Publicado em: 30 de setembro de 2025
Até o dia 3 de outubro, agentes indígenas de saúde, parteiras e pajés do povo Baniwa participam, em São Gabriel da Cachoeira (AM), do curso “Atenção Integrada às Doenças Prevalentes na Infância (AIDPI) Comunitário Materno Infantil”, promovido pelo UNICEF. A atividade ocorre em paralelo à “Escuta Comunitária para a Proteção de Direitos”, conduzida pela Organização Internacional para as Migrações (OIM). Ambas as iniciativas integram o projeto “Proteção Integral e Promoção dos Direitos de Crianças, Adolescentes e Jovens Indígenas na Amazônia Legal Brasileira”, financiado pelo Fundo ONU Brasil para o Desenvolvimento Sustentável da Amazônia.
O curso, que tem carga horária de 36 horas, conta com o apoio da Secretaria Especial de Saúde Indígena (SESAI), da Federação das Organizações Indígenas do Rio Negro (FOIRN) e do Instituto Amazônia Açu (IAÇU). Ele acontece no Polo Base de Camarão, na Aldeia Assunção do Içana, território que reúne cerca de 95 comunidades Baniwa e uma população estimada em 8 mil pessoas. A escolha do DSEI Alto Rio Negro como prioritário decorre das altas taxas de mortalidade infantil registradas na região.
Durante a capacitação, os participantes recebem orientações sobre prevenção e tratamento de doenças comuns na infância, além de temas como aleitamento materno, calendário vacinal, alimentação complementar e acompanhamento do crescimento infantil.
“O UNICEF vem dialogando com a SESAI no fortalecimento das capacidades profissionais de saúde para prevenir doenças prevalentes na infância. Esse trabalho tem sido coordenado em diferentes níveis de engajamento e participação da comunidade, profissionais e gestores para promoção de saúde das comunidades e povos mais suscetíveis às vulnerabilidades, visando reduzir a desnutrição e mortalidade materna-infantil”, destacou Rayanne França, chefe do escritório do UNICEF em Manaus.
Simultaneamente, a OIM conduz rodas de escuta com comunidades de São Gabriel da Cachoeira e da Aldeia Assunção do Içana. O objetivo é identificar desafios e práticas locais relacionadas à prevenção e resposta a violências, incluindo o tráfico de pessoas. A metodologia prevê um diagnóstico participativo que considera a cosmovisão indígena sobre infância, gênero e violências, incorporando ainda percepções sobre saúde sexual e reprodutiva, dignidade menstrual e cuidados tradicionais.
“Essa iniciativa é fundamental para garantir que as vozes das comunidades indígenas sejam ouvidas e respeitadas. Somente a partir desse diálogo direto podemos construir respostas mais efetivas, culturalmente adequadas e capazes de fortalecer as redes de proteção já existentes”, afirmou Mariana Camargo, coordenadora de projetos da OIM.
As informações colhidas vão gerar evidências qualitativas para embasar recomendações institucionais e comunitárias, fortalecer redes de proteção e ampliar a articulação com autoridades locais. Também deverão orientar ações educativas e estratégias culturalmente adequadas, em colaboração com lideranças, parteiras e agentes de saúde.
A taxa de mortalidade infantil (TMI) segue sendo um dos indicadores mais sensíveis para medir a qualidade de vida de uma população. No Brasil, os números mostram desigualdade marcante: em 2022, a TMI entre crianças indígenas de até quatro anos chegou a 34,7 óbitos a cada mil nascidos vivos, contra 14,2 entre não indígenas, segundo estudo do Núcleo Ciência Pela Infância (NCPI). Isso significa que o risco de morte infantil é 2,44 vezes maior entre povos indígenas. As principais causas seguem ligadas a pneumonia, diarreia, desnutrição, malária e infecções perinatais, todas evitáveis com cuidados básicos e acesso oportuno à saúde.
Nesse contexto, a Estratégia AIDPI, criada pela OMS, OPAS e UNICEF, oferece uma abordagem integrada que reúne as principais doenças da infância em um modelo de cuidado global. “Essa metodologia reduz significativamente a mortalidade infantil ao capacitar profissionais de saúde no nível primário de atenção, reconhecendo a diversidade e integrando comunidade e famílias no processo de cuidado e prevenção”, destacou Neideana Ribeiro.
As ações em curso fazem parte do projeto “Proteção Integral e Promoção dos Direitos de Crianças, Adolescentes e Jovens Indígenas na Amazônia Legal Brasileira”, que está sendo implementado entre abril de 2025 e dezembro de 2026 por diversas agências da ONU (UNICEF, UNFPA, ACNUR, UNESCO, OIT, OMS/OPAS e OIM). A iniciativa tem como objetivo garantir acesso a saúde, educação, proteção e documentação civil, respeitando saberes tradicionais e a diversidade cultural da região.
O projeto estrutura-se em seis eixos: saúde materno-infantil e nutrição; saúde sexual e reprodutiva; desenvolvimento integral de adolescentes e jovens indígenas, incluindo migrantes e refugiados; governança territorial inclusiva e educação multilíngue; prevenção da violência; promoção de direitos e documentação civil.
A execução priorizará territórios vulneráveis da Amazônia Legal, com atenção especial a DSEIs estratégicos e Reservas da Biosfera. A governança será garantida por um Comitê Gestor Interagencial, além de grupos temáticos e planos coletivos de comunicação, monitoramento e engajamento intercultural.
Foto: Juliane Frazão/IEB
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