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Estes tempos nos exigem inteligência. Temos que processar muitas informações profundas e estruturais ao mesmo tempo, para entender e se posicionar neste período que vivemos no Brasil e no mundo.

O inédito julgamento por tentativa de golpe contra a democracia, no Brasil. PCC na Faria Lima(FinTechs). Brasil sai do Mapa da Fome da ONU. Projeto de aumento do IR dos superricos. Tarifaço de Trump contra o Brasil e os Brics. Massacre em Gaza. COP30 em Belém, na Amazônia, sofre críticas de sudestinos.

Essas e outras notícias, e até o que não é noticiado, como a sangrenta guerra no Congo que já matou mais de 10 milhões de pessoas, formam o que se chama “Conjuntura”. Fatos que são apresentados isoladamente como se um fato não tivesse nada a ver com outro, mas que, possuem sinergias comuns e até compõem estratégias de poder dos mesmos sujeitos econômico-políticos.

Segurança

A conjuntura é apresentada de maneira pesada e angustiante porque não trata dos desdobramentos possíveis ou recomendáveis a partir de referências confiáveis como a ciência, considerando sua pluralidade, também democrática, desde que teorias demonstráveis na prática.

Não por acaso, as pesquisas dão conta que a maioria do povo brasileiro, principalmente a “Classe Média”, quer segurança. Sobre isso, na imprensa: 54% dos trabalhadores não chegam ao fim do mês com o salário (UOL, 2025). São 77,8 milhões de brasileiros estão inadimplentes, quase 4 em cada 10 adultos (CNN Brasil, 2025).  Mesmo quem ganha R$ 30 mil mensais mal tem sobra no orçamento: até 85% da renda vai em custos fixos (Estadão, 2025).

Insegurança que se reproduz por atacar formadores de opinião. Enquanto em outros países a classe média guarda para investir, aqui ela gasta para se proteger do próprio Estado: escola privada, plano de saúde, condomínio fechado, carro financiado. O que deveria ser Direito básico virou produto caro. Ou seja, o modelo de Sociedade que se impôs, não premia todo o esforço de trabalho que faz da nossa nação a 10ª mais produtiva do planeta, entre 200 outras nações.

Desigualdades

Logo, a insegurança que campeia na Sociedade brasileira é resultado de um modelo de Sociedade baseado na superconcentração de renda, riqueza e poder. A parcela mais rica dos brasileiros detém grande parte da renda nacional, mas paga menos impostos que o restante da população do país. É o que revelou o recente estudo Retrato da Desigualdade e dos Tributos Pagos no Brasil, feito pelo EU Tax Observatory e a Ecole Normale Supérieure em Paris.

Segundo o estudo, no Brasil 1% das pessoas mais ricas do país e que têm renda anual superior a R$ 5,5 milhões concentra 27,4% da renda nacional total. Os milionários pagam 20,6% de alíquotas de tributos, enquanto para o brasileiro de classe média, a alíquota cobrada gira em torno de 42,5%. O que reduz o consumo interno prejudicando o faturamento dos empresários que dependem da economia interna, mas a maioria deles não entendem a conjuntura, como a maioria da nação. E, sem entender, apoiam a parte do Congresso Nacional que a serviço dos superricos resistem à proposta do governo federal de isentar do Imposto de Renda as pessoas que ganham até R$ 5 mil e aumentar as alíquotas sobre a população mais rica.

Do outro lado o Bolsa Família, principal iniciativa que agora nos tirou do Mapa da Fome na ONU. Não obstante, vejam que coisa curiosa. No governo Bolsonaro ocorreu o aumento de 14 para 21 milhões de famílias beneficiadas e a fome aumentou. No governo Lula III, o BF voltou a cair e está abaixo de 19 milhões de famílias beneficiadas. Valor médio do benefício pago está em 671,54(ago/2025). Ou seja, em um sistema o Bolsa família gerou dependência e desigualdade, em outro, dignidade e ascensão socioeconômica. Portanto, é preciso analisar os processos de maneira sistêmica e não fragmentada. Isto quer dizer que sim, é possível, sem pânico, transitar para uma Sociedade mais equilibrada, com aquecimento da economia interna e o faturamento das empresas, com distribuição sobretudo de dignidade.

PCC e as Fintechs da Av. Faria Lima

A Receita Federal, um dos órgãos que integram a megaoperação nacional contra o crime organizado no setor de combustíveis, diz que já identificou ao menos 40 fundos de investimentos (multimercado e imobiliários), com patrimônio de R$ 30 bilhões, controlados pelo Primeiro Comando da Capital (PCC). Esses fundos de investimentos foram utilizados, como estruturas de ocultação de patrimônio, afirmam os auditores federais.

