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Acaba hoje o prazo legal dos incentivos fiscais à Vale, e até agora não houve acordo. O governo do Estado mantém sua postura de cobrar pelo menos o equacionamento da dívida  -que já está em R$1,8 bilhão -, além da verticalização da produção, com a implantação da siderúrgica em Marabá, a sonhada Alpa. Amanhã será o primeiro dia em toda a história da Vale no Pará sem diferimento de ICMS. 

A Vale, por sua vez, continua a conversar com o secretário de Estado de Desenvolvimento Econômico e Social, Adnan Demachki, que avalia terem as negociações avançado, mas não com a concretude esperada e de forma que atenda aos interesses do Pará. A mineradora concorda em pagar a dívida e construir a Alpa, mas não admite fechar o compromisso com prazo determinado. Continua a querer vincular a execução a várias condicionantes, como, por exemplo, o derrocamento do pedral do Lourenço, prometido pelo governo federal há mais de cinco anos, para viabilizar a hidrovia Tocantins-Araguaia, e nunca cumprido. 

A Vale propõe, também, que a siderúrgica planejada para Marabá, de um milhão de toneladas, seja de bobinas e não de placas de metal. Mas a produção de bobinas – assim como a sua ferrovia – só irá atender aos interesses da própria mineradora, e não aos anseios da população do Pará.

A estratégia evidenciada pela Vale é jogar pesado até o último minuto, pressionando o governo do Estado ao máximo, ameaçando demissões de trabalhadores em massa e o encerramento de suas atividades no Pará. Mas tudo isso não passa de um jogo – pesadíssimo – para evitar pagar o que deve e é legítimo.  

A verdade é que o prazo acabou e o tempo corre em favor do Pará. O mercado internacional está em baixa e operar sem diferimento fiscal será um golpe duríssimo – e insuportável -na companhia. Encerrar atividades no Pará é uma opção que simplesmente não existe, é só jogo de cena, porque isso implicaria na extinção da própria mineradora. Além do mais, a Vale precisa comprar os caríssimos equipamentos para o S11D, o maior projeto de lavra de minério de ferro do mundo, que envolve R$40 bilhões destinados à nova mina, usina e logística, inclusive a expansão da Estrada de Ferro de Carajás e a ampliação do porto de Itaqui, em São Luis (MA), aliás, em detrimento ao porto de Vila do Conde, no Pará. A partir de amanhã, quando essas imensas máquinas entrarem no território paraense terão que pagar o diferencial de alíquota de ICMS, do qual a Vale estava isenta antes, e o percentual é de 10%, nada insignificante. 

Para 2016, o
Projeto Ferro Carajás S11D tem estimativa de extração de nada menos que 90 milhões de
toneladas métricas de minério de ferro, volume suficiente para encher 225 navios do tipo Valemax, o maior mineraleiro do mundo. A
 Vale
planejou há décadas passar a explorar, a partir do ano que vem, na Serra de Carajás, com o Projeto de Ferro Serra Norte – efetivado desde 1985 – e o S11D, 230 milhões de toneladas métricas de minério
anualmente. Desde os tempos da então Companhia Vale do Rio Doce (CVRD), em 1984, o plano de extração do corpo mineral da parte sul da Floresta
Nacional de Carajás já existia, uma fantástica reserva de
minério lavrável alcançando 3,4 bilhões de toneladas. 

O ramal ferroviário estendido da EFC até a jazida da Serra Sul, cuja licença junto ao Instituto Brasileiro do Meio Ambiente e
dos Recursos Naturais Renováveis (Ibama) já foi obtida, também já estava nos planos da companhia desde 1984, quando ainda era estatal. 
É óbvio que a Vale não irá jogar tudo por terra só para não cumprir as exigências do Estado do Pará. Terá que ceder.

Além do mais, a exploração
do S11D é só parte das 45 formações de minério de ferro que compõem
a cordilheira Serra Sul. Ainda há mais outros corpos, A, B e C, que serão
explorados no futuro. Como 
o mercado mundial de minério de ferro é extremamente concentrado, e mais de dois terços da oferta global da matéria prima depende da Vale e das anglo-australianas BHP Biliton e da Rio Tinto, a Vale apostou muito alto no S11D como seu principal projeto, porque através dele poderá ampliar suas vantagens assumindo ampla liderança do setor. 

As investigações da Comissão da Verdade apontam que a região de Carajás – que na década de 1980 era submetida
ao Grupo Executivo das Terras do Araguaia/Tocantins (Getat), criado pelo regime militar e vinculado à Secretaria Geral do Conselho de Segurança Nacional a fim de controlar o conflito pela posse de terra na área, também assegurou a estratégia ditatorial na implantação dos
grandes projetos na Amazônia. O controle dos
recursos naturais garantiu o extermínio da Guerrilha do Araguaia, por exemplo. Os paraenses têm sofrido, desde então, com a chegada de centenas de milhares de aventureiros, o aumento da violência, criação de bolsões de miséria, prostituição de adolescentes, demanda exponencial de serviços públicos, principalmente saneamento básico, saúde, transporte e moradia.





Por estas e outras razões, a Vale terá que ceder, ao fim e ao cabo. O povo do Pará merece. Já abriu mão de tudo durante todo o tempo. A hora da virada é agora.
Franssinete Florenzano
Jornalista e advogada, membro da Academia Paraense de Jornalismo, da Academia Paraense de Letras, do Instituto Histórico e Geográfico do Pará, da Associação Brasileira de Jornalistas de Turismo e do Instituto Histórico e Geográfico do Tapajós, editora geral do portal Uruá-Tapera e consultora da Alepa. Filiada ao Sinjor Pará, à Fenaj e à Fij.

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