Eu ia presidir a Vara Trabalhista de Breves, no Marajo, enquanto o juiz titular estava de férias.
Para chegar lá, duas alternativas.
Ou as horas pacientes e sem fim de uma embarcação, ou o avião monomotor.
O teco-teco que me levaria, decolava do antigo Aeroclube.
Nessa viagem, voaríamos apertados o piloto, este que escreve pra vocês, e, no assento traseiro um padre e uma freira.
Eu já me considerava um veterano em voos monomotores.
Quando jovem, trabalhei no Banco do Brasil em Alenquer e por longo tempo, toda sexta feira às cinco da tarde o meu amigo Ferreira, que namorava minha vizinha Cleonice, me dava carona para Santarém no aviãozinho dele, que fazia fretes para o balatal.
Era uma emoção estética contemplar o imenso tapete verde da floresta e os rios se contorcendo ali embaixo de nós, no avião.
Certa vez, ele me perguntou se eu tinha coragem de fazer aquela dita viagem no teco-teco.
No afã de rever a família, disse logo que sim, sem nem saber o motivo da pergunta.
Então ele falou:
– É o seguinte… o avião teve um probleminha, carregando balata e a porta do lado do passageiro caiu. Estou levando pra fazer a manutenção. Topas?
E eu, no verdor dos meus vinte anos, embarquei amarrado na cadeira do passageiro. Nem me passou pela cabeça que se a aeronave tivesse alguma pane eu estava preso.
E chegamos ao destino sãos e salvos, graças a Deus.
Mas, eu estava falando da minha epopeia marajoara.
O voo era para Breves, como falei. Mas o sacerdote e a freira mencionados desceram em Oeiras, sabe onde?
No quintal de um colégio!
Quando o monomotor vinha descendo dava pra ver a criançada correndo perigosamente para a pista de pouso improvisada, para ver o avião, deixando as freiras desesperadas para contê-las… e só no derradeiro instante conseguiram.
Logo que o padre e a irmã saíram, não demorou nem cinco minutos e levantamos voo novamente.
A “pista” improvisada era o pequeno campo de futebol do colégio.
Na Amazônia vale tudo. Sei de estórias de arrepiar com os teco-tecós que voavam para o garimpo, fazendo a linha Santarém-Itaituba.
E o meu aviãozinho marajoara ia decolar heroicamente.
O piloto me olha e diz:
– Olha ai, não sei se dá pra subir. O espaço ficou pequeno e ali na frente tem diversas castanheiras imensas. Vou dar toda força no
motor… vai rezando aí tudo o que tu souberes…
A reza funcionou. Subimos raspando o topo das árvores e eu pensei que íamos estourar.
E conseguimos, finalmente, encerrar nossa aventura em Breves, nas margens do rio Parauau.
De tardinha fui assistir uma missa de agradecimento e comecei uma amizade nova com o frei Boze, um frade espanhol, pároco da cidade. Mas é assunto para depois.
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