização para salvar a nossa casa.

Somos uma jovem civilização em processo de evolução. No esforço para sobreviver e para progredir, exploramos demais a terra. Nós ignoramos por muito tempo o dever de cuidado para com a nossa casa. Ateamos fogo em suas matas, depositamos lixo em seus oceanos, destruímos os rios e as árvores, dispersamos gases malignos em sua atmosfera,  perfuramos sua superfície com furadeiras gigantes, esgorjamos e drenamos o sangue negro da terra, que é o nosso combustível para gerar energia.

Exatamente isso.  Nossa civilização ainda extrai petróleo do fundo da terra para produzir energia. Várias gerações já se destruíram em guerras pelo controle do sangue negro. Eles continuam guerreando, porque ainda não conseguimos extrair energia de fontes renováveis, exclusivamente.

A fonte de energia não renovável é como um pote de doces. Retiramos os doces até eles acabarem. Para que sejam feitos novos doces, a terra precisa de milênios! O petróleo é um recurso esgotável. Ele aceita a teoria do pote de doces.

Nós temos uma estrela linda, o sol, como fonte gigantesca de energia, mas ainda não temos tecnologia segura e eficiente para fazer as esferas de Dyson. Nós ainda precisamos ir melhor na escola antes disso. O avanço da ciência em busca de fontes de energia limpa é um desafio deste tempo. O sol também é um pote de doces, porém, gigantesco! Um dia ele acabará, mas irá demorar muito.

Estamos nos esforçando para cuidar melhor da terra, agora que ela está doente. Sobretudo porque causamos sérias avarias em sua roupa natural com proteção dos raios violentos do sol: os raios ultravioleta.  Nós fizemos buracos gigantes na roupa de ozônio da terra. Agora ela sente e revida contra nós.

Precisamos melhorar muito nosso tratamento para com a nossa casa, porque nossos planetas vizinhos não gostam de receber  visitas e não têm como acomodar 8 bilhões de refugiados ambientais, caso fique mais doente do que já está e nos expulse daqui por meio de catástrofes ambientais. Vênus, por exemplo, aqui perto,  é uma filial do inferno. Marte ainda é um sonho distante. Enquanto a terra estiver doente, vamos estudar muito para salvarmos a ela e a nós mesmos.

     II- A solidariedade
    
Desde que começamos esta jornada, temos manifestado preferência pela vida coletiva, por viver e nos organizar em grupos. Alguns filósofos já disseram que somos animais políticos e animais sociais. Temos, portanto, a preferência pelo coletivismo, como forma de organização dos humanos.

No século XXI, entendemos que, além do modo coletivista de organização dos grupos sociais, precisamos promover o estabelecimento de atividades conjuntas, se quisermos preservar o nosso planeta da destruição e a nós mesmos da autodestruição.

O povo francês tem uma expressão idiomática muito significativa sobre essa estratégia de relacionamento que nos faz obter resultados incríveis quando trabalhamos em conjunto para buscarmos a solução de um problema: sprit du corp. O povo árabe também também usa uma expressão para dizer sobre o espirito de corpo: asabyiah.

A certeza de pertencermos a uma coletividade chamada humanidade, e de que esta coletividade está ameaçada,  nos impulsiona a ações conjuntas: trabalhar com sinergia pela salvação do planeta é um dos desafios para esse corpo coletivo chamado humanidade.

Sinergia é, neste sentido: ato ou esforço coletivo. Cooperação. A cooperação pelo restabelecimento da Terra é um consenso importante no século XXI. Mesmo as crianças pequenas estão convidadas a participar ativamente dessa força-tarefa.

A matriz de solidariedade nos orienta  para o fim das guerras,  que são máquinas de destruição; para a não-discriminação motivada por futilidades como o gênero [que é rico e plural] e para os matizes raça/cor; para a redução de referências de desigualdade. A solidariedade é um imperativo deste século.


     III- Capitalismo inclusivo
O capitalismo é um conceito que representa o modo de produção e distribuição dos recursos entre nós, humanos. Temos experimentado muitos modelos de distribuição e de produção das riquezas amealhadas pelo esforço do trabalho humano. O capitalismo tem sido o modelo econômico dominante nos últimos séculos.

Alguns cientistas já anunciaram a morte do capitalismo, mas ele continua vivo e majoritário.

 O grande problema para o capitalismo é a assimetria na concentração da riqueza. Isto implica, em outro sentido, na extrema desigualdade e pobreza.

 A extrema desigualdade gerada pelo capitalismo tem efeitos sobre os dois tópicos anteriores: a solidariedade e o meio ambiente.

 Na periferia do capitalismo,  os humanos muito pobres são privados de condições humanamente dignas. São excluídos do acesso à tecnologia, do acesso à Internet de qualidade, dos insumos de saúde, alimentos e educação qualitativos.

O grande desafio para o capitalismo atual é transpor essa fronteira, distribuindo riqueza e reduzindo a desigualdade entre as pessoas sem violar seus próprios dogmas.

 Neste sentido, no século XXI, o capitalismo se reinventa pela transição da matriz predatória do meio ambiente, contrária à solidariedade e à redução das desigualdades na distribuição da riqueza.

O humano do século XXI já compreende a necessidade de trabalhar a transição dessas três matrizes para um modelo ambientalmente consciente, solidariamente responsável e materialmente igualitarista: sobretudo porque o avanço tecnológico necessita de massas consumidoras, capazes de dinamizar material e simbolicamente os serviços, bens, frutos e produtos disponíveis.

Aqueles que produzem e insistem na matriz dos séculos anteriores caminharão para o abismo e necessitarão pedir socorro para o capital improdutivo especulativo,  a fim de se salvar do colapso. O século XXI é para humanos que olham para o futuro.

Todos os humanos no século XXI cultivam essas três lições? Não. Há muitos que vivem aprisionados ao passado.

Estamos todos convidados a embarcar nesta viagem rumo ao futuro.     

Planeta terra, agosto de 2024.

Shirlei Florenzano Figueira
Shirlei Florenzano, advogada e professora da Universidade Federal do Oeste do Pará - UFOPA, mestra em Direito pela UFPA, Membro da Academia Artística e Literária Obidense, apaixonada por Literatura e mãe do Lucas.

Ítalo Abati e seu projeto “Capital” para Belém

Anterior

Conte-se até dez…

Próximo

Você pode gostar

Comentários