Entre os bens adquiridos com dinheiro desses fundos também estão seis fazendas no interior de São Paulo, avaliadas em R$ 31 milhões, e uma residência em Trancoso (BA), adquirida por R$ 13 milhões. A principal fintech investigada atuava como banco paralelo da organização criminosa e movimentou sozinha R$ 46 bilhões não rastreáveis no período. Dirigiam uma rede de mais de 1 mil postos de combustíveis, que atuavam em dez estados brasileiros: São Paulo, Bahia, Goiás, Paraná, Rio Grande do Sul, Minas Gerais, Maranhão, Piauí, Rio de Janeiro e Tocantins. Só em SP 300 postos já foram identificados, mas podem chegar a 2.500.

Outra “coincidência” interessante. Segundo a investigação, somente entre 2020 e 2024 foram importados mais de R$ 10 bilhões em combustíveis pelos investigados. Preste atenção: vivemos o absurdo de sermos um dos maiores exportadores de petróleo(bruto) mas importador de combustíveis(refinados) exatamente porque no golpe de 2016, fecharam a refinaria de Abreu e Lima. Agora sabemos que esta manobra foi benéfica para o PCC.

Circula no Insta: “O PCC roubou R$52 bi, a Americanas sumiu com outros R$25 bi, mas não são “perigosos”. Perigoso mesmo, para os donos do poder e sua grande mídia, sempre foi ser preto, pobre ou de esquerda. Classe define o crime. Cor e ideologia definem o castigo. Até quando?”

Bancos

A Net-Zero Banking Alliance (NZBA), maior aliança climática global para bancos, suspendeu suas atividades e colocou em votação sua própria dissolução após um êxodo de instituições financeiras liderado por Wall Street, intensificado com a volta de Donald Trump ao poder nos Estados Unidos. Uma crise que reflete na COP30 e no desenvolvimento da Amazônia, segundo especialistas. Faziam parte gigantes como Goldman Sachs (GS – NYSE), SBC (HSBC), Barclays (BCS), UBS (UBS), Morgan Stanley (MS), Citigroup (C), Bank of America (BAC) e BNP Paribas (BNPQY – OTC/US) abandonaram o grupo. Agora, restam poucos signatários e a proposta em análise é transformar a aliança em um simples órgão consultivo, sem membros ativos. Sem compromisso com o financiamento da Transição Energética, a descarbonização, ficamos na estaca zero. O que fica para nós, é a subordinação à lógica econômica colonial das comodities. Sem agregar renda, sem gerar trabalho e melhorar a qualidade de vida, sem ambiente que fortaleça as micro, pequenas e médias empresas.

Educação

Juntando os fios dessas notícias é possível perceber a urdidura e a trama do tecido econômico-político que vem nos envolvendo, inclusive afetivamente através de ferramentas da cultura. Nos manter como fonte de matérias-prima brutas e baratas sem internalizar, a riqueza que gera, como qualidade de vida, conforto, segurança, saúde…educação. Por falar em Educação, já que começamos nos referindo à Inteligência. Vejamos…

O analfabetismo funcional no Brasil atingiu 29% da população entre 15 e 64 anos, ou seja, 41 milhões de brasileiros, segundo o Indicador de Alfabetismo Funcional (Inaf) de 2024, mantendo o mesmo patamar de 2018. Isso significa que quase três em cada dez brasileiros não conseguem compreender textos simples ou realizar tarefas cotidianas que envolvam leitura, escrita e cálculos matemáticos básicos. Além dos 9,1 milhões de pessoas analfabetas, que não nem que b com a faz bá. Atenção: cerca de 12% das pessoas com diploma de graduação, ou ensino superior completo, são consideradas analfabetas funcionais.

No outro lado: Veja a distribuição dos Programas de Mestrado e Doutorado por região do Brasil: NO(299), NE(975), SE(1.987), CO(407) e S(991). Fonte: Geocapes/Fiocruz. Ou seja, é preciso concordar com Darcy Ribeiro que dizia que a crise na educação, não é crise, é projeto. Assim sendo, aí está o ponto central da construção de uma Sociedade protagonista e um Modelo de Desenvolvimento, realmente sustentável. Porque “Não vemos as coisas como são. Vemos as coisas como nós achamos que somos” como afirma a escritora Anais Nin. Precisamos saber quem somos, nossa história, para fazermos as escolhas com soberania.

João Tupinambá Arroyo
Doutor em Desenvolvimento Urbano e Meio Ambiente e mestre em Economia pela Universidade da Amazônia, onde está pró-reitor de Pesquisa e Extensão. Pesquisador e militante da Economia Solidária desde 1999, 9 livros publicados, todos acessíveis como ebook. Pedidos para arroyojc@hotmail.com. Siga @joao_arroyo

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