Publicado em: 9 de setembro de 2025
O Centro de Atenção Psicossocial (CAPS) Fluvial de Abaetetuba foi escolhido para representar a região Norte e se tornou destaque na Mostra Nacional da Rede de Atenção Psicossocial, realizada em Manaus. O projeto, inédito no país, leva atendimento em saúde mental às comunidades ribeirinhas, fazendo do município um protagonista inovador em políticas públicas no campo da saúde mental voltada para as populações tradicionais.
O CAPS Fluvial nasceu como experiência local, mas rapidamente ganhou dimensão nacional. Inicialmente premiado na etapa estadual, em Belém, pelo Conselho Regional de Psicologia, o projeto avançou para a fase nacional, onde conquistou o reconhecimento do Conselho Federal de Psicologia como referência inovadora de cuidado em saúde mental.
“Das águas dos nossos rios, para ser exemplo para o Brasil inteiro, o nosso CAPS Fluvial foi destaque na primeira Mostra Nacional da Rede de Atenção Psicossocial. É o reconhecimento de uma prática pioneira que leva a saúde mental até as comunidades ribeirinhas e mostra que é possível cuidar, respeitando a identidade e a cultura dos territórios, com dignidade e respeito”, declarou a prefeita Francineti Carvalho.

Para Francineti Carvalho, que além de prefeita é psicóloga e pesquisadora científica, os resultados comprovam o potencial transformador das políticas públicas embasadas não apenas pela ciência formal, mas também com profundo respeito aos saberes tradicionais amazônidas.
O projeto, que é de autoria da própria prefeita, atualmente em fase de pesquisa doutoral, tem como objetivo oferecer ao governo federal um modelo de política pública que consolide a atenção psicossocial aos ribeirinhos, assim como ocorreu com a criação das UBS Fluviais.
Hoje, o atendimento em saúde mental depende da articulação das equipes da UBS fluvial: psicólogos atendem as demandas encaminhadas por agentes comunitários e médicos, enquanto casos que necessitam de psiquiatra ainda são enviados para a cidade. A proposta em elaboração busca criar um modelo que respeite o território e dialogue com saberes tradicionais, como o uso de ervas medicinais e rituais de cura.
“A minha tese é exatamente elaborar uma proposta com orçamento, levantando o custo de como seria um modelo de clínica que respeite os saberes do território e ofereça escuta qualificada a essa população”, explicou Francineti.
A experiência pioneira do CAPS Fluvial de Abaetetuba já ganhou visibilidade em diferentes espaços acadêmicos e científicos. O projeto foi finalista em congressos, resultou em artigos publicados em revistas especializadas e vem sendo apresentado em encontros pelo Brasil. Apesar desse reconhecimento, ela pondera que ainda não existe uma política nacional que garanta financiamento específico para o atendimento em saúde mental de populações ribeirinhas.
Segundo a gestora, a iniciativa tem sido sustentada com recursos próprios do município e também com apoio da Unidade Básica de Saúde (UBS) fluvial, que atua de forma integrada no atendimento. Essa realidade, explica, evidencia a urgência de uma política pública permanente.
Por isso a meta urgente de Francineti em sistematizar o projeto em sua tese de doutoramento e entregar ao governo federal uma proposta concreta para transformar o CAPS Fluvial em programa nacional. A ideia é que a política siga os passos das UBS fluviais, que surgiram como experiências isoladas e hoje já integram oficialmente a Atenção Básica em Saúde, com financiamento garantido.
Além do destaque CAPS Fluvial na Mostra Nacional da Rede de Atenção Psicossocial, Abaetetuba também foi premiada em outras duas iniciativas durante o congresso do Conselho Nacional de Saúde, que também aconteceu em Manaus. Dos cinco projetos apresentados pela prefeitura de Abaetetuba, três receberam prêmios, sendo dois deles voltados diretamente para a saúde mental.

