Publicado em: 4 de agosto de 2025
Apesar de a maior parte da pauta exportadora do Pará ter sido poupada das novas tarifas impostas pelos Estados Unidos, o açaí, produto símbolo da bioeconomia parauara e carro-chefe das exportações do estado para o mercado estadunidense, não escapou das sobretaxas. A medida, oficializada no último dia 30, tem potencial para provocar uma retração significativa nas vendas externas do fruto, com impactos diretos na economia, no emprego e na sustentabilidade de comunidades amazônicas.
Segundo levantamento realizado pela Federação das Indústrias do Estado do Pará (FIEPA), por meio do Centro Internacional de Negócios (CIN) e do Observatório da Indústria do Pará, os produtos efetivamente afetados pela nova tarifação devem representar 20,1% do volume exportado do Pará para os EUA, sendo que o açaí responde sozinho por 8% desse total. Embora o estudo da FIEPA indique que o impacto geral sobre o comércio exterior parauara será moderado, o caso do açaí exige atenção especial devido ao seu peso econômico e social.
Os números demonstram a relevância do açaí na balança comercial do estado. Apenas no primeiro semestre de 2025, o Pará exportou cerca de US$ 57,8 milhões em produtos derivados do fruto, um crescimento de 64,96% em comparação com o mesmo período de 2024. Desse total, US$ 43,6 milhões tiveram como destino os Estados Unidos, que concentram 75,4% das exportações parauaras de açaí.
Entre os itens mais vendidos, destacam-se os sucos não fermentados e sem adição de açúcar, que movimentaram mais de US$ 32 milhões, representando 55,48% da pauta. Também se destacam frutas e partes de plantas preparadas ou conservadas de outras formas, com participação de 30,83%, totalizando US$ 17,8 milhões.
Apesar da forte expansão e da robustez do açaí como um dos ingredientes favoritos no setor de alimentação saudável nos EUA, a nova taxação coloca em risco a competitividade do produto no exterior, já que o aumento no custo de importação pode reduzir sua presença nas prateleiras e impactar negativamente o consumo.
Além das perdas comerciais, a medida pode ter consequências profundas na cadeia produtiva. De acordo com a FIEPA, o setor envolve cerca de 5 mil empregos diretos na indústria e 15 mil indiretos, muitos deles localizados em comunidades ribeirinhas e rurais da Amazônia que dependem da coleta e processamento do fruto como principal fonte de renda.
“Essa medida compromete empregos, reduz a produtividade e afeta diretamente a sustentabilidade econômica de milhares de famílias da Amazônia, principalmente aquelas que dependem da colheita e processamento do fruto para sobreviver”, alerta Alex Carvalho, presidente da FIEPA.
Embora o consumo interno de açaí tenha crescido nos últimos anos, o mercado nacional, operando em reais e com menor valor agregado, não consegue compensar as perdas resultantes da redução das exportações, feitas em dólares. Para a indústria parauara, a dependência do mercado estadunidense é um fator de vulnerabilidade diante de decisões unilaterais que podem afetar toda a cadeia.
Mesmo com quase 700 exceções concedidas pelo governo dos EUA, que isentaram sete dos dez principais produtos exportados pelo Pará, o cenário ainda inspira cautela. Os sucos de frutas, categoria que inclui parte dos derivados de açaí, sofrerão aplicação parcial de tarifas, enquanto outros produtos importantes, como hidróxido de alumínio, sebo bovino fundido e madeiras tropicais perfiladas, foram incluídos integralmente na taxação.
A projeção da FIEPA é que, mesmo com as isenções, o impacto possa gerar uma retração de 1,16% nas exportações totais do estado, com perda estimada de R$ 403 milhões no Produto Interno Bruto (PIB) do Pará. Isso reduziria a expectativa de crescimento do PIB de 3,5% para 3,38% em 2025.
Em um cenário mais severo, com taxação sobre todos os produtos exportados, a queda nas exportações poderia atingir -2,81%, provocando uma perda de R$ 973 milhões no PIB estadual e reduzindo a projeção de crescimento econômico para apenas 3,22%, ou seja, uma queda de 8% na expectativa inicial.
A FIEPA já articula, junto aos governos estadual e federal, ações diplomáticas para buscar soluções que minimizem os efeitos da tarifação e protejam os segmentos mais vulneráveis da indústria local. A prioridade, segundo Alex Carvalho, é estabelecer canais de diálogo com as autoridades estadunidenses, municiando os governos com dados técnicos para renegociar os termos e avaliar contrapartidas.
“Precisamos buscar alternativas diplomáticas e preparar medidas mitigadoras em todos os níveis — federal, estadual e municipal — para proteger essa cadeia produtiva, que já é historicamente vulnerável e que tem papel fundamental no desenvolvimento sustentável da Amazônia”, reforça Alex Carvalho.
Além disso, a FIEPA destaca a importância de compreender a dimensão social do impacto, uma vez que empresas altamente especializadas, com foco exclusivo na exportação de açaí, podem ser gravemente afetadas. Algumas delas têm quase 100% de suas vendas concentradas nos itens tarifados, o que torna urgente a definição de estratégias de mitigação e apoio.
O aumento de preços do açaí no mercado estadunidense não deve passar despercebido. Com forte apelo entre consumidores, o fruto amazônico é um ingrediente de destaque em sucos, bowls, suplementos e produtos orgânicos. A imposição de tarifas pode tornar o produto menos acessível ao consumidor final, afetando também o mercado interno dos EUA ao atingir um item com forte aceitação entre o público jovem e ambientalmente engajado, num mercado em que o açaí simboliza saúde, sustentabilidade e comércio justo.
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