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O ex-deputado federal Wladimir Costa foi preso hoje (18) pela Polícia Federal ao desembarcar de um avião no aeroporto de Belém do Pará. O mandado de prisão preventiva, requerido pela PF, foi cumprido aliado a mandado de busca e apreensão no seu endereço residencial, com autorização para arrombamento de cofres, portas, gavetas ou outros obstáculos e autorização de acesso aos equipamentos e aparelhos, dados, arquivos e mensagens eletrônicas, inclusive armazenadas em nuvem, além de bloqueio de perfis/canais e exclusão das publicações nas redes sociais. Wlad foi submetido a exame de corpo de delito e levado à carceragem da Marambaia, onde aguarda a audiência de custódia.

“A violência, distinguindo-se do poder, é muda; a violência tem início onde termina a fala”. A célebre frase de Hannah Arendt correlaciona violência e política. Há seis meses a deputada federal Renilce Nicodemos vem sendo alvo de repugnantes lives, posts, gravações em áudio e em vídeo nas redes sociais de Wladimir Costa, disseminadas através de grupos de WhatsApp. A intimidade da deputada tem sido exposta de forma degradante, ferindo a dignidade humana, tais os termos baixos e irrepetíveis utilizados no claro intuito de destruir a sua reputação e feri-la emocionalmente com requintes de crueldade. Pessoa pública, ela pode e deve ser criticada por sua atuação política, erros e desacertos, nunca no que diz respeito à vida pessoal e por ser mulher. Em nota enviada ao portal Uruá-Tapera, Renilce Nicodemos informou ter apresentado notícia crime à Justiça Eleitoral, denunciando Wlad por violência política de gênero, extorsão, injúria, difamação, perseguição e violência psicológica contra a mulher.

O conteúdo das publicações do ex-deputado segue a linha machista: a mulher política tem que ter comportamento angelical. Já os homens podem ter amantes, humilhar, maltratar e espancar suas esposas e filhos e depois ir à missa ou pregar no culto. As mulheres têm seus corpos milimetricamente avaliados e depreciados, os homens cultivam suas barrigas, carecas e gorduras sem problema algum. Podem beber, falar e rir alto, discursar e debater acaloradamente. Se for mulher, é tachada de “alterada”, “nervosa”, “instável”, “desequilibrada” e outros adjetivos asquerosos, sempre diminuindo a condição feminina. Podem casar com adolescentes, divorciar N vezes. Já a mulher logo é estigmatizada como depravada que sustenta o parceiro. Foi assim com todas as mulheres que se destacaram e se destacam na política, a exemplo da presidente Dilma Rousseff (a primeira do Brasil), da governadora Ana Júlia Carepa (a primeira do Pará) e da prefeita de Abaetetuba (PA), Francineti Carvalho (em terceiro mandato em um município notório por todo tipo de violência, com 72 ilhas além da sede na parte continental), e milhares de outras mulheres líderes. Claro está que violência política de gênero é um ataque à democracia e à cidadania, e que precisa ser repelida pela sociedade.

Desde 2021, a Lei 14.192 define regras para a prevenção e punição de práticas que excluam as mulheres dos espaços de poder. Este ano, mais uma vez, o combate à violência política contra a mulher é um desafio nas eleições municipais. A violência política de gênero é estrutural, naturalizada e camuflada, com presença permanente nas relações sociais. A perpetuação da violência assim é uma forma de calar e barrar conquistas de transformação.

Estudo do IPU e do Pace (Inter-Parliamentary Union and Parliamentary Assembly of the Council of Europe) sobre sexismo, assédio e violência contra mulheres no parlamento de 39 países em cinco regiões e 42 parlamentos concluiu que 81,8% das mulheres sofreram violência psicológica; 46,7% temeram por sua segurança e a de sua família; 44,4% receberam ameaças de morte, estupro, espancamento ou sequestro; e 25,5% sofreram violência física.

No Brasil, os dados são alarmantes. O Instituto Alziras produziu em 2023 o relatório “Mulheres no Poder” e o “Censo das Prefeitas” (mandato 2021-2024), revelando que as mulheres são 51% da população, mas governam só 12% dos municípios. A falta de recursos para campanha e de apoio do partido ou da base aliada, com assédio e violência no espaço político e falta de visibilidade na mídia em comparação aos políticos homens são as principais barreiras que impedem o acesso e a permanência das mulheres na política, especialmente para as prefeitas: 58% delas sofrem assédio ou violência política por serem mulheres.

Importantes alterações foram inseridas no Código Eleitoral no que toca ao combate à violência política de gênero. É crime eleitoral assediar, constranger, humilhar, perseguir ou ameaçar, por qualquer meio, candidata a cargo eletivo ou detentora de mandato eletivo, com menosprezo ou discriminação à condição de mulher.

O título XII na parte especial do Código Penal, relativo aos crimes contra o Estado Democrático de direito, no capítulo III, artigo 359-P, tipifica a violência política como medida que restringir, impedir ou dificultar, com emprego de violência física, sexual ou psicológica, o exercício de direitos políticos a qualquer pessoa em razão de seu sexo, raça, cor, etnia, religião ou procedência nacional. Por sua vez, o Conselho Nacional de Justiça instituiu o protocolo para julgamento com perspectiva de gênero. O Brasil registra a cada trinta dias sete casos envolvendo comportamentos para humilhar, constranger, ameaçar ou prejudicar uma candidata ou mandatária em razão de sua condição feminina. Os dados são do CNJ.

A desqualificação da mulher na política pela indução à crença de que não tem competência para a função que exerce, ou o questionamento sobre a sua vida privada (relacionamentos, sexualidade, maternidade) são atos violentos. As mulheres sofrem misoginia, transfobia, machismo, gordofobia. Vivem experiências cotidianas muito duras, com colegas que chegam a assediá-las fisicamente, como foi o caso da deputada Isa Penna, em São Paulo, apalpada por outro deputado estadual em pleno plenário da Assembleia Legislativa. Divulgação de informações falsas, ataques, ofensas e discurso de ódio nas redes sociais, xingamentos verbais presenciais, constrangimento em função da exposição pública da vida afetiva, familiar ou sexual, chantagens ou tentativas de extorsão, ameaças contra a sua vida, de familiares ou membros de sua equipe, assédio sexual por atitude física ou atitude verbal, agressões físicas (tocando em alguma parte do seu corpo ou impedindo a sua passagem) são outros exemplos desse horror que precisa ter fim.

Franssinete Florenzano
Jornalista e advogada, membro da Academia Paraense de Jornalismo, da Academia Paraense de Letras, do Instituto Histórico e Geográfico do Pará, da Associação Brasileira de Jornalistas de Turismo e do Instituto Histórico e Geográfico do Tapajós, editora geral do portal Uruá-Tapera e consultora da Alepa. Filiada ao Sinjor Pará, à Fenaj e à Fij.

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