0
Queridos amigos, agradeço do fundo do coração todas as mensagens de conforto e solidariedade que recebi pelo blog, e-mail e telefonemas.

Perdoem a demora, não tive condições de fazê-lo antes.

Quero partilhar com vocês o acontecido, embora a dor me dilacere.

Marco Antonio Mollinetti era um ser humano boníssimo, incapaz de fazer mal a uma mosca, como todos os que o conheceram sabem, mas era muito valente e foi um verdadeiro herói nas incontáveis vezes em que salvou da degradação os trabalhadores reduzidos à escravidão por patrões inescrupulosos.

Ele era auditor fiscal do Ministério do Trabalho e integrava uma das equipes móveis que, ao lado do Ministério Público Federal e da Polícia Federal, fazia operações sigilosas em fazendas e indústrias onde havia denúncias de prática de trabalho escravo. Não preciso dizer o quanto essas missões eram e são perigosas.

Muitas vezes, em feriados como Natal e Ano Novo, passou as datas festivas longe da família, em locais longínquos, resgatando vidas. Era honesto, dedicado, amoroso, bom filho, bom marido, bom pai e, sobretudo, muito amado.

Com sua postura do bem, desafiou muitos poderosos que trilhavam os caminhos fora da lei, aplicou multas milionárias e foi por eles ameaçado.

Ele morreu em missão oficial, no município de São Mateus, no Estado do Espírito Santo, na madrugada da terça-feira, 16.

Quando nos deram a notícia, já foi como suicídio. Viajei de imediato para Vitória (ES), para onde o corpo foi levado, e onde seria cremado, já que ele manifestara esse desejo em vida.

Entretanto, todos os colegas de operação de Marco, no velório, me relataram que ele só falava em adiantar o serviço para retornar logo para casa, para aproveitar a companhia do Marquinho, meu sobrinho e afilhado.

Marco renovara, acompanhado da minha irmã e filho, em Brasília, havia apenas três dias, seu passaporte e o visto para ir passar com eles as férias nos EUA.

Jantou com os colegas de trabalho poucas horas antes de sua morte e pareceu a todos alegre e bem disposto.

Evidentemente, isso não sinaliza de modo algum intenção de se suicidar.

Aos poucos, muitos outros pontos obscuros foram surgindo.

O juiz de São Mateus, ao receber os documentos da polícia civil, disse que não poderia autorizar a cremação, uma vez que o próprio delegado de polícia mencionara, em seu relatório, que havia indícios de homicídio (!).

A declaração de óbito (usada para remoção do corpo, que antecede a certidão de óbito) informava que a morte se dera por “parada cardio respiratória, desarticulação da coluna cervical por enforcamento” (sic) e ao mesmo tempo diagnosticava suicídio.

Perguntei a um dos médicos que atestaram o óbito se Marco sofrera muito, e ele me disse que não, que ele não morreu por asfixia e teve morte instantânea, porque o pescoço quebrou.

Detalhe importante: minha irmã pediu insistentemente os pertences pessoais de Marco, desde que soube da tragédia. Nada lhe entregaram, apesar de lhe ter sido informado que estava tudo num carro oficial do Ministério do Trabalho. No dia seguinte, foi comunicado o furto de sua valise com roupas, celulares e de sua pasta com documentos sigilosos da operação, enquanto que um par de seus tênis estava ao lado e foi “desprezado” pelo ladrão.

Eu conversei com a minha irmã e os irmãos do Marco e pedi que não insistissem na cremação. Que o corpo deveria ser sepultado, a fim de permitir uma possível exumação, para esclarecimento da causa mortis, o que foi feito.

Fui pessoalmente, com a minha corajosa irmã ao lado, ao local da morte. Vi que não fora preservada a cena. Disseram-me que um dos motivos para concluírem por suicídio foi que a porta não estava arrombada nem havia sinais de violência. Entretanto, constatei que havia uma porta de sacada que ficara aberta o tempo todo, com fácil acesso, o que foi confirmado pelos empregados do local e por um policial federal que conhece o lugar.

Fiz fotos. Fui à delegacia de Homicídios. Não havia qualquer registro do caso.

Disseram que havia quatro tipos de medicação psiquiátrica espalhados pelo local e mais duas latas de cerveja. Entretanto, nenhum exame de sangue foi feito para verificar a ingestão das substâncias e sua relação com o óbito, muito menos alguém informou onde estavam e quais eram esses medicamentos.

A cena que me descreveram não bate de modo algum com a que vi no local, nem com o relato dos que estavam lá.

Minha irmã conversou com a psicóloga do Marco e ela afirmou que ele estava muito melhor e que não acredita que ele tenha tirado a própria vida.

Muitos sabiam que ele sofria de depressão, e há incontáveis casos de assassinatos com simulação de suicídio.

Vou ao Ministério Público Federal denunciar o caso e pedir que a Polícia Federal investigue para apurar os fatos e fazer justiça.

Não se trata de tentar aplacar a dor, de buscar consolo em outra hipótese, mas de esclarecer uma situação que é também de interesse público.

No mínimo, porque Marco perdeu a vida em serviço, um serviço notoriamente perigoso porque protegia justamente aqueles aos quais foram negados os mais elementares princípios de dignidade humana.

Acredito no MPF e na PF. Meu coração está sangrando mas clama por justiça.

Peço a todos que orem por Marco Antonio Mollinetti, que foi um grande homem, e que ajudem a esclarecer as razões pelas quais ele saiu de nosso convívio.
Franssinete Florenzano
Jornalista e advogada, membro da Academia Paraense de Jornalismo, da Academia Paraense de Letras, do Instituto Histórico e Geográfico do Pará, da Associação Brasileira de Jornalistas de Turismo e do Instituto Histórico e Geográfico do Tapajós, editora geral do portal Uruá-Tapera e consultora da Alepa. Filiada ao Sinjor Pará, à Fenaj e à Fij.

Marco Antonio Mollinetti

Anterior

Missa pela paz eterna

Próximo

Você pode gostar

Comentários