Publicado em: 22 de outubro de 2025
O professor e pesquisador Felipe Kevin Ramos da Silva lançou um financiamento coletivo com o propósito de publicar “O Manto”, romance inédito do escritor muanense José Maria de Lima, e distribuir gratuitamente 100 exemplares no município de Muaná, no arquipélago do Marajó. A iniciativa, conduzida em parceria com a Editora Amazônica Bookshelf, é um gesto de resgate cultural e de valorização da literatura marajoara.
O projeto, hospedado na plataforma Catarse, tem como meta R$ 7.500,00, valor que cobrirá todas as etapas de produção editorial, da transcrição do manuscrito datilografado à revisão, normatização, obtenção de ISBN, ficha catalográfica, impressão e frete. A proposta é garantir que a obra, antes restrita ao papel envelhecido do arquivo pessoal de seu autor, alcance leitores, escolas e bibliotecas comunitárias, firmando-se como testemunho vivo do imaginário do Marajó.
José Maria de Lima, professor e romancista, nasceu em 1933, no município de Muaná, situado no imenso arquipélago flúvio-marítimo do Marajó. Formado em Pedagogia, o escritor dedicou sua vida a registrar, por meio da literatura, as nuances e contradições de sua terra natal. Em suas obras, o cotidiano e os conflitos do povo marajoara ganham voz, revelando a profundidade humana e cultural da região. Reconhecido por sua contribuição à literatura amazônica, recebeu o Prêmio Samuel Wallace MacDowell, concedido pela Academia Paraense de Letras, e foi vencedor do Prêmio de Literatura Dalcídio Jurandir em 2012, na categoria romance, com a obra “Ave, Marajó!“.
“O Manto” é uma jornada entre o sagrado e o profano, entre a crença e a dúvida, entre o homem e a terra. O protagonista, Natalino de Jesus, nasce em 25 de dezembro e, como o próprio nome sugere, carrega em si a promessa e o fardo da redenção. “O Marajó, com sua vastidão e seus mistérios, serve de cenário para uma narrativa que transita entre o sagrado e o profano, entre a fé e a transgressão”, explica Felipe Kevin.
No romance, o leitor acompanha a trajetória de Natalino desde o nascimento até sua transformação quase mítica. O título, “O Manto”, é, segundo Kevin, uma metáfora para o processo de “transformação, redenção e mistério” que atravessa o personagem. As paisagens de Muaná — Maratá, Vila Caferana, Itupiranga, Curralinho, Miritizal — surgem não apenas como geografias, mas como personagens que falam, testemunham e moldam destinos. Cada vila, com seus ritos e contradições, revela o embate entre o moralismo imposto e a liberdade silenciada.
A escrita de José Maria de Lima é marcada pela oralidade típica das narrativas amazônicas, herdeira das histórias contadas à beira dos rios, nas varandas dos currais e nas rezas de fim de tarde. Felipe Kevin define a obra como um “romance que não se limita ao realismo documental, pois incorpora os encantados, os mitos e os seres que habitam o real-imaginário amazônico”. Nessa perspectiva, “O Manto” é literatura que faz da palavra um gesto de preservação cultural, aproximando o leitor da alma ribeirinha e das tensões históricas que moldam o viver caboclo. É penetrar num tempo elástico, onde o passado e o presente coexistem, e as águas marajoaras são tanto vias de passagem quanto espelhos de memória. “As águas não apenas transportam mercadorias, mas também memórias, histórias e sentidos de ser-no-mundo”, observa Kevin. A floresta, por sua vez, deixa de ser cenário e torna-se personagem: silenciosa, vigilante, testemunha das lutas e das resistências que atravessam gerações.
O público pode conhecer mais e apoiar a iniciativa no link oficial da campanha: https://www.catarse.me/o_manto_24d0.
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