Publicado em: 12 de julho de 2025
Comemoramos o dia 10 de junho, dia de Portugal, de Camões e das Comunidades Portuguesas.
Luís Vaz de Camões é até hoje considerado o maior poeta português e um dos grandes expoentes da literatura ocidental. Consegue ser ao mesmo tempo um poeta clássico, o maior representante do Classicismo Português, e um poeta popular, com inspiração nas canções e nas trovas, escrevendo poesias que lembram as velhas cantigas medievais.
É o autor do poema “Os Lusíadas”, uma, se não a principal, das obras mais importantes da literatura portuguesa, que celebra os feitos marítimos e guerreiros de Portugal.
A informação sobre a vida do poeta Luís de Camões é muito vaga, teria nascido em Lisboa, ou não, de uma família nobre aparentada com a alta nobreza portuguesa. Com a peste terá mudado para Coimbra com 3 anos de idade, vivendo a sua infância na época das grandes descobertas marítimas e também no início do Classicismo em Portugal.
Profundamente conhecedor da História, Geografia e Literatura, mas tudo indica que não terá sido o aluno mais disciplinado pois, teria fama de irrequieto e desordeiro, além de conquistador, o que parece ter-lhe trazido alguns problemas.
Luís de Camões mostrou pouca vocação para a Igreja, apesar da grande influência do seu tio, o Frade D. Bento de Camões, (prior do Mosteiro de Santa Cruz e Chanceler da Universidade de Coimbra, que terá desempenhado um papel importante na sua educação e na sua carreira, tendo-o introduzido no Colégio das Artes – uma espécie de preparação para a universidade), a quem dedica a “Elegia à Paixão de Cristo”.
Não termina o curso de Teologia e aos 20 anos estuda Filosofia, sendo já conhecido como poeta, revelando os seus versos um estudo aprofundado dos clássicos da Antiguidade e dos Humanistas italianos.
Luís de Camões tornou-se o maior representante do Classicismo português, tendo vivido num período em que a intelectualidade nacional era incentivada, período este com importantes escritores, pensadores e poetas, como Sá de Miranda que iniciou o Classicismo em Portugal.
O poeta Luís de Camões frequentava os meios aristocráticos da época e os seus versos eram muito apreciados pelas damas da corte, o que criava a inveja de outros poetas, por isso foi vítima de muitas intrigas que pretendiam desprestigiá-lo e afastá-lo da corte. Já, sem dúvida, um pronúncio da sua genialidade.
Os seus amores proibidos levaram-no ao exílio em Ceuta, alistando-se no serviço militar e embarcando, para o norte da África. Em Ceuta, onde esteve 2 anos, combateu contra os mouros. Mas os problemas não se afastam do poeta e em Marrocos numa briga perde um olho.
Em 1549, retornou para Lisboa e para uma vida desregrada. Em 1552, na procissão de Corpus Christi, feriu com a espada um cavalariço do rei, foi preso e condenado a um ano de prisão.
Na prisão, inspirado nas conquistas ultramarinas, nas viagens por mares desconhecidos, na descoberta de novas terras e no encontro com costumes diferentes, escreveu o primeiro canto de sua imortal poesia épica: Os Lusíadas.
Após o indulto de Dom João III, em março de 1553, Camões partiu para as Índias. Depois de várias viagens vai para Macau, com o cargo de “provedor-mor dos bens de defuntos e ausentes”, onde escreveu 6 partes do seu poema épico.
Em 1556, de regresso a Goa, naufraga nas proximidades do atual Vietname. Consegue salvar-se nadando com um braço e levando no outro os originais dos Lusíadas. Reza a história, que escolheu salvar os Lusíadas em vez da sua amada Dinamene, se é que ela existia.
Luís de Camões viveu em Moçambique, onde foi preso novamente por causa de dívidas. Posto em liberdade viveu na miséria até que o um amigo, o historiador Diogo do Couto, o encontrou e o auxiliou no retorno a Portugal. Diogo do Couto ao encontrá-lo em tão má condição em Moçambique deixa registado que: “Em Moçambique achamos aquele Príncipe dos Poetas de seu tempo, meu matalote e amigo Luís de Camões, tão pobre que comia de amigos, e, para se embarcar para o reino, lhe ajuntamos toda a roupa que houve mister, e não faltou quem lhe desse de comer.”
Em 1569, Luís de Camões embarcou para Portugal, na companhia de um escravo que o acompanhou até seus últimos dias, chegando a Cascais em 7 de abril de 1570. Depois de 16 anos, estava de volta à sua pátria.
Depois de tantas peripécias, termina “Os Lusíadas” e apresenta a sua obra em récita, ao adolescente, Rei Dom Sebastião que, determina que o trabalho fosse publicado em 1572 e que concede uma pensão anual de 15 mil reis a Luís de Camões, “cavaleiro fidalgo de minha Casa” em paga pelos serviços prestados na Índia.
A pensão, por três anos, não terá sido paga de forma regular, fazendo com que o poeta passasse por dificuldades materiais, vivendo os seus últimos anos de vida num quarto, num estado, segundo algumas notícias, da mais indigna pobreza, “sem um trapo para se cobrir”.
Amargurado com acontecimentos em Portugal – derrota portuguesa na Batalha de Alcácer-Quibir e o desaparecimento de Dom Sebastião, o que leva à perda da independência de Portugal- adoece de peste.
Luís Vaz de Camões morre em Lisboa, no dia 10 de junho 1580 – data determinada no século XIX com base na descoberta de um documento onde era mencionada a quantia a que a mãe do poeta, senhora Ana de Sá, tinha direito após a morte do filho – em absoluta pobreza. Não teria sequer um lençol para lhe servir de mortalha e seria enterrado em cova rasa.
