Publicado em: 28 de julho de 2025
A imagem de parte das mais altas autoridades políticas do país, bradando a bandeira americana e o nome de Donald Trump no Congresso Nacional, é de um significado muito importante para a escolha do tipo de nação que sonhamos ser.
Não por ser uma surpresa ou pela força estritamente interna destes personagens, mas pelo que revela do quanto anseiam poder servir, mais uma vez, a estratégias de subordinação do Brasil à uma ordem mundial conservadora da concentração de poder, incluindo a unipolaridade das relações internacionais.
O primeiro sinal aberto deste movimento foi o financiamento de fundações americanas a grupos e movimentos sociais de direita em 2013, como o MBL do hoje deputado Kataguirre, que marcou a arrancada da campanha de ódio nas redes sociais. O segundo sinal foi na votação do impeachment de Dilma Roussef, quando o então deputado Bolsonaro fez uma manifestação de idolatria ao torturador da Ditadura empresarial-militar que vivemos de 64 a 85, sem que nenhuma moção crítica fosse feita apesar da Constituição Federal Brasileira condenar o proselitismo em defesa da Ditadura. O mesmo Bolsonaro que em seguida, como candidato à presidência, bateria continência à bandeira dos EUA e desfilaria em suas carreatas com ela e a de Israel, tudo em nome da pátria, mas qual?
Na sequência tivemos a prisão de Lula com toda complacência colaborativa do STF que, inexplicavelmente, reviu suas decisões e cancelaram o processo contra Lula, sem qualquer autocrítica, deixando no ar muitas dúvidas técnicas e políticas. Mas a mesma certeza de que a economia, sob interesses externos, ainda ameaça nossa soberania. É só lembrar que, na época, com a descoberta do petróleo do pré-sal, o Brasil se tornou exportador de petróleo e se tivesse efetivado as grandes refinarias como Abreu e Lima, seríamos autossuficientes em gasolina e outros derivados. Mas com o golpe de 2016, fecharam as refinarias e hoje temos o petróleo como nossa principal mercadoria exportada porém, contraditoriamente, importamos gasolina em dólar.
O historiador Elias Araújo retoma a lição e alerta que agora, mesmo Trump ameaçando a soberania brasileira abertamente, associando o aumento de tarifas com o perdão a Bolsonaro pela tentativa de golpe em 2023, importantes lideranças políticas e setores empresariais poderosos, ocupam as mídias brasileiras, os editoriais de jornais e canais de televisão para defender o presidente americano, mesmo em meio ao escândalo de corrupção de pedofilia de Trump.
Mesmo o Brasil voltando a crescer economicamente. Mesmo saindo pela segunda vez do Mapa da Fome da ONU. Mesmo o Brasil ocupando liderança importante nos BRICS, bloco que a própria OMC(Organiação Mundial do Comércio) prevê liderar a ordem econômica mundial em, no máximo, 2050, parte importante de nossas elites econômicas e políticas, permanecem obedientes aos interesses externos de nossa matriz colonial, reproduzindo uma narrativa, formando opinião e educando a Sociedade para a subordinação, incultindo valores que destorcem nossa identidade para que as pessoas não vejam os interesses comuns que possuem com seus pares em seu próprio território.
Se tomarmos todos os cientistas que se dedicaram a entender nossa história e realidade, com respeito mundial, como Celso Furtado, Darcy Ribeiro, Roberto Santos, Marilena Chauí, Benedito Nunes, Roberto da Mata, Lígia Simonian, teremos grande convergência na compreensão de que a condenação do Brasil como fornecedor de mão de obra e produtos brutos e baratos, desde o Pacto Colonial do século XVI, formou uma elite sustentada por relações e negócios sob controle de Portugal, depois Inglaterra e desde a instalação da economia do petróleo implementada no processo das Grandes Guerras, os EUA.
O que no Pacto Colonial eram as Drogas do Sertão, hoje são as commodities, subordinadas à hegemonia da economia do Petróleo. Contudo, desde os anos 60 e fortemente, com o Clube de Roma no início dos anos 70, cientistas ganham espaço e visibilidade global ao demonstrarem que exatamente o Petróleo, por ser o maior emissor de C(Carbono), produz o Efeito Estufa que aquece o planeta e provoca desordens ambientais e climáticas com cada vez maiores custos econômicos, incluindo os humanos.
A questão agora, que se mantém desde a Conferência de 72 em Estocolmo, passando pela de 92 no Rio de janeiro e todas as COP, é quem assume os custos da transição tecnológica, mas também cultural com relação ao consumo e ao trato da relação com o meio ambiente – questões que envolvem a ordem social e daí política e econômica.
Hoje vemos no Brasil, os mesmos setores de 1964, políticos e empresariais, que defendem Trump como liderança econômica unipolar, incluindo a defesa da subordinação política que ameaça nossa soberania, serem os que lutam contra a justiça tributária, defendendo ainda a isenção de lucro e dividendos no Imposto de Renda. Os mesmos que fizeram a reforma que retira direitos previdenciários e luta pela manutenção da jornada de trabalho 6×1. Recentemente, protagonizaram a aprovação do PL da devastação, enfraquecendo as autoridades ambientais, na contramão da pauta da COP no ano de sua inédita realização no Brasil, na Amazônia, em Belém do Pará. Nada por acaso. Um projeto de poder.
