Publicado em: 4 de maio de 2017

Alvíssaras! No mar revolto que inclui velhos desafios e novas ameaças, a presidente do Supremo Tribunal Federal e do Conselho Nacional de Justiça, ministra Cármen Lúcia, anunciou hoje, Dia Mundial da Liberdade de Imprensa, a criação da Comissão Executiva do Fórum Nacional do Poder Judiciário e Liberdade de Imprensa, que examinará casos de censura, processos contra jornalistas, e restrições diversas à atividade jornalística em que o Judiciário pode atuar para garantir o livre exercício da profissão e o direito à informação.
A magistrada cravou um pilar de esperança ao declarar: “Me dizem que o Brasil hoje não é um país que garanta livremente o exercício do jornalismo. Quero apurar isso melhor para saber quais são os problemas gerados apesar de uma Constituição que garante tão amplamente liberdades, inclusive a de imprensa, apesar de o texto constitucional não necessitar de grande intervenção para ser interpretado: ‘é proibido qualquer tipo de censura’. E, no entanto, continua a haver censura e jornalistas que não podem exercer seus direitos. É preciso resolver isso”. E fulminou: “A liberdade de imprensa está garantida pela Constituição Federal de 1988, mas precisa ser implantada com ampla eficácia, pois o Brasil é craque em fazer leis mas cumprir leis não é a norma. A convivência democrática depende do direito de o jornalista informar e de o cidadão ser informado, pois só uma cidadania bem informada, livre e, portanto, crítica e responsável pelas suas escolhas, poderá fazer valer seus direitos e participar decisivamente da construção da democracia no País. “
O discurso foi pronunciado durante a abertura do Fórum Liberdade de Imprensa e Democracia, realizado pela Revista Imprensa em Brasília, na sede da OAB-DF.
A falta de “informações precisas” aumenta a quantidade de analfabetos políticos na sociedade, acentuou a ministra, observando que o cidadão é livre quando tem a capacidade crítica de fazer escolhas e que, sem informação, é o analfabeto político. “Sei como isso causa medo e vergonha no cidadão e eu sempre digo que o medo e a vergonha são os dois maiores dados de fragilização do ser humano”, disse Cármen Lúcia.
A presidente do STF lembrou que, embora a liberdade de imprensa seja direito constitucional desde 1824, nem sempre foi respeitada. Durante as ditaduras, a vigência da Carta Magna sempre foi interrompida. Houve restrições ao trabalho jornalístico e até prisões de repórteres em função da atividade profissional.
A ministra citou como tristes lembranças a prisão do jornalista Orestes Barbosa, que se transformou no livro de crônicas “Na Prisão” (1922), e os trechos de receitas culinárias que o Jornal Movimento publicava no lugar de informações censuradas, na época em que ela ainda cursava faculdade, assim como os períodos ditatoriais em que jornalista era proibido de entrar em órgão público, sob pena de prisão.
O Fórum Nacional do Poder Judiciário e Liberdade de Imprensa foi instalado no CNJ em 2012, na gestão do ministro Carlos Ayres Britto, um apaixonado defensor das liberdades democráticas. A primeira formação da Comissão Executiva do Fórum data de fevereiro de 2014, quando foi instituída formalmente pelo ministro Joaquim Barbosa. O grupo é presidido por um conselheiro do CNJ e composto por dois conselheiros e um juiz auxiliar do CNJ, representantes da OAB, da Associação Nacional de Jornais, da Associação Brasileira das Emissoras de Rádio e Televisão (Abert), da Associação Brasileira de Imprensa (ABI) e por dois magistrados (um da magistratura estadual e um da Justiça Federal) indicados pela presidente do CNJ. A portaria assinada pela ministra será publicada no Diário de Justiça Eletrônico de amanhã.
A liberdade de imprensa, essencial para a justiça e a paz, é uma das cláusulas pétreas da Constituição Federal. Além da crise econômica, política, social e ética que assola o País, está em ebulição o campo da comunicação, com as “pós-verdades” e “não-verdades” proliferando em meio a profundas transformações, a mídia como atividade empresarial sendo abalada com o advento das mídias sociais. Jornalistas cidadãos redesenham os limites do jornalismo. A credibilidade, o pluralismo e a independência se destacam. Não à toa, no ano passado a Palavra do Ano, eleita pelos Dicionários Oxford, foi “pós-verdade”. Combinado ao conceito de “notícias falsas”, as questões que hoje permeiam o debate nacional atingem o cerne do jornalismo livre, independente e profissional.
Comentários