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No vídeo, Mercedes Sosa recita o Poema
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, uma das obras mais conhecidas do poeta chileno Pablo Neruda, morto há 40
anos, em 23 de setembro de
1973
em Santiago do Chile, oito dias após a queda do Governo da Unidade Popular e da
morte de Salvador Allende.
 

                                    A palavra
                                                                  Pablo Neruda

“… Sim Senhor, tudo o que
queira, mas são as palavras as que cantam, as que sobem e baixam …
Prosterno-me diante delas… Amo-as, uno-me a elas, persigo-as, mordo-as,
derreto-as … Amo tanto as palavras … As inesperadas … As que avidamente a
gente espera, espreita até que de repente caem … Vocábulos amados … Brilham
como pedras coloridas, saltam como peixes de prata, são espuma, fio, metal,
orvalho … Persigo algumas palavras … São tão belas que quero colocá-las
todas em meu poema … Agarro-as no vôo, quando vão zumbindo, e capturo-as,
limpo-as, aparo-as, preparo-me diante do prato, sinto-as cristalinas,
vibrantes, ebúrneas, vegetais, oleosas, como frutas, como algas, como ágatas,
como azeitonas … E então as revolvo, agito-as, bebo-as, sugo-as, trituro-as,
adorno-as, liberto-as … Deixo-as como estalactites em meu poema; como
pedacinhos de madeira polida, como carvão, como restos de naufrágio, presentes
da onda … Tudo está na palavra … Uma idéia inteira muda porque uma palavra
mudou de lugar ou porque outra se sentou como uma rainha dentro de uma frase
que não a esperava e que a obedeceu … Têm sombra, transparência, peso,
plumas, pêlos, têm tudo o que ,se lhes foi agregando de tanto vagar pelo rio,
de tanto transmigrar de pátria, de tanto ser raízes … São antiqüíssimas e
recentíssimas. Vivem no féretro escondido e na flor apenas desabrochada … Que
bom idioma o meu, que boa língua herdamos dos conquistadores torvos … Estes
andavam a passos largos pelas tremendas cordilheiras, pelas .Américas encrespadas,
buscando batatas,
 butifarras*,
feijõezinhos, tabaco negro, ouro, milho, ovos fritos, com aquele apetite voraz
que nunca. mais,se viu no mundo … Tragavam tudo: religiões, pirâmides,
tribos, idolatrias iguais às que eles traziam em suas grandes bolsas… Por
onde passavam a terra ficava arrasada… Mas caíam das botas dos bárbaros, das
barbas, dos elmos, das ferraduras. Como pedrinhas, as palavras luminosas que
permaneceram aqui resplandecentes… o idioma. Saímos perdendo… Saímos
ganhando… Levaram o ouro e nos deixaram o ouro… Levaram tudo e nos deixaram
tudo… Deixaram-nos as palavras.”

*Do livro “Confesso que Vivi — Memórias“, Difel — Difusão Editorial —
Rio de Janeiro, 1978, pág. 51, traduzido por Olga Savary.
Franssinete Florenzano
Jornalista e advogada, membro da Academia Paraense de Jornalismo, da Academia Paraense de Letras, do Instituto Histórico e Geográfico do Pará, da Associação Brasileira de Jornalistas de Turismo e do Instituto Histórico e Geográfico do Tapajós, editora geral do portal Uruá-Tapera e consultora da Alepa. Filiada ao Sinjor Pará, à Fenaj e à Fij.

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