Em 1594, Dom Gonçalo Coutinho, mandou esculpir uma lápide com os dizeres: “Aqui jaz Luís de Camões, Príncipe dos Poetas do seu tempo. Viveu pobre e assim morreu”.
Luís de Camões deixou uma obra lírica notável que, logo após a sua morte, foi reunida na coletânea Rimas, e três obras de teatro cómico. Outras obras se terão perdido e consta que algumas foram roubadas.
Se em vida se queixou das injustiças que sofreu e da pouca atenção que a sua obra recebia, logo após a sua morte a sua poesia começou a ser reconhecida como valiosa e de alto padrão estético por escritores europeus importantes, ganhando relevância entre todos os que o liam e influenciando gerações de poetas em vários países.
É um dos grandes vultos literários da tradição ocidental, sendo traduzido para várias línguas e a sua obra é objeto de uma vasta quantidade de estudos críticos. No Brasil muitos se interessam pela sua obra e estudam a sua genialidade.
Luís Vaz de Camões, reconhecido como o maior poeta do Classicismo português, foi um renovador da língua portuguesa e é o símbolo máximo da identidade de Portugal e da Língua Portuguesa, sendo também uma referência para toda a comunidade lusófona internacional.
O reconhecimento de Camões e da sua obra como símbolos da nação portuguesa aparecem com Filipe I de Portugal (Filipe II de Espanha que se tornou rei de Portugal) que, lhe concede o título honorífico de “Príncipe dos poetas de Espanha”, título este que foi impresso numa das edições publicadas em Espanha. Aparentemente o monarca entendeu que seria de interesse prestigiar os portugueses como parte de sua política para assegurar a legitimidade do seu reinado sobre os portugueses, ou então pelo reconhecimento merecido do poeta da terra de sua mãe e da qual se tornou rei.
Contudo, somente no século XIX Luís de Camões se tornou especialmente importante em Portugal, quando a sua obra “Os Lusíadas” sofreu um processo de releitura e mitificação por alguns dos expoentes do Romantismo local, como Almeida Garrett, Antero de Quental e Oliveira Martins, que o colocaram como um símbolo da história e do destino que estaria reservado ao país.
Este movimento tinha como objetivos principais compensar o saudosismo dos tempos de glória e a perceção então prevalente de Portugal como uma periferia pouco significativa da Europa, e dar à sua história um sentido mais positivo, abrindo-lhe novas perspetivas de futuro.
Em 1867 foi inaugurada, pelo Rei D. Luís I, uma estátua do poeta na Praça Luís de Camões, localizada no Chiado, em Lisboa e em 1880 seus restos mortais foram transladados para o Mosteiro dos Jerônimos, em Lisboa.
Esse reconhecimento atingiu um ponto alto por ocasião das comemorações do tricentenário da morte do poeta, realizadas entre 8 e 10 de junho de 1880, que deixou grande impacto na sociedade da época e um rastro de orgulho para a posteridade, permanecendo até os dias atuais como memória importante a ser festejada.
A monarquia constitucional não voltaria a comemorar a data, porém a primeira vereação da Câmara Republicana de Lisboa decidiu transformá-la em dia especial para o Município de Lisboa, celebrando-a por toda a cidade.
A primeira República Portuguesa, com as suas vicissitudes políticas e com a instabilidade vivida, comemorou o dia 10 de junho, numa mistura de celebração republicana e laica e de arraial popular tendo em conta a festa de Santo António em 13 de junho.
Em 1925, na sequência das comemorações do quarto centenário de nascimento do poeta, também festejado na data da morte por se desconhecer a data do nascimento, foi consagrada a data como festa de Portugal, sendo instituído, pelo Estado Novo, o feriado nacional como o dia de Portugal e da Raça.
Com o 25 de abril de 1974, o dia 10 de junho mantém-se como um dos mais importantes feriados nacionais. A designação foi alterada para ‘O Dia de Camões, Dia de Portugal e das Comunidades Portuguesas’. A celebração perdia o cunho imperial, mas não deixava de evocar a diáspora dos portugueses pelo mundo.
Assim, o dia 10 de junho e o dia do Príncipe dos Poetas mantém-se como um dos mais perenes símbolos da nação portuguesa, sendo hoje também o dia dos portugueses espalhados pelos vários continentes que constituem as Comunidades portuguesas pelo mundo, enquanto o nome do poeta surge como um símbolo da união do mundo lusófono.
A sua obra constou de Rimas e Comédias mas a sua imortalização foi pelos Lusíadas, editado pela primeira vez em 1572, que é considerada a epopeia portuguesa por excelência. O próprio título já sugere as suas intenções nacionalistas, sendo derivado da antiga denominação romana de Portugal, Lusitânia. É um dos mais importantes épicos da época moderna devido à sua grandeza e universalidade. A epopeia narra a história de Vasco da Gama e dos heróis portugueses que navegaram em torno do Cabo da Boa Esperança e abriram uma nova rota para a Índia. É uma epopeia humanista, mesmo nas suas contradições,
O poema abre com os célebres versos, que não me cansarei de repetir sempre que o momento se proporcione nas minhas funções:
As armas e os barões assinalados
Que, da ocidental praia lusitana,
Por mares nunca de antes navegados
Passaram ainda além da Trapobana,
Em perigos e guerras esforçados,
Mais do que prometia a força humana,
E entre gente remota edificaram
Novo reino, que tanto sublimaram.
…..
Cantando espalharei por toda a parte,
Se a tanto me ajudar o engenho e arte
— Os Lusíadas, Canto I
*Discurso na sessão alusiva ao Dia de Camões, de Portugal e das Comunidades Portuguesas, na Academia Paraense de Letras.
Comentários