Publicado em: 14 de julho de 2025
Com um trabalho reconhecido nacionalmente na área da arte-educação, a Rádio Margarida deu início ao primeiro ciclo de apresentações do projeto “Mãe D’Água e sua trupe na proteção de crianças da Amazônia”, que une teatro, cultura popular e escuta ativa para prevenir a violência sexual contra crianças e adolescentes na região amazônica. A iniciativa, patrocinada pelo Banco do Brasil por meio do Programa Rouanet Norte, já passou pelos municípios de Marituba, Ananindeua e Moju, impactando diretamente centenas de estudantes da rede pública, sobretudo em áreas rurais de difícil acesso.
Voltado a crianças do 1º ao 5º ano do Ensino Fundamental, o projeto prevê 20 apresentações teatrais em 10 municípios do Pará: Belém, Ananindeua, Marituba, Barcarena, Benevides, Santa Bárbara do Pará, Santa Izabel, Santo Antônio do Tauá, Castanhal e São Francisco do Pará. A proposta é tanto artística quanto pedagógica, concebida para provocar reflexões sobre direitos, proteção e cidadania desde a infância, de forma acessível, lúdica e enraizada na cultura amazônica.

“Essas primeiras apresentações foram marcantes, porque conseguimos acessar estudantes de escolas localizadas em zonas rurais, onde muitas vezes as crianças têm pouco ou nenhum acesso à arte e à informação sobre seus direitos”, afirma Carmen Rita Chaves, coordenadora da ONG. “Levar esse diálogo para dentro dessas escolas é, acima de tudo, um ato de justiça social e de cuidado com a infância amazônica.”
A peça mistura teatro tradicional e teatro de bonecos para contar a história de Nazaré, uma menina que enfrenta situações de violência e encontra apoio nas figuras míticas da floresta, como Mãe D’Água, Curupira e Matinta Pereira. A abordagem artística não apenas entretém, mas gera identificação e pertencimento entre as crianças, ao usar personagens do imaginário popular amazônico como aliados na proteção e escuta.
“É emocionante ver a reação das crianças. Elas se identificam com a personagem Nazaré e reconhecem os seres da floresta como aliados. Isso gera pertencimento e abre espaço para que falem sobre o que sentem e vivem”, explica Eugênia Melo, diretora artística do espetáculo. “Para muitas dessas comunidades, a visita da Rádio Margarida é o primeiro contato com uma linguagem artística que fala diretamente à sua realidade.”
Inspirado no método de educação popular desenvolvido pela Rádio Margarida ao longo de suas três décadas de atuação, o projeto integra arte, educação e cidadania, utilizando a cultura local como ponto de partida para o fortalecimento da identidade e da consciência crítica das crianças amazônidas.
Cada sessão tem duração média de 70 minutos e é composta por três momentos: acolhida com brincadeiras educativas, apresentação teatral e roda de conversa com escuta ativa, conduzida por arte-educadores com apoio de intérprete de Libras, promovendo o diálogo com toda a comunidade escolar.
Levar o projeto às comunidades rurais da Amazônia exige uma logística cuidadosa e sensibilidade cultural apurada. Em Moju, por exemplo, a trupe da Rádio Margarida chegou a escolas localizadas às margens de ramais e estradas de terra, onde a presença do Estado ainda é limitada e o acesso à arte, um privilégio raro.
“Nessas localidades, o projeto representa um sopro de esperança, uma oportunidade rara de refletir sobre temas urgentes como a violência sexual infantil, com leveza, poesia e afeto”, relata Carmen Rita Chaves. “É um trabalho que toca fundo e mobiliza. As crianças não esquecem.”
Projetos como esse corroboram o papel da escola como território de proteção e diálogo, em consonância com o Estatuto da Criança e do Adolescente (ECA) e a Doutrina da Proteção Integral, pilares legais da defesa dos direitos da infância no Brasil.
Em uma região onde muitas vezes “o silêncio da floresta ainda é maior que a presença do Estado”, como afirma a própria ONG, a Rádio Margarida demonstra, com sensibilidade e compromisso, que a arte pode ser uma ponte poderosa entre o cuidado e a transformação social.
A segunda etapa do projeto terá continuidade nos próximos meses.
Fotos: Lucy Silva / Rádio Margarida
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