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Quando Deltan Dallagnol subiu ao palco em 2016, armado com um microfone e um PowerPoint que colocava Lula no centro de um “organograma” do suposto esquema de corrupção, ele provavelmente não imaginava que, anos depois, aquele slide custaria R$ 135 mil.

Os advogados de Lula entraram com ação pedindo R$ 1 milhão de indenização, alegando que a apresentação foi abusiva e ilegal, tratando o então ex-presidente como culpado antes de qualquer julgamento. Lula perdeu na primeira e segunda instâncias, mas o caso chegou ao Superior Tribunal de Justiça (STJ), que decidiu a favor do petista. Em 2024, o Supremo Tribunal Federal (STF), com relatoria da ministra Cármen Lúcia, manteve a decisão. Agora, com a determinação do juiz Carlo Brito Melfi, o ex-procurador tem até 15 dias para pagar. Caso não cumpra o prazo, arcará com multas e honorários adicionais.

Aquela apresentação virou um boom midiático. Até hoje é um meme presente nas redes sociais. Foi direta, explosiva, e pensada para “viralizar”. E viralizou. O PowerPoint transformou a denúncia contra Lula em um espetáculo gráfico cheio de setas e completamente tosco, basicamente um julgamento antecipado transmitido ao vivo. Agora, com a decisão final do TJ-SP, a Justiça crava que essa exposição ultrapassou o limite da função do Ministério Público.

A Lava Jato foi, sem dúvida, o maior terremoto político do Brasil da década passada. Desvios bilionários, prisões de grandes empresários e políticos, e um clamor popular por justiça. Mas, ao longo do tempo, o que começou como investigação ganhou um ar de “espetáculo”. A mensagem não era apenas jurídica; era uma construção narrativa para a opinião pública.

O problema é que quando a Justiça se mistura com estratégias de marketing, o risco de ultrapassar limites é enorme. Não à toa, anos depois, a Lava Jato sofreu derrotas jurídicas, seus métodos foram questionados, e figuras centrais, como o próprio Dallagnol e o ex-juiz Sérgio Moro, veêm suas carreiras afundarem enquanto suas motivações escusas chegam à tona.

Dallagnol, que já foi visto como um paladino anticorrupção, hoje carrega a imagem de quem abusou do poder. Em comunicado, o ex-procurador e ex-deputado que teve sua candidatura cassada (Dallagnol teria burlado a Lei da Ficha Limpa ao solicitar exoneração do Ministério Público Federal 11 meses antes das eleições, em meio a processos internos que poderiam resultar em sua demissão e, consequentemente, em sua inelegibilidade), declarou que “faria de novo mil vezes se tivesse mil vidas”. Essa nota soa menos como convicção e mais como teimosia. A condenação não apaga os feitos da Lava Jato, mas serve como um lembrete de que a Justiça não é palco.

Gabriella Florenzano
Cantora, cineasta, comunicóloga, doutoranda em ciência e tecnologia das artes, professora, atleta amadora – não necessariamente nesta mesma ordem. Viaja pelo mundo e na maionese.

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