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Sim.  O Oscar 2025 de Melhor Filme Internacional é do Brasil com a premiação de melhor filme internacional para “Ainda Estou Aqui”, na prova irrefutável de que o cinema nacional, por meio de uma campanha incansável em vários festivais pelo mundo afora, pode causar impacto como acontecimento cultural, discussão política e agregar valores de mercado forma direta ou indiretamente com a indústria do entretenimento audiovisual em termos globais.

É uma parada, ainda que momentânea, na bipolaridade que tomou conta em boa parte do país para despertar um sentimento nacional de coletividade que vai além da euforia em pleno calendário de carnaval. É o Brasil em tempo de cinema, pois o filme de Walter Salles marcou presença nas ruas, nos blocos e desfiles carnavalescos.

“Ainda Estou Aqui” é pauta do momento nas redes sociais com fóruns de discussão sob o período de ditadura militar Brasil, o cinema nacional contemporâneo, assim como o interesse despertado pelo legado de Eunice Paiva e a literatura de Marcelo Rubens Paiva, recentemente agredido durante uma homenagem que recebeu pelo fato de existir, de ser o que é enquanto cidadão e artista gerador de fato cultural e político, pois a discussão sobre o caráter de crime permanente para casos de ocultação de cadáver voltou com repercussão em diversos níveis no meio jurídico. 

A não premiação para a categoria de melhor atriz para Fernanda Torres, sendo escolhida Mikey Madson por “Anora” (de Sean Baker), revela a imprevisibilidade do maior prêmio cinematográfico do cinema americano, já que as favoritas da noite eram Demi Moore (Substance) e Fernanda Torres. Nunca sabemos ao certo sobre os critérios utilizados pelos votantes e se realmente assistiram todas as performances indicadas para a categoria.

O que se viu foi a valorização do cinema independente necessariamente feito nos Estados Unidos, pois “Anora” arrebatou os prêmios de melhor filme, direção, montagem e roteiro original, em detrimento de “O Brutalista”, filme épico de Brady Corbet que foi vencedor nas categorias de melhor ator (Andrien Brody), trilha sonora original e fotografia. Filmado em VistaVision, variante widescreen de resolução mais alta do formato de filme 35 mm, “O Brutalista” é um filmaço que certamente ficará para a história do cinema ao tratar de assuntos como o outro lado do sonho americano, arquitetura, sacrifícios e reprodução de humilhações por parte de quem está com privilégios nas relações de poder financeiro e quem se sujeita em nome de uma glória que pode ser vã.

Vale destacar as premiações da animação “Flow” e de atriz coadjuvante para Zoe Saldaña. O primeiro se utiliza de visual deslumbrante para narrar a sobrevivência de um gato e outros animais com foco nas consequências apocalípticas da mudança climática em um planeta tomado pelas águas. O segundo, pelo reconhecimento, ainda que na categoria de coadjuvante, para a performance digna de ser indicada como protagonista, já que Zoe Saldaña tem a maior parte dos diálogos do filme e a personagem Rita Castro abre, fecha e pontua a narrativa de um filme cheio de problemas.

Vale lembrar que é imperdoável a omissão do cineasta brasileiro Cacá Diegues nas homenagens póstumas de uma celebração que tenta estar antenada com o cinema do mundo, com os olhos voltados para o grande mercado cinematográfico na América Latina e outros continentes. Com a premiação de “Ainda Estou Aqui”, fica a dica de ver ou rever filmes marcantes de Walter Salles: “Terra Estrangeira” (1996), “Central do Brasil” e “O Primeiro Dia” (1998), “Abril Despedaçado” (2001), “Diários de Motocicleta” (2004), “Linha de Passe” (2008) e “Na Estrada” (2012).

José Augusto Pachêco
José Augusto Pachêco é jornalista, crítico de cinema com especialização em Imagem & Sociedade – Estudos sobre Cinema e mestre em Estudos Literários – Cinema e Literatura. Júri do Toró - 1º Festival Audiovisual Universitário de Belém, curadoria do Amazônia Doc e ministrante de palestras e cursos no Sesc Boulevard e Casa das Artes.

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