A obesidade é uma condição que afeta mais de 1 bilhão de pessoas globalmente, contribuindo para cerca de 5 milhões de mortes anuais devido a doenças como diabetes e problemas cardiovasculares. Tradicionalmente, o diagnóstico de obesidade baseia-se no Índice de Massa Corporal (IMC), que relaciona o peso à altura do indivíduo. No entanto, o IMC não considera diferenças na composição corporal, como a proporção entre músculo e gordura, nem a distribuição da gordura no corpo, o que pode levar a diagnósticos imprecisos.
Reconhecendo essas limitações, uma comissão global composta por 58 especialistas de diversas áreas médicas propôs uma nova abordagem para definir e diagnosticar a obesidade. Publicado na revista The Lancet Diabetes & Endocrinology em 14 de janeiro de 2025, o estudo sugere que o foco deve ser em como o excesso de gordura corporal (adiposidade) afeta a saúde dos órgãos e tecidos, em vez de depender exclusivamente do IMC.
As Categorias Propostas pelos cientistas são:
1. Obesidade Pré-clínica: acúmulo excessivo de gordura corporal sem comprometimento atual das funções orgânicas. Indivíduos nessa categoria apresentam maior risco de desenvolver problemas de saúde no futuro e podem se beneficiar de orientações preventivas, como mudanças no estilo de vida, para reduzir esse risco.
2. Obesidade Clínica: quando o excesso de gordura prejudica o funcionamento dos órgãos ou limita significativamente as atividades diárias, como caminhar ou vestir-se. Nesses casos, são necessários tratamentos específicos para melhorar a saúde e prevenir complicações adicionais.
Para uma avaliação mais precisa, os especialistas recomendam a combinação do IMC com outras medidas, como a circunferência da cintura, que serve como indicador da adiposidade abdominal, e exames de imagem que quantificam diretamente a massa de gordura. Embora não haja um limite fixo para definir obesidade, geralmente considera-se excesso de gordura corporal quando os valores ultrapassam 25% nos homens e entre 30% e 38% nas mulheres. Além disso, é importante considerar fatores como idade, gênero e etnia, já que certos grupos podem apresentar riscos à saúde com valores de IMC mais baixos.
Para indivíduos de ascendência europeia, por exemplo, a obesidade é frequentemente definida por um IMC igual ou superior a 30, o que geralmente está associado a um nível elevado de gordura corporal. Contudo, esse critério pode gerar diagnósticos equivocados: um atleta com muita massa muscular pode ser considerado obeso pelo IMC, enquanto alguém com IMC “normal” pode apresentar excesso de gordura que eleva o risco de problemas cardíacos e outras condições graves de saúde.
Essa discrepância foi destacada por Francesco Rubino, cirurgião bariátrico do King’s College London, que liderou o grupo responsável pelo artigo, para a revista Nature. Rubino explica que os métodos tradicionais de diagnóstico podem levar a tratamentos desnecessários para algumas pessoas, enquanto deixam de identificar outras que realmente necessitam de atenção médica.
Essa nova abordagem dá maior precisão para o diagnóstico e o tratamento da obesidade, permitindo uma compreensão mais profunda da condição e promovendo intervenções mais eficazes e personalizadas. Ao reconhecer a obesidade como uma doença crônica e sistêmica, cujo impacto varia de acordo com o indivíduo, abre-se caminho para estratégias de tratamento que vão além da simples recomendação de “comer menos e se exercitar mais”, reconhecendo a complexidade e multifatorialidade dessa condição.
A adoção dessa perspectiva mais abrangente pode também influenciar políticas de saúde pública e reduzir o estigma associado à obesidade, promovendo uma atuação mais empática e baseada em evidências para o manejo dessa condição que afeta milhões de pessoas em todo o mundo.
Dezenas de organizações científicas e grupos de defesa de pacientes ao redor do mundo já emitiram apoio ao estudo, o que reflete o crescente reconhecimento dos impactos da obesidade na saúde, explicou, também para a Nature, Elisabeth van Rossum, endocrinologista do Erasmus University Medical Center. Um modelo semelhante, publicado no ano passado, também destacou a importância de ultrapassar a dependência exclusiva do IMC para incluir uma avaliação mais ampla dos efeitos da obesidade na saúde.
Embora medicamentos para perda de peso pareçam tratar uma variedade de problemas relacionados à obesidade, muitos profissionais de saúde ainda enxergam a condição como uma questão de força de vontade, ignorando fatores como alterações hormonais e predisposição genética. Van Rossum cita um estudo realizado nos Países Baixos, do qual foi coautora, que revelou que a maioria das pessoas com obesidade já enfrentou estigma em ambientes de saúde.
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