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Há três anos, Ercio Bemerguy, uma das melhores cabeças do Baixo Amazonas, escreveu no Uruá-Tapera uma crônica cuja atualidade é impressionante. Um menino de apenas 11 anos de idade fora encontrado morto em um matagal de um dos bairros periféricos de Belém. Barbaramente assassinado, não se sabe, até agora, por quem e nem por que. A propósito disso, Ercio transcreveu um comentário que lera na “Cartas do leitor” de um jornal de São Paulo: “Sei que a gente nasce para morrer. Mas, não tão cedo. Não tão depressa que não dê nem para sentir o gosto da vida. Quem vem ao mundo deveria pelo menos ter um direito garantido – o de sobreviver. Para que, afinal, a gente se organiza em sociedade, para que obedecer as leis, para que aceitar essa porção de contratos com a civilização – casamento, serviço militar, religião, impostos, moral, eleição, governo, legislativo, justiça, polícia – se em troca nem ao menos se garante a chance de viver a um menino que nasce debaixo dessas convenções sociais? Ele, o menino, morto cruelmente, nasceu perfeito, tinha pernas e braços, tinha coração e fígado, tinha alma. E, então, por que ninguém lhe assegurou amor, um lar, educação, alimentação, proteção, enfim, o mínimo de condições para que pudesse viver, para ser criança, para ser adolescente, para ser um homem digno?” E a indagação fica sem resposta, pois no nosso país milhares de crianças nascem para nada, nascem para se perder, para sofrer, para morrer, para serem jogadas fora. Sobre esse triste cenário de tanta desigualdade social, de tanta injustiça e de tanta violência, Ercio lembrou Vivian Carneiro, que também expressou a sua indignação, assim: “Certa vez, desejei ter nascido cega. Talvez seria mais fácil se não pudesse enxergar o que estão fazendo com a nossa gente; se não pudesse enxergar meninas e meninos esfomeados, buscando nas drogas e na prostituição o que lhes mate a fome, o que lhes faça suportar a fria noite nas calçadas. Seria mais fácil se não pudesse enxergar velhinhos e deficientes físicos suplicando esmolas nos sinais de trânsito; se não pudesse enxergar o desespero do pai de família desempregado. Seria mais fácil, sim, se não tivesse que enxergar além da grade que “protege” a minha casa.” É, caro Ércio, nestes tempos ruins essas atrocidades se repetem em um ritmo aterrorizante, e a sociedade fica calada, até quando o horror bate à sua porta.

Franssinete Florenzano
Jornalista e advogada, presidente da Academia Paraense de Jornalismo, membro da Academia Paraense de Letras, do Instituto Histórico e Geográfico do Pará, da Associação Brasileira de Jornalistas de Turismo e do Instituto Histórico e Geográfico do Tapajós, editora geral do portal Uruá-Tapera e consultora da Alepa. Filiada ao Sinjor Pará, à Fenaj e à Fij.

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