Publicado em: 25 de setembro de 2025
O Ministério da Saúde anunciou na última terça-feira, 23 de setembro, uma mudança considerada histórica no rastreamento do câncer de mama. A partir de agora, mulheres entre 40 e 49 anos poderão realizar mamografias pelo Sistema Único de Saúde (SUS) mesmo sem histórico familiar ou sintomas da doença. A decisão amplia o acesso ao exame para uma faixa etária que responde por cerca de 23% dos casos diagnosticados no Brasil, segundo dados oficiais.
Até então, o protocolo vigente restringia o atendimento pelo SUS às mulheres acima de 50 anos, salvo em casos de risco elevado. Com a atualização, o governo pretende democratizar o acesso e reduzir os índices de diagnóstico tardio. Além disso, a idade-limite para o rastreamento regular foi ampliada: mulheres agora poderão realizar mamografias de rotina até os 74 anos, a cada dois anos, alinhando o país a práticas já adotadas em nações como Austrália e Canadá.
Para o mastologista Fábio Botelho, do Centro de Tratamento Oncológico (CTO) e presidente da regional Pará da Sociedade Brasileira de Mastologia, a mudança é um passo importante na redução das desigualdades no sistema de saúde: “mulheres de baixa renda e sem acesso a exames regulares são as mais impactadas por diagnósticos tardios. Com essa mudança, democratizamos o acesso ao rastreamento e aumentamos as chances de cura em todo o país”.
Dr. Fábio Botelho, que também preside a entidade em nível nacional, ressaltou ainda que a mamografia pode revelar lesões invisíveis ao exame clínico: “a mamografia tem a capacidade de detectar lesões que muitas vezes são imperceptíveis ao melhor examinador. E a paciente, muitas vezes nós chamamos isso de doença subclínica, aquela doença que não se expressa clinicamente. A paciente não refere nenhuma queixa e muito menos um médico consegue detectar qualquer alteração na mão. Porém, a mamografia pode sim documentar essas alterações e permitir que se chegue a um diagnóstico precoce”.
Segundo ele, as falhas no acesso e na qualidade dos exames explicam parte da alta mortalidade no país. “A Organização Mundial de Saúde preconiza que pelo menos 70% das mulheres sejam abrangidas pelo rastreamento. Mas, infelizmente, no Brasil, na enorme maioria dos Estados da Federação, nós não alcançamos umas cifras de 20%. E a julgar também que mesmo aquelas pacientes que fazem mamografia, nós temos uma dificuldade muito grande na qualidade dos exames mamográficos. Quando não, as pacientes fazem os exames e não vão nem sequer buscar os resultados”.
O médico lembrou ainda que, em 2021, o câncer de mama provocou mais de 18 mil mortes no Brasil, sendo que 62% dos casos foram diagnosticados em estágios avançados: “isso perfeitamente reflete como as taxas de mortalidade no Brasil ainda permanecem altas e ainda em elevação. E é isso que nós temos que buscar. A despeito de toda a modernidade dos tratamentos, a descoberta de novas drogas, nós hoje nos ressentimos muito no Brasil do diagnóstico precoce. E a mamografia exerce um papel capital na descoberta desses casos subclínicos”.
O especialista lembrou que as sociedades médicas já defendiam a alteração há anos. “Nós sabemos que abaixo de 50 anos nós temos praticamente um terço das pacientes diagnosticadas com câncer de mama. Isso é muito. Então pelos critérios antigos, quer dizer, fazer rastreamento a partir dos 50 anos não nos parecia uma medida exata. Então a Sociedade Brasileira de Mastologia, junto com outras sociedades, a brasileira de ginecologia e a brasileira de radiologia, sempre preconizaram que o rastreamento deve se iniciar aos 40 anos e com uma periodicidade anual. O que contrariava as diretrizes do Ministério da Saúde, que sempre preconizou a parte dos 50 anos, e minha não”.
Apesar da recomendação do Dr. Fábio Botelho e de entidades médicas pela realização anual, o SUS manteve o intervalo de dois anos entre os exames. O especialista reconheceu, contudo, que a ampliação já representa um avanço: “nós já recomendamos, faz tempo, que esse intervalo seja de 1 ano, mas não deixa de ser uma boa notícia a possibilidade de fazer a mamografia pelo SUS a partir dos 40 anos”.
Os dados reforçam a urgência da nova política. Excluindo o câncer de pele não melanoma, o câncer de mama é o mais comum entre mulheres brasileiras, com 73.610 novos casos anuais, segundo o INCA. O Ministério da Saúde informou que, apenas em 2024, foram realizadas mais de 1 milhão de mamografias em mulheres de 40 a 49 anos, o que representa 30% do total de exames feitos pelo SUS.
Para ampliar ainda mais o alcance, a medida integra o programa Agora Tem Especialistas, que neste Outubro Rosa mobilizará 27 unidades móveis em 22 estados, oferecendo até 120 mil atendimentos. As carretas levarão, além de mamografia, serviços como ultrassonografia, punções, biópsias e consultas, tanto presenciais quanto por telemedicina.
O próprio Dr. Fábio resume o impacto esperado: “quando detectado precocemente, o câncer de mama tem chances de cura que ultrapassam 95%. Estudos mostram que em países onde a cobertura da mamografia atingiu 70%, a mortalidade pela doença caiu cerca de 35%”.
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