Ninguém joga pedra em árvore que não dá frutos. Aliás, apanhamos justamente pelos frutos que temos. O Brasil possui cerca de 20% de toda a biodiversidade, até aqui conhecida, do planeta. Temos 20% dos mananciais de água doce. As pesquisas científicas já comprovam que nossa natureza preservada, rende muito mais riqueza do que devastada por atividades econômicas de baixo valor agregado.
Temos importantes reservas minerais estratégicas para a transição energética como as Terras Raras, Níquel, Cobalto, Nióbio etc, que hoje já são o motivo de grandes guerras escondidas como a do Congo, por Cobalto, principalmente. Estes minerais são as principais matérias primas para alta tecnologia da informação e de baterias para carros elétricos. Os governos dos países que mais ganharam com a economia do petróleo resistem violentamente. E hoje, sob liderança de Donald Trump, possibilidades antes descartadas precisam voltar como cenários possíveis para golpes e guerras contra países desobedientes.
O Brasil já ocupa um papel importante no jogo da ordem mundial. Segundo o FMI, as maiores contribuições ao PIB mundial são China(22,6%), Índia(13%), EUA(11%), com o BR(1,7%) em 8º lugar. Pelo PIB nominal, contabilizado apenas em dólar, as maiores produções são EUA(30 Tri), China(19,2 Tri), com o BR(2,1 Tri) em 10º lugar. Pelo PIB corrigido pelo poder de compra de cada nação, o ranking é China(40 Tri), EUA(30 Tri), Índia(13 Tri), com o BR(2,1 Tri) em 8º lugar.
O PIB é um indicador quantitativo da produção de um povo em um dado modelo econômico, não significa desenvolvimento, mas apenas a força de trabalho da nação. Para se ter uma noção qualitativa do Modelo de Desenvolvimento e sua eficácia no uso da força de trabalho, único fator de produção que gera riqueza, segundo todas as escolas econômicas desde Adam Smith, é comum usarem o IDH(Índice de Desenvolvimento Humano) como indicador do impacto da riqueza produzida(PIB) na qualidade de vida da nação, considerando apenas a renda/capita, acesso à educação e à saúde.
Fazendo este exercício, é revelador constatarmos que o Brasil se destaca no ranking mundial tanto no PIB nominal(10º) quanto no PIB corrigido pelo poder de compra(8º), mas no ranking pelo IDH está na 84ª posição. Deixando claro que há uma enorme parte da riqueza gerada pela população que não se converte minimamente em qualidade de vida. Temos um modelo econômico concentrador.
Pior do que nós, só a Índia, 4º maior PIB nominal, 3º maior PIB corrigido e 130º IDH, com 1 bi e 412 milhões de pessoas. O que temos em comum? A hegemonia das commodities no modelo de desenvolvimento econômico. Commoditie se estabelece posicionando mercadorias apenas pelo preço sem considerar qualidade e valor agregado. No Brasil, principalmente grãos, gado, minérios e a própria mão de obra em si, por isso salários achatados sistematicamente. Na Índia o perfil é o mesmo, com o agravante da commoditização de serviços qualificados como os de Call Center e informática.
A lição é que a commoditização pode alcançar novas mercadorias, incluindo a biodiversidade. Só no Pará, o açaí gerou 7 bilhões registrados em 2023. Mas a qualidade de vida das comunidades produtoras não apresenta modificações positivas significativas. Logo, é preciso mais atenção ao que vem por dentro do pacote do conceito de Bioeconomia que tende a se consolidar na COP30 como foi o conceito de Desenvolvimento Sustentável na Rio92.
Al Gore, ex-vice presidente americano, gestor de 45 bilhões do fundo de investimentos para a Economia Verde que é fundador, afirma que Brasil é a base da transição de modelo de desenvolvimento e que investirá 80% dos seus recursos aqui. Claro que esta tendência está no contexto do capitalismo verde, o que precisamos debater mais para tratarmos do ponto central que é a justa internalização da riqueza gerada pela nação, a partir das comunidades que além de produzir, preservam e protegem os mananciais dos recursos para uma nova economia que precisa também responder ao desafio do desenvolvimento sociocultural dos territórios. Sim, devemos sonhar a partir do conhecimento gerado a partir daqui, em sintonia com a fronteira da ciência no mundo.
Mas a sombra não pode ser menosprezada, não tratada devidamente e muito menos invisibilizada ou esquecida. O general Mário Fernandes confessou no STF que escreveu o plano de assassinato de Lula, Alckmin e do juiz Alexandre de Moraes. Seria uma ingenuidade imperdoável não considerar esta oferta de um plano golpista com alvo claro: destruir a democracia para implantar uma hegemonia econômica externa tal como em 1964, ano que insiste em não passar.
A agenda é parecida, mas agora implica na submissão completa do Brasil à hegemonia dos EUA com o enfraquecimento dos BRICS; a composição do Congresso Nacional com domínio da extrema-direita para a tomada e submissão total do TSE e do STF, em 2026; a teocratização do Estado e a militarização das escolas na direção da intolerância e aversão à diversidade, nossa maior riqueza sociocultural. Como registra Elias Araújo, nos alertando que continuamos sem soberania militar e com oficiais das forças armadas “formados” pelo pentágono.
A história está a nos desafiar mais uma vez.
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