Publicado em: 28 de julho de 2025
Nos primeiros momentos de nossa existência somos colocados pelos nossos pais, ou quem exercia a função, na posição de objetos de amor. Quando esse Outro parental nos erogeniza e nos investe libidinalmente, lança-nos na pulsão de vida e dá contorno, representatividade ao nosso corpinho. Portanto, é o amor do Outro que dá a base para a nossa existência. Mas, como não somos mera extensão de nossos pais, também por amor, eles nos inserem no coletivo para que a vida nos ofereça novos encontros.
Vamos imaginar o fogo com uma chama vermelha simbolizando o erotismo (gozo) e outra azul representando o amor (desejo). São essas as chamas que os amantes buscam. Porém, como são coisas distintas podem se aproximar ou se distanciar, determinando, dessa forma, nossos encontros e desencontros vida afora.
A entrega erótica, diferente da nossa relação amorosa primordial, não é uma forma de alienação. Na relação sexual há entre nós e os nossos parceiros um muro que nos salvaguarda. Essa barreira é a nossa própria fantasia. Portanto, o valor que vamos atribuir ao outro, e vice-versa, dependerá da imagem que nós fantasiaremos daquele, dependendo do que ele reflete para nós.
Na nossa cultura há uma vasta oferta de possibilidades eróticas que vão desde os produtos de sexshops einúmeros sites de relacionamentos, até casas noturnas ou clubes onde o sexo é livre e os frequentadores podem realizar suas múltiplas fantasias sexuais. Porém, certas situações extremas em relação ao erotismo, com as quais com frequência nos deparamos, sinalizam para um limite que se enevoa. Assim, ao mesmo tempo em que traz uma proposta libertária, abrindo novas formas de existência no mundo, remete-nos, tanto na clínica quanto no âmbito social, a pensar mais profundamente nos casos fronteiriços. O certo é que nem mesmo todas essas inovações foram capazes de facilitar, de fato, o encontro.
Apesar dos inúmeros aplicativos de relacionamentos que nos oferecem um “cardápio” interessante de pessoas, o encontro real ou o real do encontro ainda é muito difícil.
Costumamos imaginar que precisamos ter a boca da Angelina Jolie, as pernas da Jennifer Lopez e o charme do Chris Hemswoth para sermos escolhidos. Por isso, entramos numa busca desenfreada, consumindo tudo o que achamos que precisamos para ficarmos desejáveis. Mas, esses elementos causam apenas gozo. Não causam desejo. O desejo se alimenta da falta. E isso se torna lógico ao pensarmos que só desejamos aquilo que falta. Óbvio! Se temos, não desejamos.
O que nos captura e nos faz abrir a porta para o outro é – contrariando todo o discurso social – justamente o que falta. Vamos nos identificar com as fragilidades, as incertezas, as dificuldades, as indefinições, o incompleto, o indecidido, o inacabado. Serão nesses espaços vazios que desejaremos habitar. Assim é feita a tecitura dos fios dos encontros e desencontros.
Engana-se quem pensa que o encontro só traz felicidade. Ele nos angustia, porque promove o encontro inominável de nós com nós mesmos através desse estrangeiro que nos captura, confronta-nos e nos faz dialogar com algo estranho que nos parece familiar e ao mesmo tempo um familiar que nos parece estranho. Mas esse enamoramento também é o que potencializa a construção de um novo sentido para nossa existência. Portanto, não esqueçamos o que dizia o poeta: “a vida é a arte do encontro, embora haja tanto desencontro pela vida”
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