O Grupo Terapêutico Multissensorial: Estímulo interativo para crianças com TEA, de autoria de Letícia Álax da Silva Carvalho e coautoria de Francisca Mendes Lobato, Anderson Santos dos Passos, Rosângela Maria Fonseca de Sena, Odailson Figueiredo Gomes, Adriele do Socorro Negrão, Elaine Marques Rodrigues e Matheus Maués da Silva Penha, promove acolhimento e desenvolvimento socioemocional de crianças com autismo e suas famílias, valorizando o acompanhamento multidisciplinar e a construção de rotinas estruturadas. A iniciativa funciona em uma Unidade Básica de Saúde e busca estimular o desenvolvimento socioemocional por meio de atividades lúdicas, terapêuticas e integrativas. Entre as estratégias utilizadas estão atendimentos individuais e coletivos, reuniões com familiares, práticas de nutrição, fisioterapia, psicologia, arte e educação física, sempre de forma interdisciplinar. O objetivo é ampliar a adesão das crianças às intervenções, fortalecer o vínculo familiar e oferecer suporte prático aos cuidadores, reduzindo o uso de medicação e promovendo melhorias na comunicação, na seletividade alimentar e na autonomia das crianças. Além disso, o GT Multi já demonstrou resultados expressivos, como a expansão do número de assistidos e o encaminhamento de casos para serviços especializados, consolidando-se como um modelo de cuidado inovador e humanizado em saúde mental infantil.

O projeto “Menos tempo de tela, mais tempo presente: Estratégias de prevenção da saúde mental infantil”, assinado pela psicóloga Doutora Rachel de Siqueira Dias, com coautoria de Lucenilda de Sousa Ribeiro e Janete Miranda Caldas, mobiliza escolas, Unidades Básicas de Saúde, CAPS e comunidades para incentivar hábitos saudáveis e fortalecer vínculos familiares por meio de rodas de conversa e dinâmicas educativas. A autora, que é coordenadora de Saúde Mental da Prefeitura e pesquisadora, ressaltou a importância da prevenção e da aproximação com as famílias. Em ação no Rio Anequara, ela apresentou o projeto:
“É muito bom resgatar as brincadeiras antigas, que foram esquecidas devido às telas. É essencial estimular também a conversa dos pais e mães com seus filhos, o diálogo na família. O nosso trabalho é levar informação a toda a comunidade para que todos sejam parceiros em prol da melhoria da saúde mental de nossas crianças. Durante o ano inteiro nós levaremos esse projeto para as escolas que faltaram”, afirmou.

Já o projeto “SUS na Veia: o engajamento intersetorial na gestão de campanhas de doação de sangue em Abaetetuba”, de autoria de Laurindo Campos de Lima, com coautoria de Andreza Negrão Melo, Osvalda Cruz Rocha, Raimunda Rosa R. Carvalho Vouzela e Tatiana Vilaça Rodrigues, articula diferentes setores para ampliar a participação da população nas campanhas de doação, fortalecendo o HEMOPA local e garantindo maior segurança transfusional.
O projeto surgiu da necessidade de enfrentar a baixa reposição de bolsas de sangue no município, já que, em 2023, a Unidade de Pronto Atendimento conseguiu suprir apenas 30% da demanda. A iniciativa, coordenada pela Secretaria Municipal de Saúde, reúne esforços intersetoriais para ampliar a participação da população e dos profissionais de saúde nas campanhas de doação, em parceria com o Hemopa local .
A proposta vai além da captação: cria um banco de dados atualizado de doadores, promove rodas de conversa, pesquisas e reuniões de alinhamento, além de ações educativas voltadas ao autocuidado e à valorização do Sistema Único de Saúde. O projeto também utiliza grupos de mensagens e atividades online como ferramentas de mobilização.
Os resultados já demonstram impacto positivo: entre 456 cadastros de profissionais de saúde e comunidade, houve aumento expressivo no número de doadores ativos e expansão das campanhas. O “SUS na Veia” é uma estratégia inovadora de gestão solidária, capaz de integrar educação permanente, comunicação em saúde e engajamento comunitário para garantir a sustentabilidade do banco de sangue em Abaetetuba.

Juntos, esses trabalhos representam a união entre ciência, gestão e comunidade na construção de uma saúde pública mais acessível, inclusiva e solidária. “Esse é um reconhecimento que celebra o cuidado levado até a população de forma pioneira, com valorização da identidade, respeito ao território e humanização. Somos gratos às psicólogas, parceiras e parceiros destes projetos e a todos que constroem essa história com dedicação e compromisso de fazer o cuidado chegar a todos”, destacou a prefeita.
Os três prêmios e o destaque conquistados em Manaus são um reflexo da centralidade da saúde mental na gestão de Abaetetuba. Para Francineti, o caminho é seguir construindo, a partir da Amazônia, soluções que inspirem o país inteiro.
“O reconhecimento é importante, mas o maior orgulho é ver que estamos transformando a vida das pessoas nas nossas comunidades ribeirinhas”.

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